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Quarta - 06 de Dezembro de 2006 às 09:53

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São Paulo - O diretor mundial de Propriedade Intelectual da americana Microsoft, Keith Beeman, comanda um exército de 150 funcionários contra a falsificação de softwares em um escritório envidraçado, com vista para as congeladas Montanhas Cascade, na cobertura de um dos cem prédios que compõem o conglomerado da empresa em Seattle (EUA). O fio da meada com que a equipe tece a complexa rede mundial de pirataria termina, no Brasil, nas mãos de um garoto de 20 anos, mulato de cabelos rastafári, 2º grau incompleto, que passa os dias atrás de uma barraca de papelão vendendo cópias toscas no maior centro de eletrônicos do País, a Santa Ifigênia, e atende pelo sugestivo nome de Mouse.

Ontem, as duas pontas dessa rede, espécie de gato e rato da pirataria, se encontraram. A convite do jornal O Estado de S. Paulo, Beeman conheceu Mouse e outros ambulantes que, uma barraquinha atrás da outra, apresentaram ao executivo as 'últimas novidades' da sua Microsoft: o Windows Vista e o Office 2007, cujo lançamento mundial para consumidores só ocorrerá em janeiro. Tudo isso entre produtos como DVDs com cinco filmes, apelidados de 'sessão pipoca' e vendidos a R$ 5, e uma coletânea de 27 álbuns de Miles Davis em MP3, por até R$ 10.

Mouse desconfiou do gringo de pele branca e cabelos ruivos, camisa e calça de linho para enfrentar o calor, mas o executivo, esfregando os dedos, se fez entender. "Ah, ele quer saber quanto? R$ 10", disse. Caro? "Caro é o original. Esse é falso e expira em alguns meses, porque é cópia beta (feita do produto de teste). Se quiser o que não expira, custa R$ 20, mas tem de esperar uns dias", respondeu o garoto, fazendo o americano descendente de escoceses arregalar os olhões azuis, surpreso com as cópias de um produto que sequer está à venda pela empresa e com a honestidade do menino. "O mais impressionante é a sinceridade com o cliente." E se o software não funcionar? "Não tem problema, dou assistência", disse o garoto, entregando o número do celular.

Acostumado a aventurar-se por barracas de bugigangas na Índia, China, Rússia - nos últimos quatro anos, rodou mais de 30 países -, o executivo se surpreendeu. Jovens como Mouse exibem cartazes de papelão com xerox das capas de CDs e DVDs disponíveis. O comprador escolhe o que quer, confia o dinheiro ao vendedor, que some nas dezenas de portinhas suspeitas, entre pontos comerciais legais espalhados pela rua, para buscar a encomenda. "Eu mesmo não tenho nada", diz o camelô. Assim, evitam batidas policiais, pois não pode ser flagrado com os produtos.

"Eles não escondem vender produtos piratas. Na China, os falsificadores tentam aproximar o visual do produto original e vendê-lo como tal, como fazem com as bolsas Louis Vuitton", compara Beeman. "Mas o fato de se preocuparem em esconder os produtos é um avanço. Eles sabem que estão fazendo algo fora da lei e podem ser pegos. Quando comecei, não havia essa preocupação."

Mouse fica com 10% do que vende. O custo da falsificação não chega a 5% da unidade. O resto vai para o crime organizado. O garoto consegue vender, no mínimo, uma dezena de CDs e DVDs por dia, mas raramente ganha mais do que um salário mínimo por mês. "Jovens como ele são os que menos lucram. São o lado explorado."

Crime Organizado

Ambulantes como Mouse estão no fim da linha de um negócio que já é a principal fonte de receita do crime organizado, segundo a Interpol, movimentando U$ 516 bilhões por ano - mais do que os U$ 322 bilhões do narcotráfico - e que encontra os principais pontos de comércio do Brasil em locais como a Rua 25 de Março e calçadas da Santa Ifigênia, em São Paulo.

Entre os esforços de Beeman para combater o principal problema da Microsoft, está o desenvolvimento de tecnologia que dificulte a falsificação - o Windows Vista, por exemplo, pede validação online ao ser instalado e limita o número de licenças de uso a 20 computadores. Também inclui acordos com governos e entidades locais para enrijecer leis, aumentar a repressão ao crime e lançar campanhas educativas.

Na semana passada, Beeman foi surpreendido por uma lição vinda de casa. "Pai, isso aqui não é pirataria?", perguntou um dos quatro filhos, de 9 anos, ao vê-lo copiar a música infantil Curious George do CD emprestado de um amigo. "Ele me fez comprar a música da Internet. Às vezes, a gente não se dá conta de fazer algo errado. Pirataria se combate também com educação."





Fonte: Agência de Notícias

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