Com o início da construção previsto para setembro, o novo acelerador de elétrons do Brasil, batizado de Sirius e orçado em R$ 650 milhões, deve ser o mais poderoso da América Latina e um dos mais avançados do mundo. Atualmente, o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas, abriga um síncroton de segunda geração, chamado de UVX, utilizado por pesquisadores e empresas de todo o continente. Mas suas limitações levaram o LNLS na direção de um acelerador de terceira geração, que colocará o Brasil em uma posição de maior competitividade científica. Com ele, buscam-se mais possibilidades de pesquisas e maior colaboração com cientistas de outras nações, atraídos pela nova tecnologia.
A luz síncroton é de extrema importância para o desenvolvimento científico e tecnológico, pois ela propicia o estudo da matéria em suas mais variadas formas. “Ela ‘penetra’ em materiais orgânicos e inorgânicos, permitindo desvendar seu arranjo atômico e molecular. É a ferramenta experimental com o maior número de aplicações e de maior impacto sobre o conhecimento e desenvolvimento de materiais, incluindo os biológicos”, explica o professor doutor Antonio José Roque da Silva, diretor do LNLS.
Dessa forma, o projeto conceitual de Sirius foi elaborado e submetido à avaliação de um grupo de especialistas de aceleradores do Brasil e do exterior. Após reconhecer a qualidade do trabalho, a comissão o considerou “ambicioso”. Segundo Nelson Velho de Castro Faria, professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e integrante da comissão, a opção técnica do LNLS foi elogiada e considerada excelente para os padrões de hoje. Faria e seus companheiros provocaram os técnicos do laboratório a ousar e tentar condições para uma máquina do futuro (emitância menor do que 1 nanômetro). “Os técnicos do LNLS aceitaram o desafio. Na reunião da Comissão Internacional, em 2013, a nova proposta foi apresentada e discutida, sendo bastante elogiada”, diz Faria.
É a ferramenta experimental com o maior número de aplicações e de maior impacto sobre o conhecimento e desenvolvimento de materiais, incluindo os biológicos
Enquanto o síncroton atual tem alta emitância, quando comparado com os síncrotons mais modernos, e impossibilidade de gerar raio-X de alta energia, devido à baixa energia dos elétrons, que é de 1,37 GeV (gigaelétron-volt), a nova fonte de luz síncrotron brasileira terá uma energia de elétrons maior do que o dobro (3 GeV) e uma emitância aproximadamente 360 vezes menor (0.28 nm.rad) do que a do anel atual. “Nesse caso, menos é mais. Essa combinação fará com que o brilho da radiação emitida seja, em certas frequências, mais de um bilhão de vezes superior ao que a fonte atual disponibiliza para os pesquisadores brasileiros hoje”, argumenta Roque.
Rosângela Itri, professora do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e integrante do comitê científico internacional, que avalia o atual síncroton a cada dois anos sobre as atividades e avanços atingidos, explica que o novo síncroton, em termos de brilhância, propiciará o desenvolvimento de novas linhas para análise de materiais e imagens. “Tal característica, acoplada à redução nas dimensões finais do feixe de luz atingindo amostras a serem analisadas, possibilitarão o uso de novas técnicas e metodologias não disponíveis no Brasil e na América Latina”. Conforme Roque, os raios-X dezenas de vezes mais energéticos que o Síncrotron atual permitirão penetrar materiais como o concreto, em até centímetros, bem como estudar materiais importantes, como terras raras.
De acordo com o diretor do LNLS, o projeto brasileiro almeja ser o síncrotron com a menor emitância e, portanto, o maior brilho dentro da sua classe de energia. “Sirius colocará o Brasil em condições de competir com os melhores aceleradores do mundo”, diz. Para o professor Mikael Eriksson, diretor de Máquina do MAX-IV, o novo síncrotron da Suécia que está em construção, e um dos especialistas do comitê internacional independente, o aumento da performance do brilho vai levar Sirius para a próxima geração de fontes de luz síncroton. “Esta geração, que consiste agora de MAX IV e Sirius (pelo menos mais seis em todo o mundo podem seguir esse caminho mais tarde), vai permitir investigações mais rápidas e mais precisas da matéria. Experiências que não poderiam ser feitas antes, porque eram muito demoradas, agora serão possíveis”, aponta.
Segundo Faria, ter um acelerador de elétrons de terceira geração no Brasil vai permitir condições de pesquisa encontradas em poucos laboratórios no mundo. “Uma consequência mensurável será o aumento do número de pesquisadores e da qualidade da pesquisa nacional”, explica. Para Roque, não somente o número, mas a diversidade e competitividade das pesquisas deverá aumentar, porque o Brasil contará com um equipamento que permite dar respostas a um número muito maior de perguntas formuladas pela ciência.
O custo total é estimado em R$ 650 milhões, bancados pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, outras instituições públicas e parceiros privados. Com uma área total de 42 mil metros quadrados, o projeto conceitual de Sirius está pronto, mas o projeto executivo da parte civil ainda está em curso, e deverá ser concluído entre maio e junho deste ano. As atividades de limpeza de terreno, terraplanagem e drenagem principiarão em abril e se estenderão até agosto, para que a construção de Sirius comece em setembro. O cronograma prevê o primeiro feixe no meio do ano de 2016 e a expectativa de abertura para os usuários, em 2017.
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