Quebra de patente é 'passo para trás', dizem americanos
A Câmara de Comércio americana, que representa mais de 3 milhões de empresas nos Estados Unidos, diz que a decisão brasileira pode afastar os investimentos estrangeiros no país.
"A questão é: o Brasil está trabalhando para atrair investimento em indústrias inovadoras, que dependem de propriedade intelectual, e esta decisão vai provavelmente fazer com que os investimentos vão para outro lugar", acrescenta a nota.
"Encerrar as negociações com a Merck e tomar sua propriedade intelectual envia um sinal perigoso para os investidores", diz o texto.
"Os pesquisadores da Merck investiram centenas de milhões de dólares para desenvolver este remédio. Claramente, ainda havia espaço para negociar uma solução aceitável para os dois lados", afirma.
Proposta rejeitada
Foi a primeira vez que o governo brasileiro anunciou o licenciamento compulsório de um medicamento, embora já tivesse ameaçado, em 2001 e 2003, fazer o mesmo com outros anti-retrovirais dos laboratórios Roche e Abbott.
Nestes casos, as empresas reduziram o preço de venda ao governo e a patente foi mantida.
A proposta da Merck, de conceder um desconto de 30%, foi rejeitada pelo Ministério da Saúde, que enviou ao gabinete presidencial a proposta de licenciamento compulsório do remédio, que pode ser importado da Índia ou produzido no Brasil.
O governo americano não fez nenhum comentário sobre o assunto até a manhã desta sexta-feira.
Em cerimônia no Palácio do Planalto para anunciar a decisão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou a diferença de preço cobrada pela Merck, fabricante do remédio, no Brasil e em outros países, e ameaçou estender o licenciamento compulsório para outros remédios.
"Hoje, é o Efovirenz. Amanhã, pode ser qualquer outro comprimido, se não tiver os preços justos", afirmou. "Entre o nosso comércio e a nossa saúde, vamos cuidar da nossa saúde", disse o presidente.
O Brasil paga US$ 1,59 por comprimido de Efovirenz, e propôs pagar US$ 0,65. A versão genérica, produzida na Índia, pode custar US$ 0,45 e gerar uma economia ao governo de US$ 30 milhões por ano.
O presidente disse que o preço cobrado pela empresa não é justo "não só do ponto de vista ético, mas do ponto de vista político e econômico". "Como se o doente brasileiro fosse inferior ao doente da Malásia", afirmou Lula, na cerimônia.
Pirataria
A associação das empresas americanas também lembra que "ironicamente" a decisão do governo brasileira acontece pouco tempo depois de os americanos terem reconhecido os avanços do país na área de propriedade intelecutual.
Na última segunda-feira, um relatório do Departamento de Comércio dos Estados Unidos reconheceu os "esforços vigorosos" do Brasil para combater a pirataria, apesar de afirmar que o problema ainda existe "em altos níveis" no país.
O relatório anual incluiu 43 países em três listas. A primeira recomenda o monitoramento prioritário de violações da propriedade intelectual. A segunda determina o monitoramento não-prioritário.
Depois de anos na primeira lista, o Brasil foi incluído na segunda lista neste ano.
A Câmara americana lembra que o progresso na área foi um fator fundamental para a extensão, em dezembro, do Sistema Geral de Preferências, que permite a exportação de produtos brasileiros sem pagamento de impostos.
Diante da decisão brasileira, a Merck divulgou uma nota sobre os riscos da medida para pesquisas sobre novas drogas.
"Esta expropriação de propriedade intelectual manda um sinal desanimador para companhias que se baseiam em estudos sobre a atratividade de se realizar pesquisas arriscadas sobre doenças que afetam o mundo em desenvolvimento, potencialmente afetando pacientes que podem necessitar de novas e inovadoras terapias que poderiam salvar vidas", afirma a nota.
A empresa também diz que o mundo desenvolvido não pode arcar com todos os custos dessas pesquisas e que o Brasil, como a 12ª maior economia do mundo, teria condições de pagar pelo medicamento.
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