Sorteio da Globo na Copa é investigado
A rede já faturou R$ 60 milhões com a promoção "Seleção do Faustão" e espera chegar a R$ 100 milhões, até o final da Copa. A participação nos sorteios é feita com o envio de torpedo do telefone celular para um número indicado pela emissora, ao custo de R$ 4, mais impostos, que variam de um Estado para outro. No Rio, o custo final é de R$ 5,35.
A legislação não permite a venda de bilhetes para sorteios privados. Pela Constituição, só a União pode explorar jogos. O regulamento da promoção, disponível no site da Globo, diz que ela é permitida pelo decreto 70.951/72, que regula as premiações gratuitas, mediante sorteio, vale-brinde ou concurso, a título de propaganda.
A Globo diz que a promoção visa explorar a convergência de mídias.
Em 2003, a Globo fez promoção parecida, a "Jogada da Sorte", aproveitando a mesma brecha legal. O advogado Luiz Nogueira entrou com reclamação no Ministério Público Federal, sob o argumento de que os sorteios não eram gratuitos e se enquadravam na definição de loterias da lei das contravenções penais. Ele representou novamente contra a Globo.
A 3ª Câmara de Coordenação e Revisão (Consumidor, Ordem Econômica e Economia Popular) da Procuradoria Geral da República, em maio de 2004, concluiu que a "Jogada da Sorte" não era premiação gratuita, pois dependia da compra de calendário de futebol, e que a Caixa Econômica Federal não poderia ter autorizado os sorteios. Segundo Nogueira, o MPF deveria ter entrado com uma ação na Justiça, mas não o fez.
A premiação que está em curso é uma repetição da anterior, do ponto de vista legal, mas com possibilidade de captação de recursos muito maior. Enquanto a primeira dependia da venda dos calendários em bancas de jornais e casas lotéricas, os torpedos podem ser enviados a qualquer hora, de qualquer ponto do território, bastando usar o celular. Há, no Brasil, 92 milhões de celulares.
Oficialmente, os prêmios são brindes para promover a venda de boletins informativos sobre a Copa do Mundo. A cada torpedo enviado, o participante recebe dez mensagens curtas, em seu celular, e passa a concorrer aos sorteios. O conteúdo banal das mensagens reforça a idéia de que os boletins são apenas ingresso para o jogo.
A reportagem enviou um torpedo na quinta. O primeiro boletim informava que o número de gols em Copas somava 1.977 e que o gol 2.000 seria atingido ainda na primeira fase do campeonato. A marca já tinha sido registrada havia dois dias pelo atacante sueco Allback.
A CEF chegou a reclamar com a Globo de que os anúncios de divulgação da promoção não destacavam os boletins, mas apenas os sorteios.
Só pelos prêmios
Premiados confirmam que enviaram os torpedos em razão dos sorteios. "Paguei uma taxa para concorrer a um prêmio, como se tivesse comprado um bilhete", diz Kátia de Oliveira Gurgel, 33, de Itabirito (MG), que ganhou um computador.
O artigo 11 do decreto que autoriza sorteios gratuitos diz que não serão aprovados planos que permitam ao interessado ""transformar a autorização em processo de exploração de sorteios, concursos ou vale-brindes, como fonte de receita".
A própria Globo, em coluna publicada em maio por Daniel Castro, na Folha, informou que esperava receber 40 milhões de ligações, o que lhe daria uma receita bruta de R$ 160 milhões. A meta foi revista para baixo, segundo os números fornecidos ontem pela Globosat.
Segundo o presidente do Sindicato das Casas Lotéricas de São Paulo, Luiz Carlos Peralta, o faturamento mensal com a venda dos jogos federais no Estado é de R$ 150 milhões. No regulamento da promoção, consta que serão distribuídos R$ 12 milhões em prêmios.
Reincidência
Há dez anos, as redes tentam elevar as receitas com sorteios. A primeira investida começou no final de 1996, quando o Ministério da Justiça autorizou a realização de sorteios por entidades filantrópicas, com divulgação pela TV e captação de apostas por telefonemas. As grandes redes de TV aderiram aos sorteios, na ocasião, utilizando o prefixo 0900.
Em 98, a Justiça Federal de São Paulo proibiu os telessorteios associados a ligações telefônicas e bloqueou a receita que as emissoras de TV tinham auferido com os jogos.
Além da brecha legal dos sorteios promocionais, há os lastreados em títulos de capitalização, autorizados pela Susep (Superintendência de Seguros Privados). A Tele-Sena, do grupo Silvio Santos, é um exemplo.
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