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Economia
Domingo - 29 de Abril de 2007 às 14:55

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Rodovias que havia pouco tempo serviam de passagem para caminhões carregados de bois e grãos, agora convivem com o tráfego intenso de carretas abarrotadas de cana-de-açúcar. E isso não se deve só ao início da safra deste ano. Nos estados do Centro-Oeste, áreas de pastagem, plantações de soja, milho e algodão cedem espaço à matéria-prima energética mais valorizada do momento. O avanço da cana em Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul revela uma mudança radical na fisionomia agrícola e econômica da região, que o Correio começa a retratar a partir de hoje, depois de percorrer quase 4 mil quilômetros e visitar 20 municípios ao longo de nove dias.

Senador Canedo (GO), a 18 km de Goiânia, é um símbolo dessa acelerada expansão. A cidade se desenvolve ao ritmo do etanol e, embora não produza um litro de álcool, é importante pólo de distribuição de combustíveis. Com o anúncio de que a Petrobras destinará US$ 750 milhões à construção de um alcoolduto ligando a cidade a Paulínia (SP), Canedo vive a expectativa de se transformar em um dos maiores entrepostos do mundo, abocanhando mais impostos. “Daqui a 10 anos ninguém reconhecerá esse lugar. Seremos mais prósperos do que muitas cidades paulistas”, prevê Zélio Costa, secretário municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo. Em 2012, a capacidade de transporte do alcoolduto será de 8 bilhões de litros.

Atração

Com o duto, Goiás será referência para escoar a própria produção e a dos estados vizinhos. As obras, previstas para começar em 2008 e terminar entre 2010 e 2012, aproveitarão a faixa de terra por onde já correm tubulações subterrâneas que trazem diesel e gasolina de São Paulo. O simples anúncio do investimento, financiado pelo Japan Bank for International Cooperation (JBIC), atrai profissionais das mais diversas áreas. “Isso aqui era uma roça há quatro anos. Hoje, o comércio melhorou, as casas ficaram mais caras. Muita gente que saiu, resolveu voltar”, diz Rodrigo Hilário Garcia, 23 anos, administrador de empresas, dono de uma oficina mecânica recém-inaugurada.

Em nenhum outro lugar do Brasil há tanta terra fértil, barata e plana disponível. A regularidade de chuvas e de sol durante o período de cultivo, a mão-de-obra farta e os incentivos fiscais e tributários oferecidos pelos governos complementam o ambiente ideal para o fortalecimento da atividade. Por essas razões, o Centro-Oeste desponta como sucessor natural de São Paulo na liderança do mercado de álcool e açúcar, deixando para trás inclusive zonas nobres no Triângulo Mineiro, Paraná, Tocantins, Maranhão, Pará e Bahia — todas consideradas fronteiras agrícolas emergentes.

O Brasil colherá este ano a maior safra de cana da história. Serão 491 milhões de toneladas, sendo 50 milhões no Centro-Oeste — o dobro do que foi registrado em 2000. A velocidade com que a área plantada aumenta, aliada à montagem de novas usinas, comprova que a aposta feita por grandes grupos não foi em vão. “O momento é de oportunidades e, ao mesmo tempo, extremamente desafiador”, analisa Júlio Capobianco Filho, executivo da usina Goiasa, em Goiatuba (GO). Juntos, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul têm hoje 37 unidades produtoras de álcool e açúcar. Em cinco anos, a estimativa é chegar a 100. Em todo o país são 357 usinas em atividade e outras 136 em estudo. “O mundo inteiro tem inveja do álcool brasileiro. O que o setor pede é que não nos atrapalhem”, completa João Nicolau Petroni, diretor-presidente da usina Barralcool, em Barra do Bugres (MT).

Críticas

Mas o apetite dos usineiros encontra obstáculos. Desconfiada do boom do etanol, parte da classe política abriu fogo contra a cana. “Já vi bons momentos da soja e de outros grãos. E vi todos passarem. Onde a cana está o emprego é mais difícil e menor”, acusa o prefeito de Rio Verde (GO), Paulo Roberto Cunha (PP), um dos mais duros críticos ao modelo de negócios preconizado pela cana.

Na tentativa de “blindar” seu município da avalanche verde, Cunha baixou lei determinando que apenas 10% da área agricultável de Rio Verde poderá ser destinada à planta, que é a base do etanol nacional. Isso equivale a 50 mil hectares. “Recebi críticas pesadas, mas tenho a população inteirinha a meu favor”, reforça. Segundo ele, Goiás e outros estados correm o risco de serem engolidos por uma monocultura “que traz poucos benefícios”. Os usineiros protestam contra a medida.

Atitudes como essa estão presentes em menor ou em maior escala nas cidades que se abriram recentemente para a cana. Pelo menos por enquanto, barreiras burocráticas ou tributárias não minaram a disposição dos empresários de injetar recursos nos projetos. Para Plínio Mário Nastari, diretor-geral da Datagro, uma das maiores consultorias do ramo, a disputa entre grãos, gado e cana tende a se acomodar à medida que um setor se integre ao outro. “A monocultura é um temor infundado. A cana traz um desenvolvimento positivo por onde se alastra. Agora, não resta dúvida que esse crescimento pelo Centro-Oeste provocará grandes transformações”, explica.

Que o digam os donos de terras próximas às usinas. Em um raio de 30 km, os imóveis rurais estão supervalorizados, chegando a custar até quatro vezes mais do que antes da chegada das indústrias. A cana só é economicamente viável se cultivada próxima à unidade de transformação porque o transporte é caro.

A prática mais comum na parceria entre proprietários de terras e usinas é o de arrendamento, que também contribuiu para a elevação do preço dos imóveis. Nele, o dono da terra não arca com qualquer custo no plantio e é remunerado segundo o que está previsto em contrato (ou por produção por hectare ou sobre a colheita total). Em Goiás, há casos de um hectare ser arrendado por até R$ 30 mil. Já em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, os preços variam de R$ 10 mil a R$ 15 mil.





Fonte: Correio Braziliense

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