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Internacional
Quarta - 03 de Abril de 2013 às 22:06

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A transição no comando da China aconteceu recentemente com um pano de fundo sinistro. Mais de 13 mil porcos mortos foram encontrados flutuando em um rio que fornece água potável para Xangai. Uma cerração parecida com fumaça vulcânica escondeu a capital, Pequim, causando tosse convulsiva e obscurecendo o retrato de Mao Tsé-Tung no portão da Cidade Proibida.

As tragédias ambientais chinesas são tão graves, principalmente o ar venenoso, que as principais autoridades foram forçadas a reconhecê-las abertamente. Porta-voz do Congresso Nacional do Povo, Fu Ying disse procurar sinais de névoa seca todas as manhãs antes de abrir as cortinas de casa, além de usar uma máscara no rosto quando a situação estava ruim e também colocar uma na filha.

Ao afirmar que a poluição atmosférica o deixava "muito perturbado", Li Keqiang, o novo primeiro-ministro, prometeu "demonstrar uma resolução ainda maior e fazer esforços mais vigorosos" para limpar o ar. O que os líderes não comentam é que as brigas com a burocracia governamental são um dos maiores obstáculos à aprovação de políticas ambientais mais fortes.

Enquanto algumas autoridades pedem restrições mais severas a poluentes, empresas estatais – principalmente as de petróleo e energia – vêm colocando os lucros à frente da saúde ao trabalhar para contornar as novas regras, segundo dados governamentais e entrevistas com pessoas envolvidas na negociação das políticas.

Por exemplo, embora os caminhões e ônibus que cruzam a China sejam muito piores para o ambiente do que quaisquer outros veículos, as petroleiras demoraram anos para melhorar a qualidade do diesel queimado por eles. Em resultado, os níveis de enxofre no diesel chinês são pelo menos 23 vezes maiores do que nos Estados Unidos.

Quanto às empresas de energia, as três maiores do país são violadoras constantes das restrições governamentais sobre emissões de usinas movidas a carvão; centrais elétricas fora da lei são encontradas na China inteira, da Mongólia Interior à metrópole de Chongqing, na porção sudoeste da nação.

Parte de prédio é vista em meio à névoa de poluição que encobre Pequim. A capital chinesa advertiu que seus moradores devem permanecer em casa após o anúncio de medidas de emergência para combater uma pesada neblina de poluição. (Foto: Jason Lee/Reuters)Parte de prédio é vista em meio à névoa de poluição que encobre Pequim. A capital chinesa advertiu que seus moradores que devem permanecer em casa após o anúncio de medidas de emergência para combater uma pesada neblina de poluição. (Foto: Jason Lee/Reuters)

Conflito de interesses
As estatais têm papel crítico na criação de políticas sobre padrões ambientais. Por exemplo, os comitês que determinam os padrões de combustível ficam nos prédios de uma petroleira.

A questão de as empresas serem forçadas a obedecer em vez de impedir as restrições ambientais será um teste crítico do comprometimento de Li e Xi Jinping, novo chefe do Partido Comunista e presidente chinês, em reduzir a influência de interesses velados na economia.

"Durante o processo de estabelecimento do padrão, as companhias ou conselhos do setor econômico têm muita influência", afirmou Zhou Rong, gerente de campanha sobre questões energéticas para o Greenpeace no Extremo Oriente. "Minha opinião pessoal é de que mesmo existindo padrões mais restritivos para cada segmento, as companhias os violarão."

Segundo defensores da ecologia, em sua maioria, as montadoras chinesas apoiaram a atualização de veículos com tecnologia mais limpa, o que os torna mais vendáveis em âmbito mundial.  Porém, uma tecnologia melhor não funciona adequadamente sem combustível de alta qualidade e é aí que se dá o ponto de estrangulamento. O sistema de criação de padrões para combustível levou a brigas burocráticas ferozes.

Pressão do governo

O Ministério da Proteção Ambiental é o principal defensor governamental de padrões de combustível elevados e melhor tecnologia automotiva. Ele tem o poder de forçar a indústria automotiva a usar nova tecnologia impondo normas mais rígidas de emissão de poluentes, mas não pode impor unilateralmente novos padrões de combustível ou fazer com que estes sejam cumpridos pelas petroleiras. O Ministério somente pode pedir que outros ministérios ou agências relevantes entrem em ação.

Quando o padrão dos combustíveis não acompanha o ritmo da tecnologia automotiva, o Ministério Ambiental retém a divulgação de novos padrões de emissões e, assim, os carros não são atualizados.

Os padrões de combustível são decididos pela Agência de Padronização da China, que convoca um comitê e um subcomitê para pesquisar critérios. Cada um deles conta com entre 30 e 40 membros, a maioria oriunda das petroleiras, disse Yue Xin, que participa de um dos grupos em nome do Ministério da Proteção Ambiental.

Os integrantes das petroleiras "representam mais os interesses da empresa", explicou Yue. A Sinopec e a PetroChina, duas das maiores petroleiras, insistiram para que os consumidores ou o governo paguem pela modernização das refinarias para produção de combustível mais limpo, e elas vêm atrasando a aprovação de padrões elevados enquanto não houver consenso sobre quem vai bancar a conta.

"Durante anos, a Sinopec não contestou a necessidade de melhorar os padrões chineses", afirmou David Vance Wagner, pesquisador sênior do Conselho Internacional de Transporte Limpo, que trabalhava para o Ministério da Proteção Ambiental. "Eles só reclamaram do aspecto financeiro."

Em janeiro passado, Fu Chengyu, presidente da Sinopec, reconheceu que as petroleiras tinham alguma responsabilidade na poluição do ar, mas também argumentou que os padrões de combustível do governo não eram altos o suficiente, relatou a Xinhua, a agência de notícias estatal.

Contudo, Fu não explicou que representantes das petroleiras nos comitês de pesquisa sobre padrões de combustível têm sido o maior entrave à aprovação de padrões melhores. Os representantes das petroleiras não responderam aos pedidos de comentários. Em público, executivos das companhias de petróleo tentam apontar para um culpado diferente. Este mês, Fu afirmou a jornalistas que, "na verdade, o maior assassino é o carvão".

Combinação de imagens mostra vista da região do edifício Yintai Centre, em Pequim, no dia 29 de outubro, com forte poluição de manhã e de noite (Foto: Jason Lee/Reuters)Combinação de imagens mostra vista da região do
edifício Yintai Centre, em Pequim, no dia 29 de outubro
de 2012, com forte poluição de manhã e de noite
(Foto: Jason Lee/Reuters)

Automóvel: o grande vilão
De acordo com autoridades de Pequim, as emissões veiculares representam 22% do material particulado mortal presente no ar, conhecido como MP 2,5, e outros 40% provêm de fábricas movidas a carvão em Pequim e províncias vizinhas.

Em fevereiro, o Ministério da Proteção Ambiental divulgou padrões mais severos para emissões industriais para seis setores que utilizam carvão. O primeiro da lista é o setor de geração de energia, que representa quase a metade do consumo de carvão na China.

Porém, a obediência às novas regras por parte das estatais pode se revelar um problema. O Ministério da Proteção Ambiental publica listas anuais das fábricas que violaram as regras de emissões. Segundo análise, essas fábricas são todas comandadas pelas grandes empresas de energia.

As listas anuais representam apenas uma fração das fábricas transgressoras, pois a instalação de equipamentos para monitoração por parte delas é irregular e as leituras podem ser manipuladas, assegura Kevin Jianjun Tu, estudioso de energia da Fundação Carnegie para a Paz Internacional.

Outro problema são as penalidades baixas. As multas costumam ser limitadas a US$ 16 mil, o que não chega a ser uma grande força dissuasora, disse Zhou, a representante do Greenpeace. Segundo ela, as fábricas transgressoras "deveriam ser impedidas de produzir temporariamente; isso as forçaria a levar a questão a sério".






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