Com 12 anos, menina já assume a família
Rotina não muito distinta da que enfrentavam outras mães do bairro Praeirinho, onde Sania Ferreira Mendes morava. A diferença estava em sua idade e no fato de que os três pequenos sob sua tutela não eram de fato seus filhos.
Sania havia acabado de completar 12 anos de idade quando assumiu a tarefa de criar os irmãos mais novos. Sua mãe, depois de uma separação conturbada, teve de deixar a cidade sem levar parente algum ao seu lado.
Isso incluiu os quatro filhos – a mais nova, de apenas 6 anos. Como o pai precisava trabalhar o dia todo, Sania se viu obrigada a enfrentar um desafio para o qual nunca imaginou estar preparada. “Eu não sabia nem por onde começar, mas sabia que eles precisavam de mim”.
Neste momento, foi a ajuda da comunidade que fez a diferença. “Meu pai tinha muita amizade no bairro. Então os vizinhos acompanhavam tudo. O que eu não dava conta de fazer, eles faziam por mim. Então as coisas começaram a caminhar”.
Ainda assim, o fardo se mantinha pesado. Para priorizar os irmãos, Sania teve de colocar em segundo plano os próprios estudos. Havia que deixá-los na escola e na creche, e por isso era sempre com atraso que ela conseguia chegar à própria classe.
“A professora até me perguntou o que estava acontecendo comigo. Então, um dia, conversamos e eu contei tudo. Ela entendeu meu problema e começou a me ajudar também. E foi assim que fui assumindo o papel de mãe”.
A experiência durou quatro anos. Hoje, aos 20, Sania já tem seus próprios filhos, mas ainda reserva um carinho especial em relação aos irmãos que ajudou a criar. “Até hoje eles me tratam como se fosse uma mãe, e eu também tenho com eles uma relação que não é só de irmão”.
Protagonista de uma história de superação, ela agora emprega essa energia para ajudar a própria comunidade a se firmar. No residencial Sucuri, para onde se mudou há pouco mais de um ano, Sania é uma ativa integrante da associação de moradores “A União faz a Força”.
A entidade, criada em 2006, vem reunindo esforços – principalmente entre as mulheres do bairro – para reverter uma situação que hoje é de completa precariedade.
“Estamos longe do centro e não temos escola, posto de saúde, creche ou centro comunitário. As mulheres aqui têm dificuldade de conseguir emprego, porque não têm onde deixar os filhos. Então, o jeito é a gente se unir para cobrar dos políticos, ou nada muda”.
Na luta por melhorias, Sania já fez protesto em frente a órgãos públicos e participou de manifestações que fecharam rodovias. Em uma dessas oportunidades, conta ter sido ofendida.
“Um motorista, irritado com o bloqueio, disse que nós tínhamos que ir trabalhar em vez de ficar ali, atrapalhando. Eu fiquei mais irritada ainda, pois era por isso mesmo que a gente estava lutando. Pela oportunidade de trabalhar”.
Se pudesse, em um passe de mágica, mudar alguma coisa em seu bairro, Sania faria surgir oportunidades. “Faria uma panificadora e uma horta comunitárias, para dar trabalho para as mulheres daqui. Todas aqui têm vontade. E, se tem uma coisa que eu aprendi com a experiência de ser mãe tão cedo, é que, se você quer mesmo, tudo tem jeito”.
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