Concentração faz do MT 'terra de gigantes'
"Houve retração na safra 2006/07, e deverá haver uma retomada, com os grandes expandindo [o plantio] em cima das áreas de produtores menores", avalia Guilherme Bastos, diretor da Agroconsult. Para ele, os pequenos e médios produtores do Estado devem ter "problemas por anos à frente" por causa de dívidas, principalmente as referentes a investimentos.
Alaor Zancanaro, que plantou 1.500 hectares de soja na atual safra, não pretende ampliar suas lavouras. "Para isso é preciso investir e não posso me endividar", diz o produtor de Nova Mutum. Ele, que também cria gado bovino, teve de se desfazer de 900 cabeças para pagar parte de suas dívidas e ficou com 200 animais.
A necessidade de novos investimentos para aumentar o plantio na próxima safra também é um desestímulo para Neuri Secchi, de Nova Mutum, que tem dívidas para quitar até 2013. Ele deve manter o plantio de 1.700 hectares.
"Nunca mais vou aumentar a área de plantio", promete Darci Potrick, de Caravagio, na região de Sorriso, que teve de abandonar uma área de 1.300 hectares de soja sem colher por causa do excesso de chuvas. Em cerca de 400 hectares dessa área, Potrick semeou milho sobre a soja.
Em Campo Novo do Parecis, uma das regiões de logística mais difícil para escoar a produção de grãos no Mato Grosso, não há expectativa de abertura de novas áreas para plantio porque os produtores estão descapitalizados, diz o presidente do Sindicato dos Produtores Rurais, Odenir Ortolan.
A Associação dos Produtores de Soja do Estado do Mato Grosso (Aprosoja), e a Federação de Agricultura e Pecuária (Famato) não têm números disponíveis sobre a concentração no Mato Grosso, mas reconhecem que ela ocorre. Rui Prado, presidente da Aprosoja e vice da Famato, diz que, após a "terceira safra com problemas", produtores maiores "têm mais chances de se proteger", enquanto os menores muitas vezes desistem do negócio. A Aprosoja tem 6 mil associados.
"Os grandes estão engolindo os pequenos", reclama Nelson Piccoli, presidente do Sindicato Rural de Sorriso. O dirigente defende uma moratória de 180 dias para as dívidas de investimento.
A estratégia de grandes grupos, como o Vanguarda, do deputado estadual Otaviano Pivetta (PDT), confirma o movimento de concentração. A empresa plantou 70 mil hectares de soja na atual safra e ampliará a área para 80 mil na próxima, segundo Mário Domanski, gerente de uma das fazendas do grupo, em Nova Mutum. Segundo ele, 40% do total de terras são áreas arrendadas. "É inviável ter área própria", afirma.
Outro grande produtor, o gaúcho Guerino Ferrarin, de Lucas de Rio Verde, também ampliará o plantio na safra que vem suas fazendas no Mato Grosso. Ele prevê semear uma área 15% maior. Em 2006/07, plantou 40 mil hectares.
Já o vice-prefeito de Nova Mutum e presidente do Sindicato Rural local, Alcindo Uggeri, planeja plantar arroz numa nova área de cerca de 600 hectares na próxima safra, preparando-a para receber soja em 2008/09. No ciclo atual, a área com a oleaginosa foi de 4,1 mil hectares.
O endividamento não é o único limitador para a abertura de novas áreas de plantio no Mato Grosso. O recente encarecimento dos fertilizantes também pode significar uma retomada "mais tímida", avalia Guilherme Bastos. A alta dos preços já preocupa os produtores. "Ainda estou aguardando para comprar os fertilizantes", diz Alaor Zancanaro, para quem não há justificativa para a alta do insumo.
De acordo com Francisco Cléber Vieira, gerente de projetos da Agroconsult, a alta aconteceu porque as empresas de insumos tiveram de repor os estoques de matérias-primas - que são importadas - para atender à demanda aquecida por fertilizantes em decorrência do crescimento da área de milho no país. Essas matérias-primas estão valorizadas no mercado internacional justamente em consequência do avanço do milho para produção de etanol nos Estados Unidos e também na China.
O comportamento dos preços internacionais da soja também deve influenciar a decisão dos produtores. Hoje, as cotações estão valorizadas principalmente em decorrência do posicionamento dos fundos nas bolsas de futuros, impulsionados pela perspectiva de maior demanda para produção de biocombustíveis. No entanto, observa Guilherme Bastos, tamanha valorização não se justifica dado o nível dos estoques mundiais de soja, "igual à safra brasileira".
Comentários