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Sábado - 16 de Setembro de 2006 às 09:15

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"Todo clássico é verdadeiro". É assim que Eriberto Leão define Sinhá Moça. Aos 34 anos, esta é a sexta novela do ator em dez anos de carreira. Mais que isso. A atual trama das seis da Globo é o trabalho mais intenso e bem-sucedido de Eriberto na tevê. A começar pela riqueza de seu personagem. Filho da escrava Maria das Dores e do Barão de Araruna, quando pequeno chamava-se Rafael e foi renegado, sem saber, pelo pai - que o vendeu com sua mãe a um mercador de escravos. Mais velho, educado e com uma carta de alforria nas mãos, retorna à fictícia Araruna como o jornalista Dimas, nome que adota para poder se vingar do Barão.

Orgulhoso, o ator só não está com saudades do idealista Dimas desde já porque dois novos projetos estão confirmados. Um dia depois de terminarem as gravações da novela, ele começa a filmar seu segundo longa-metragem, Um Homem Qualquer - do paulistano Caio Vécchio. Em seguida, Eriberto interpretará o revolucionário Genesco de Castro, seu personagem na minissérie Amazônia: de Galvez a Chico Mendes, assinada por Glória Perez e prevista para estrear em janeiro. "O que me atrai na profissão é poder ser um ator que contribui, de maneira eficiente, com a cultura do nosso País", diz.

Sinhá Moça já está na reta final, restando exatas quatro semanas. Como você avalia esse "remake" após mais de cinco meses no ar?

Sinhá Moça é uma obra difícil. A trama é bastante pesada, trata da escravidão, tem muito sofrimento e dor. Por isso, é uma vitória termos conseguido conquistar a audiência com uma novela que fala de um momento histórico difícil do Brasil e que toca na ferida do nosso País. Penso até que, caso contrário, a novela poderia ser usada como exemplo de que "obras sérias não dão audiência". E isso não é verdade. Elas dão audiência sim, e este é o nosso caso. Por exemplo, se compararmos esta novela com Alma Gêmea - sua antecessora -, são duas obras distintas e ambas de sucesso. E o que eu tenho mais orgulho é de fazer parte de uma novela séria, com um texto de altíssima qualidade, porque Sinhá Moça é um clássico da dramaturgia brasileira.

Na trama, o Dimas vem dizendo que não tentará mais matar o Barão para a Sinhá Moça não sofrer. Mas como fica o plano de vingança dele?

Acho que o Dimas trocou o assassinato pela humilhação que ele quer causar ao Barão de Araruna, vivido por Osmar Prado. Então, ele vai escrever um artigo no jornal em que entrega todas as atrocidades que o Barão cometeu em vida, as maldades cometidas por ele na senzala - desde os tempos de criança do Dimas. Além disso, ele acusa o Barão de ter matado o Capitão do Mato de uma forma muito cruel, porque o Capitão foi ferido pelo feitor e o Barão mandou jogá-lo - ainda vivo - no rio. Enfim, o objetivo do Dimas é desmascarar o Barão a qualquer custo, e acho que seu golpe final vai ser quando ele revelar que é seu filho. O Dimas e o Barão têm pouquíssimos encontros, mas são sempre muito fortes. Na trama, ele ainda não sabe que é meu pai. Ainda vão ter vários embates entre os dois. Agora, nesta fase final, a história vai ser Barão "versus" Rafael. Estou ansioso.

É melhor trabalhar numa trama rústica, como Sinhá Moça?

O prazeroso é trabalhar numa obra de extrema qualidade, independentemente se é de época, rústica ou urbana. Então, prefiro fazer Sinhá Moça do que uma novela em outro horário que vai me dar muito mais exposição na mídia, mas que não trata de temas que me interessam. Como eu também posso fazer uma novela em outro horário, que seja atual, mas que tenha temas interessantes. E até hoje na minha carreira - e tenho dez anos de profissão -, todos os meus personagens, inclusive o Dimas, seguem essa linha, tanto na tevê quanto no teatro. Estudei muito, li diversos livros sobre a escravatura. O meu grande barato é "entrar de cabeça" no personagem. Assim cresço como ser humano e meus personagens também enriquecem com esse conhecimento.

Como você vê essa versão da Edmara e da Edilene Barbosa em relação ao original do pai, Benedito Ruy Barbosa, exibido na Globo há 20 anos?

Sinhá Moça é um clássico. E todo clássico é verdadeiro. Se você pegar qualquer obra de Shakespeare, de qualquer época, vai ver que é super atual. Além disso, a novela trata da escravidão, tema que é mal compreendido pela sociedade brasileira até hoje. O problema é que Sinhá Moça, assim como as outras novelas, é uma obra descartável. Depois desta, vem outra e mais outra, sucessivamente. Acho que tramas como esta são pouco aproveitadas no sentido da conscientização. Vivemos em meio a uma mediocridade enorme. E a tevê não aproveita temas fortes para fazer uma análise mais profunda - até para aproveitar os 36 pontos de média de audiência, o que representa muita gente. Mas independentemente disso, a novela é um sucesso. Aonde quer que eu vá, é impressionante a maneira como as pessoas falam bem da trama. A culpa não é só da mídia, mas de todos nós que deixamos de contribuir um pouco mais.

As novelas são caras e, por isso, as emissoras esperam que sejam lucrativas. Como você vê essa relação novela e audiência?

Sempre há uma cobrança. Por exemplo, fiz uma novela muito fraca de audiência, que foi O Amor Está no Ar - exibida em 1997, na Globo. Depois, fiquei 7 anos fora da emissora e acabei indo para a Band. A partir daí, fui fazer teatro e não aconteceu de eu voltar logo. Mas achei essa queda muito positiva. Naquele momento, eu precisava amadurecer. Fiz muito teatro e espetáculos importantes. Sempre tive a sorte de ser protagonista. Já tive platéia lotada, assim como platéias de apenas dez pessoas. Já vivi o fracasso e o sucesso. É como diz uma música do U2, "não há nada que você possa jogar em mim que já não tenham jogado". Inclusive, eu já tive uma banda, a Hip Monsters. Lembro que nós éramos a "sensação" do festival Abril Pró-Rock. No entanto, fomos vaiados por 8 mil pessoas. A banda acabou ali. Eu era o vocalista. Mas hoje entendo porque tudo isso aconteceu. Não era pela música, mas por uma outra coisa que eu daria certo.

Por sua temática, Sinhá Moça marca uma nova etapa na sua carreira profissional?

Sem dúvida. E não só na minha vida, mas na de todos que a fizeram e também na da emissora. Essa novela foi totalmente feita com "Base Light", um software holandês de tratamento de imagem. É uma trama que tem planos de cinema, com linguagem e luz específica. É a primeira novela feita com essa tecnologia. Então, temos uma novela de planos lentos - o que no começo incomodou muita gente, porque falaram que a imagem tremia. É Barroca, é trevas e luz. E naquele tempo, era tudo mais lento mesmo. Acho um marco na história da tevê brasileira e digo isso sem nenhuma arrogância. Tanto que foi indicada ao Emmy. A Globo escolheu três obras, entre elas, Sinhá Moça.

Você sente falta desse tipo de produção na tevê? Porque há uma seqüência, e há novelas que não têm a profundidade de Sinhá...

Acho que toda novela têm ¿ fora raras exceções - matéria-prima para discutir questões brasileiras pertinentes. Cobras & Lagartos, por exemplo, tem isso com a Luxus, que faz uma sátira à Daslu - famosa loja de milionários, em São Paulo. Mas, acima de tudo, acho que falta ação da minha classe. Porque é muito fácil "pegar" um ator pela vaidade. "Fala de você, dos cremes que usa...". Lógico que isso é importante. Temos de ter auto-estima, de nos cuidar. Ninguém aqui é São Francisco de Assis. Mas é que fica só nisso, há um egocentrismo muito grande. Sinto falta de homens com uma visão mais crítica. Se Brasil vê novela para caramba, que bom! Mas temos de usar esse "poder" para mudar aos poucos. Porque ninguém vai fazer milagre. Só tem de ter cuidado para não se iludir. Isso não alimenta ninguém. Conheço muita gente famosa que é triste. O que alimenta são os ideais.

Sangue libertário Eriberto Leão está revelando uma vocação para representar ativistas políticos. Na atual novela das seis da Globo, o ator, junto com Rodolfo e Sinhá Moça, personagens de Danton Mello e Débora Falabella, é um dos líderes do movimento abolicionista de Araruna. Terminada a trama, ele começa a preparação de Genesco de Castro, revolucionário pró-libertação do Acre que viverá em Amazônia: De Galvez a Chico Mendes. Na minissérie de Glória Perez, que terá duas fases, Genesco será um dos principais personagens do segundo período da trama. Ele vai lutar ao lado do irmão Plácido de Castro, o grande líder do movimento armado contra a Bolívia - que proclamou a independência do estado do Acre. "Ele foi um dos maiores heróis brasileiros, da mesma envergadura de Simon Bolívar, Che Guevara e Ghandi", enobrece.

Embora já tenha feito pesquisas sobre o tema que a minissérie irá explorar, Eriberto confessa que nunca tinha "ouvido falar" de Plácido de Castro. Desde então, começou a ler sobre o assunto e se apaixonou. Na trama, Plácido é assassinado friamente em uma emboscada organizada pelo governo federal. Com a morte do irmão, Genesco e a mãe, Dona Zefrina de Oliveira Castro, vão lutar por justiça. "Acredito que, quando você é sincero - como já dizia Raul Seixas - e deseja profundamente, as coisas acontecem. Por mim, passo o resto da vida fazendo personagens que têm algo a dizer", torce.

Inspiração familiar Como o próprio Eriberto Leão diz, "nada é por acaso". Antes de Sinhá Moça, o ator experimentou o sucesso na pele do Tomé de Cabocla ¿ rapaz analfabeto, mas de grande coração e caráter inabalável. Tal perfil fez com que ele se lembrasse do avô, Leulindo Leão, que trabalhava no campo como classificador de algodão. De acordo com o ator, seu Leulindo foi humilhado a vida inteira por ser um homem honesto e recusar-se a mentir sobre a qualidade dos algodões. "Ele dizia sempre: 'eu não minto'. E foi isso que ensinou para todos os netos. Meu avô teve 20 filhos", recorda. Em homenagem ao avô, o ator pegou o sobrenome Leão de seu nome completo - Eriberto de Castro Leão Monteiro. Independentemente da lembrança, seu atual personagem - o Dimas - é sem dúvida o mais importante papel do ator nesses dez anos de tevê. Tanto pelo conteúdo quanto pela forma, este certamente será lembrado sempre com carinho. "Meu personagem é como um Castro Alves, que considero o maior poeta brasileiro. Ele coloca o dedo na ferida mesmo!", exalta.

Trajetória televisiva Antônio dos Milagres (CNT/Gazeta, 1996) - Fernando Bulhões/Santo Antônio O Amor Está no Ar (Globo, 1997) - João Serras Azuis (Band, 1998) - Padre Walter Marcas da Paixão (Record, 2000) - Ivan Barreto Cabocla (Globo, 2004) - Tomé Sob Nova Direção (Globo, 2004) - Episódio "Simpatia é Quase Horror" Linha Direta (Globo, 2005) - Episódio "A Bomba do Riocentro" Sinhá Moça (Globo, 2006) - Dimas





Fonte: Terra

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