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Nacional
Segunda - 26 de Junho de 2006 às 10:04

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Se todos os projetos do poder legislativo federal para combater o trabalho escravo fossem aprovados hoje, os proprietários de fazendas escravagistas teriam suas terras expropriadas sem indenização, créditos negados em instituições públicas e privadas, pagariam pesadas multas e responderiam por crime conta o sistema econômico e crime hediondo, sujeitos a até dez anos de prisão, sem direito à pena alternativa.

Há pelo menos 12 projetos de lei e de emendas à Constituição que tramitam no Congresso Nacional para tentar coibir o trabalho escravo no Brasil, alguns deles propostos há mais de dez anos. As soluções sugeridas pelos parlamentares seguem por quatro caminhos: confisco de terras, multas, penas mais severas para o crime e restrição a créditos financeiros e incentivos estatais.

Até agora, a proposta de emenda constitucional (PEC) nº 438 é a que conseguiu chegar mais perto da aprovação. Considerada pelos órgãos governamentais e entidades da sociedade civil como um dos projetos mais importantes, a chamada "PEC do trabalho escravo" dá nova redação à lei que trata do confisco de propriedades em que forem encontratadas lavouras de plantas psicotrópicas ilegais, como a maconha. A PEC acrescenta a exploração de mão-de-obra análoga à escravidão nos requisitos para expropriação.

No Senado Federal, ela foi aprovada após dois anos de tramitação. Já na Câmara, apesar de ter sido apresentada pela primeira vez em 1995, empacou após sua aprovação em primeiro turno. Isso se deve à falta de vontade política e, principalmente, à pressão da bancada ruralista. Deputados como Ronaldo Caiado (PFL-GO) e Kátia Abreu (PFL-TO) atuam fortemente contra a sua aprovação.

Vale lembrar que a PEC só conseguiu sair da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC), onde estava parada, devido à visibilidade que o tema ganhou após o assassinato de três auditores fiscais e um motorista do Ministério do Trabalho e Emprego, em Unaí (MG), durante uma emboscada tramada por fazendeiros locais em janeiro de 2004. A comoção popular ainda empurrou a proposta plenário adentro, garantindo a aprovação em primeiro turno. Hoje, passados dois anos da chacina, nem a PEC está aprovada, nem os mandantes do crime presos.

"Se a sociedade não pressionar, acho muito difícil que a bancada ruralista permita que esse tema volte à pauta", reclama o deputado Tarcísio Zimmerman (PT-RS), relator da PEC na Câmara.

Outro projeto importante é o que altera o artigo nº 149 do Código Penal, que tipifica o crime de trabalho escravo e dispõe sobre suas penas. Proposto no Senado por Tasso Jereissati (PSDB-CE) há três anos, o projeto de lei define com mais precisão o que é trabalho escravo e inclui também, como punição, o confisco de equipamentos utilizados nas fazendas e bens produzidos por trabalhadores vítimas do crime. Prevê também o aumento da pena, que passaria de um mínimo de dois e um máximo de oito anos para um mínimo de cinco e um máximo de dez anos de prisão. O maior tempo de pena mínima contribuirá para impedir que os condenados consigam converter a cadeia em pena alternativa - que só pode ser concedida quando o réu tem de cumprir até quatro anos de reclusão.

A alteração já foi aprovada no Senado e hoje está nas mãos do deputado Vicentinho (PT-SP), na Comissão de Comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público. "Ele está tentando aprovar o projeto faz tempo, mas pedem vistas, relatórios, emendas, projetos apensados. Há um lobby muito grande para segurá-lo", explica Paulo César, chefe de gabinete do deputado.

Dos doze projetos, sete estão parados na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara ou do Senado, por onde passam quase todos os projetos de lei. Devido à sobrecarga da comissão, as propostas dependem de vontade política para serem aprovadas e continuarem tramitando. Para se ter uma idéia de quanto tempo uma proposição pode aguardar para ser analisada, está nessa comissão desde 1997 um projeto de lei que tipifica o trabalho escravo também como infração contra a ordem econômica. De acordo com um funcionário da comissão no Senado, o ano eleitoral e a grande quantidade de CPIs atrasam o trabalho. O sub-chefe de gabinete do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), João Rios, corrobora a avaliação de Zimmerman: "Se não houver clamor popular é muito difícil esses projetos saírem do papel". O senador é autor de um segundo projeto de confisco de terras onde houver trabalho escravo, que também aguarda aprovação da CCJC.

Punições econômicas Para o subprocurador-geral do Ministério Público do Trabalho e Coordenador Nacional da Conaete (Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo), Luís Antônio Camargo de Melo, o confisco de terras e uma melhor tipificação do crime melhorariam o trabalho de combate à escravidão. "Uma punição eficaz será aquela que irá atingir o criminoso onde ele é mais sensível: na garantia da propriedade e no pagamento de indenizações", sustenta Camargo.

Uma outra solução encontrada para punir o trabalho escravo é impedir o financiamento estatal ou a participação em licitações de empresas que utilizaram esse tipo de maõ-de-obra. Há pelo menos quatro projetos, todos eles emperrados em comissões, que seguem por esse caminho.

Essas leis vêm para fortalecer medidas já tomadas pelo próprio Poder Executivo, como a criação, por meio de uma portaria do Ministério do Trabalho e Emprego, do cadastro de empregadores que comprovadamente flagrados cometendo esse crime. Essa relação, atualizada semestralmente, ficou conhecida como a "lista suja" do trabalho escravo e tornou-se referência internacional.

Quem é inserido nela, fica impossibilitado de receber crédito em agências públicas de financiamento como o Banco do Brasil, Banco do Nordeste e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e em alguns bancos privados nacionais e internacionais, como o Bradesco, o Santander e o ABN Amro Real. Empresas varejistas e atacadistas, indústrias e tradings signatários do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo também utilizam o cadastro para escolher seus fornecedores.

Contudo, como ainda não há lei que regulamente a lista, criminosos encontram brechas na legislação e conseguem tirar seus nomes da relação. Hoje, há 28 fazendas que conseguiram suspender temporariamente sua inclusão no cadastro através de ações nas Justiças Federal e do Trabalho.





Fonte: Repórter Brasil

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