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Repórter News - reporternews.com.br
Nacional
Segunda - 30 de Outubro de 2006 às 00:49
Por: Natuza Nery

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Geraldo Alckmin (PSDB) apresentou-se na noite de domingo ao Brasil para reconhecer a derrota sem alterar o conhecido semblante sereno. Diante do assédio das câmeras, ele não mordeu os lábios, único gesto que o denuncia nervoso.

O tucano entrou na disputa presidencial com uma plumagem curta e de cores opacas. Ultrapassou a barreira do segundo turno, mas saiu da corrida presidencial menor do que entrou nesta etapa.

No primeiro turno, Alckmin obteve 39,97 milhões de votos, enquanto neste domingo saiu com o apoio de 37,5 milhões de votos. Mas aliados vêem um crescimento no cacife político do tucano.

"Há vitórias políticas que são eleitorais... e há vitórias políticas, apesar do desempenho eleitoral. Geraldo, em qualquer circunstância, é politicamente vitorioso", contemporizou o senador Sérgio Guerra (PE), coordenador-geral da campanha tucana. Em seguida, reconheceu: "ele fez uma campanha praticamente sozinho."

Mas Alckmin isolou-se também por característica pessoal. Diante de uma bateria quase diária de fogo amigo, ele ignorou praticamente todas as críticas e sugestões para mudanças de sua estratégia eleitoral. O candidato ouvia muito, mas só seguia os conselhos de seu marketeiro, o jornalista Luiz González.

Obstinado, não acreditou nas pesquisas. Mas pouco depois das 19h de domingo, recluso em seu apartamento no Morumbi, ele parou de sonhar.

O desejo de subir a rampa do Palácio do Planalto foi adiado. E o resultado do segundo turno tornou mais distante o objetivo, ainda inconfesso, de voltar a concorrer em 2010, conforme muitos interlocutores já propagavam durante a semana.

Acompanhado apenas da família durante todo o período da apuração dos votos, o tucano encerrou sua escalada presidencial da mesma forma que começou: praticamente sozinho. Sem bandeiras, sem aliados, sem os companheiros de partido.

Diante de poucos militantes que compareceram ao ato de despedida, ele disse ter feito o "máximo que pôde".

No mesmo local onde celebrou o resultado de 1o de outubro, um palanque tímido denunciava o imediato abandono político. Entre todas as lideranças nacionais que protagonizaram a guerra contra o governo nesses meses recentes, estavam a seu lado somente o governador eleito de São Paulo, José Serra, e o líder tucano no Senado, Arthur Virgílio (AM).

Apesar de ter encolhido nos votos, surpresa que encheu seus auxiliares de decepção, a avaliação predominante é de que, mesmo assim, ele surge da disputa no papel de liderança nacional.

"Hoje ele é um político com essa característica", disse o governador de São Paulo, Cláudio Lembo.

ERROS FATAIS

Uma sucessão de erros contribuíram para derrota, avaliam integrantes da oposição em caráter reservado.

Apesar de ter conseguido chegar ao segundo turno, a campanha demorou para voltar às ruas. A proposta feita ao PT, e aceita prontamente, de reiniciar a propaganda gratuita na TV somente doze dias depois do primeiro turno, desmobilizou a militância e esfriou a disputa.

Nas análises internas, Lula trabalhou melhor e mais rápido. Costurou alianças sólidas. No segundo dia do mês, seus ministros já estavam à cata de votos e o presidente, atraindo às suas fileiras aliados de grande peso eleitoral.

Naquela ocasião, Geraldo Alckmin começava mal sua cruzada por novas adesões. Não obteve o apoio público do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), como esperado, e recebeu o "atabalhoado" apoio do polêmico Anthony Garotinho (PMDB), ex-governador do Rio de Janeiro. O movimento criou mal estar com o PFL carioca e implodiu a campanha no Estado.

O tiro fatal, segundo apontam alguns correligionários, foi a reação tardia e mal arquitetada às acusações do PT de que, se eleito, privatizaria estatais como o Banco do Brasil, Correios e Petrobras.

"Acho que houve falta de estratégia competente. O marketing da campanha fracassou. Se pudéssemos ter trocado o nosso marketeiro pelo marketeiro do Lula, talvez isso não tivesse acontecido", desabafou o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), referindo-se a uma das tantas explicações para a derrota.

DOM QUIXOTE TUCANO

Para muitos de seus assessores diretos, o candidato derrotado resume a criação do escritor espanhol Miguel de Cervantes.

Como o personagem da literatura, "Dom Quixote de la Mancha" da política lutou sozinho contra os "moinhos de vento". Faltaram figurantes que incorporassem o fiel escudeiro Sancho Pança.

"Será boa guerra, pois é grande serviço prestado a Deus o de extirpar tão má semente da face da terra". A frase não é de Alckmin, mas do próprio Dom Quixote, ao se deparar com os "gigantes" inimigos.

Ela poderia significar muitas das frases proferidas pelo candidato ao longo da campanha, quando repetia, incansavelmente, que iria "varrer a praga da corrupção" do país.

"Ele combateu os adversários com galhardia", disse o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, um dos apontados como "desaparecido político" pela campanha.

"O doutor Geraldo é um predestinado, dedicado ao trabalho. Eu o reconheço como uma figura de um verdadeiro herói. Tenho duas referências na minha vida: ele e o meu pai", desabafou emociado o capitão da Polícia Militar, Marcelo José Rabello Vianna, ajudante de ordem de Geraldo Alckmin desde 1998, antes de saber do resultado.




Fonte: Reuters

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