''Google'' genômico acelera a pesquisa de novos remédios
A nova ferramenta, que por enquanto funciona apenas com parte de seu potencial, é uma grande malha que mostra em detalhe as relações entre diversos tipos de drogas e variadas doenças. Batizado de "Mapa da Conectividade", o novo recurso foi todo feito com base no genoma (veja quadro à direita) e estará disponível de graça para qualquer cientista.
"Criamos um site com uma pequena caixa de busca, como o Google, mas onde você digita nomes de um grupo de genes", disse à Folha o geneticista Justin Lamb, do Instituto Broad (um consórcio entre Harvard e MIT), um dos criadores da ferramenta. "Apertando o botão, aparece uma lista de drogas numa ordem de prioridade, pela qual você pode navegar e comparar com suas hipóteses."
A idéia é simples, mas mero o fato de o banco de dados ser grande e estruturado de modo sistemático faz uma diferença brutal. Por enquanto, o site inclui dados sobre 164 drogas (a meta inicial é ampliar para 1.400), mas foram incluídos dados genéticos de um número bem menor de doenças, só o bastante para avaliar o método.
Atalho eletrônico
Na opinião de cientistas, a ferramenta pode adiantar em alguns anos a descoberta de tratamentos. Entre entender como uma doença afeta as células e descobrir uma proteína relacionada a ela --um defeito na proteína p53, por exemplo, pode causar câncer_ é um processo longo. Depois, ainda é preciso fazer enormes triagens para achar drogas que afetem a proteína em questão.
"Criamos um atalho que pode cortar a etapa central: podemos relacionar a doença diretamente à atividade da droga", diz Lamb, que detalha o método em um estudo na edição de hoje da revista "Science" (www.sciencemag.org).
Para verificar se o Mapa da Conectividade pode de fato render descobertas úteis, colaboradores de Lamb fizeram experimentos que já mostram bons resultados. Em um deles, o oncologista Scott Armstrong, do Instituto de Câncer Dana-Farber, descobriu uma droga que deve ajudar a tratar pacientes de leucemia que não reagem bem à quimioterapia.
O médico retirou amostras de células de pessoas em que o tratamento funcionou e dos casos em que fracassou. Ao usar a ferramenta de Lamb para comparar o padrão de ativação de genes dos dois grupos, descobriu que a droga rapamicina pode inibir com a rejeição. Testes de laboratório mostraram que ele estava certo, e o medicamento deve em breve ser testado em pacientes.
Cientistas ouvidos pela Folha se mostraram entusiasmados com a perspectiva que o trabalho de Lamb traz, mas acreditam que ele ainda pode ser aprimorado no futuro.
"A questão agora é se eles vão ser capazes de replicar esses experimentos e expandi-los", diz o geneticista brasileiro Marcelo Nóbrega, professor da Universidade de Chicago. "Mas esses resultados preliminares foram mesmo muito bons", diz.
"Entrei no site deles e já estou curioso para avaliar lá os achados que a gente tem com genes ligados a esquizofrenia", diz Emmanuel Dias Neto, da Faculdade de Medicina da USP.
O que mais surpreendeu os cientistas, porém, foi o fato de que o banco de dados foi alimentado só com dados de experimentos in vitro. Resta saber se será preciso fazer testes com animais (mais caros e demorados) para refinar o mapa.
Comentários