Negado provimento a recurso de cassação do prefeito de Brasnorte
No recurso a coligação pedia a reforma da sentença proferida pelo juízo da 60ª Zona Eleitoral que julgou improcedente a acusação de compra de voto devido ás inconsistências das provas apresentadas no processo. Em seu voto o juiz relator entendeu que para ensejar cassação de diploma com base no artigo 41-A da Lei 9.504/97, é necessário que se apresente provas robustas e incontestáveis.
Leia a íntegra do voto do juiz relator Gilberto Vilarindo dos Santos.
V O T O S
O EXMº SR. DR. GILBERTO VILARINDO DOS SANTOS (RELATOR)
O recurso é tempestivo, conforme observo na certidão de fl. 654.
Não havendo preliminares a serem enfrentadas, passo ao exame do mérito recursal.
O art. 41-A da Lei nº 9.504/97 dispõe, in verbis:
“Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro de candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990”.
Nesse diapasão, convém salientar que para restar configurado o ilícito previsto no art. 41-A da Lei nº 9.504/97, ou seja, a captação ilegal de sufrágio, não se faz necessária a aferição da ocorrência do desequilíbrio na disputa eleitoral, bastando a simples verificação da potencialidade lesiva em influenciar na vontade de uma única pessoa apta a votar, posto que o bem jurídico que a norma em destaque visa proteger diretamente, não é o resultado do pleito, senão a sua legitimidade, além de focar na livre vontade e liberdade de escolha do eleitor.
Pois bem, para isso é necessário que esse aliciamento eleitoral fique devidamente e exaustivamente comprovado nos autos, uma vez que no afã de proteger a vontade e a liberdade de escolha de um ou de vários eleitores, a Justiça Eleitoral não pode se apoiar em provas frágeis, isoladas, que não se sustentam juridicamente, para cassar mandatos eletivos, pois aí, sim, estará a cometer injustiça com todos os demais eleitores que votaram nesses mesmos candidatos.
A partir dessas observações, anoto que de acordo com o que foi apurado nos autos, inexiste provas hábeis, seguras e robustas, tanto de natureza documental quanto testemunhal, de que os ora Recorridos participaram direta ou indiretamente dos fatos narrados na Ação de Investigação Judicial, ação esta, friso, que originou o presente Recurso.
Conforme bem asseverou, em outras palavras, o Magistrado que conduziu o feito na Primeira Instância e o sentenciou, as testemunhas arroladas pela Coligação Recorrente não se mostraram idôneas e confiáveis, pelo contrário, vê-se claramente que seus depoimentos estão comprometidos com um ou outro partido/candidato, razão pela qual algumas delas foram ouvidas apenas como informantes.
Merece destaque o fato de que além de gravações feitas sem o conhecimento e sem a participação dos Recorridos, as principais provas carreadas para a Representação consistem nos depoimentos de testemunhas arroladas pela Coligação Recorrente, firmados por meio de Escrituras Públicas (fls. 58/62).
Ao todo são cinco Escrituras Públicas, cujos declarantes são JOSÉ CARLOS FULGÊNCIO, MARIA GORETE BELARMINO FULGÊNCIO, MARISTER CAMILLO SCRAMUCIN, CLÓVIS SILVA DOS SANTOS e EZEQUIAS PEREIRA DA SILVA.
Observo que essas declarações, com algumas e poucas diferenças, contêm o mesmo conteúdo, vale dizer, noticiam o suposto aliciamento eleitoral cometido a mando ou com o conhecimento dos Recorridos, por intermédio, principalmente, de CLÁUDIO WOSNIAK, conhecido como “CLÁUDIO BORRACHEIRO” e de ALESSANDRO DE AGUIAR, cuja alcunha é “PELÚCIA”.
Na última declaração, prestada por EZEQUIAS PEREIRA DA SILVA, este revela que seu patrão, candidato a Vereador PEDRO COELHO, igualmente teria lhe dado 50,00 (cinqüenta reais) para votar nele e em MAURO RUI HEISLER, um dos Recorridos.
Ressalto, ainda, que todos chegaram a declarar estar dispostos a responder civil e criminalmente pelos atos firmados nas respectivas Escrituras Públicas.
Pois bem, a história começa a tomar nova forma e rumo, antes mesmo dos referidos denunciantes/declarantes serem ouvidos em Juízo, uma vez que a defesa dos Recorridos na Instância Singela trouxe para os autos novas Escrituras Públicas firmadas por JOSÉ CARLOS FULGÊNCIO (fl. 140) e pela Senhora MARIA GORETE BELARMINO FULGÊNCIO (fls. 143/143-verso), onde os mesmos declaram, desta vez, que não presenciaram nenhuma compra de voto pelos senhores conhecidos como “CLÁUDIO BORRACHEIRO” e “PELÚCIA”, quer a mando, quer não dos Recorridos.
Declaram, ademais, que logo após o término das eleições, o Representante da Coligação Recorrente, o Senhor CELESTE ROSIN, foi quem os procurou para que os mesmos prestassem aquelas primeiras declarações, oferecendo-lhes dinheiro na ocasião, resumindo nos seguintes termos:
JOSÉ CARLOS FULGÊNCIO: "Que no começo do mês de outubro depois das eleições municipais de 2004, eu fui procurado pela Senhora CELESTE ROSIN e pela Prefeita Isolete Correa Rodrigues, pata ir a Campo Novo dos Parecis, fazer uma Escritura Público Declaratória, para dizer o que teria acontecido no dia 03 de outubro de 2004, nas eleições municipais, no Posto Mundo Novo, onde a mesma foi fiscal pela Coligação Brasnorte Cada Vez Mais Forte, que em momento algum eu vi o Senhor Cláudio Wosniak, mais conhecido como Cláudio Borracheiro, candidato a Vereador pela Coligação"3" Oposição e a Solução", tirar alguém da fila, dar pinga ou mercadorias para alguém, muito menos comprar votos para alguém, para ele próprio, para o Candidato a Prefeito Mauro Rui e que em momento algum sequer falou com o Cláudio, que as eleições de 03 de outubro de 2004, correram sem nenhum transtorno e que as coisas que em declarei no dia 10 de outubro de 2004, em Campo Novo do Parecis, foi a Senhora Marister Camilo que pediu para eu fala, junto com a Senhora Isolete e a Senhora Celeste Rosin, e que em nenhum momento eu vi o Senhor Eudes de Aguiar, alcunha Biba, no posto Mundo Novo, na qual estive durante toda eleição do dia 03 de outubro de 2004,e só declarei esses fatos pelo medo de ficar se casa para morar com minha família, pois durante a Campanha toda ouvíamos da Senhora Isolete Correa Rodrigues, que caso as pessoas que morassem nas suas casas não votassem nela, seria,m despejadas. Sendo assim, agora tendo condição de ter ou outro lugar para morar, resolvi refazer minha declaração e reparar meu erro".
MARIA GORETE BELARMINO FULGÊNCIO: "Que no começo do mês de outubro , depois das eleições de 2004, fui procurada pelo Senhor Celeste Rosin e pela Prefeita Senhora Isolete Correa Rodrigues para ir a Campo Novo do Parecis para fazer uma Escritura Pública declarativa para dizer o que teria acontecido no dia 03 de outubro de 2004 na eleições municipais, sendo que eu era fiscal pela Coligação Brasnorte Cada Vez Mais Forte,.Que em momento nenhum eu vi o Senhor Cláudio Wosniak, candidato a Vereador pela Coligação 3º Opção é a Solução, tentando tirar alguém da fila ou ao menor comprar voto de alguém para si ou para o candidato a prefeito Mauro, e que em nenhum momento eu vi o Sr. Eudes de Aguiar, vulgo (Biba), no posto Mundo Novo, do qual estive durante toda a votação do dia 03 de Outubro de 2004, e que sim estas informações quem me disse foi a Srª Marister Camillo após a Derrota do dia 03 de outubro. Eu Maria Goretti, digo também que me senti pressionada pela Srª Isolete Correa Rodrigues e pelo Sr. Celeste Rossin que se não fizesse tal escritura pública iria ter que desecupar a casa onde moro com meus 05 filhos que é da sua madeireira, ao me sentir ameaçada e ter que ir para a rua sem ter onde morar, resolvi ir a Campo Novo do Parecis com o Sr. Antonio Prado e fiz tal Escritura Pública declaratória no dia 10 de Outubro de 2004. Ao conseguir uma casa para morar com minha família e não depender mais da casa da prefeita Isolete Correa Rodrigues, fiz esta declaração de livre e espontânea vontade, reparando o meu erro. Digo também que enquanto estávamos em Campo Novo dos Parecis chegou o Sr. Ezequias Pereira da Silva, também declarante, junto com a Srª Marister Camillo e o Sr. Lira, segurança da Prefeita Isolete Correa Rodrigues no carro Santana Oficial da Prefeitura. Logo após esta de posse de tais declarações, o Sr. Prado seguiu pra Cuiabá, deixando todos nós na rodoviária de Campo Novo dos Parecis para retornarmos de ônibus, onde então o Sr. Ezequias falou varias vezes que o Sr. Celeste combinou de lhe pagar, quanto não sei, e que em momento algum eu sair do local de votação, nem com a Srª Marister Camillo, nem com ninguém e também não é do meu conhecimento que a Srª Mariter Camillo foi ameaçada por alguém.".
Já ouvido em Juízo às fls. 406/407, disse JOSÉ CARLOS FULGÊNCIO: “No dia da eleição fui para Mundo Novo como fiscal, eu e minha mulher. Não vi o Cláudio, candidato a vereador comprar nenhum voto ou oferecer qualquer coisa para os eleitores. Não vi o Cláudio chamando ninguém para sair da fila ou conversar. Haviam índios votando, e eu vi ele conversando, não só com índio mais com todo mundo e de maneira normal. A Marister comentou com a gente que o Cláudio Borracheiro estava comprando voto, mas a gente não viu. Fiquei o dia todo em Mundo Novo. Para Campo Novo veio eu e a minha mulher, o motorista Prado e mais um rapaz que não fez a declaração porque esqueceu os documentos (o Jorjão). Encontramos o Ezequias no cartório a tarde. Voltamos para Brasnorte de ônibus, junto com Ezequias que havia pego uma carona até o Posto Norte. O Ezequias veio com o Lira, segurança da prefeita. Na hora que a gente estava almoçando ele estava chegando com a Marister, com o carro da prefeita, talvez um Santana. O Ezequias perguntou se a gente tinha ganho alguma coisa, e respondemos que não, mas ele disse que já saiu “acertado” de Brasnorte. Uma vez ele foi lá em casa, na morada do sol, e perguntou de novo se a gente havia recebido alguma coisa, e depois não falou mais nada.”.
Quanto ao depoimento prestado em juízo pela Senhora MARIA GORETE BELARMINO FULGÊNCIO, colhido às fls. 411/412, embora contenha alguns contornos diferentes do relatado por seu esposo JOSÉ CARLOS FULGÊNCIO, nada oferece de contraditório que possa colocar em dúvida a versão destes na presença daquele Magistrado.
Vejo ainda, como importante a salientar, que ambos, MARIA GORETE e JOSÉ CARLOS FULGÊNCIO, declaram ter trabalhado naquelas eleições para a candidata ISOLETE, então Prefeita do Município de Brasnorte/MT, e adversária política dos Recorridos, o que conduz à suposição de que menor razão teriam para agir contra os interesses desta última, desmentindo os fatos que anteriormente tinham firmado via aquelas Escrituras Públicas.
Por outro lado, ouvida em Juízo conforme declaração de fls. 418/419, MARISTER CAMILLO SCRAMUCIN, foi contraditada por demonstrar interesse no litígio, uma vez ser a mesma detentora, à época, de Cargo Comissionado na Prefeitura de Brasnorte/MT, quando à frente de sua administração encontrava-se a então Prefeita ISOLETE.
Nota-se em seu depoimento, todavia, mesmo colhido com reservas, muita insegurança e incerteza na descrição dos fatos, pouco sendo aproveitado, efetivamente, para o deslinde de qualquer dúvida acerca da existência ou não do aliciamento eleitoral imputado aos Recorridos.
Com relação ao Senhor CLÓVIS SILVA DOS SANTOS, que por sua vez, é o subscritor da quarta Escritura Pública juntada com a Representação, seu depoimento não restou colhido em Juízo, demonstrando inócuas, assim, as declarações firmadas em Cartório para o fim proposto na presente ação.
Também foram contraditadas as testemunhas PEDRO COELHO (fl. 408) e EUDES DE AGUIAR (fl. 409), todas por manifestarem, de alguma forma, interesse direto ou indireto na causa.
O mesmo aconteceu com CLÁUDIO WOZNIAK, vulgo “CLÁUDIO BORRACHEIRO”, ouvido às fls. 404/405, e com ALESSANDRO ROGÉRIO DE AGUIAR (fl. 403), sobre os quais pesa a acusação de abordagem de eleitores na fila de votação em pedido de votos para MAURO RUI HEISLER, candidato a Prefeito e ora Recorrido, em troca de pagamento em dinheiro.
Das afirmações do primeiro – CLÁUDIO WOZNIAK – ressai de mais contundente que “... As declarações prestadas por Marister, em 100% não são verdade. Nem cheguei perto do ônibus dos índios. No dia da eleição aconteceu o seguinte: vinham dois eleitores que tinham votado e eles queriam me passar um recado, e era pra mim acompanhar eles, e nos dirigimos em direção ao Posto de Saúde, e nesse momento, e eles disseram que a Marister estava com o n. 25 pintado nas unhas, e pediram para mim fazer alguma coisa, e que a Marister estava sentada bem na porta da urna, mostrando a unha, sugerindo tal ato aos eleitores. Aí eu fui falar com ela e ela ficou braba. Ela se alvoroçou, mas começou a procurar acetona. Daí é que meus fiscais chegaram e pediram para ela tirar o número, e ela deu um jeito de roer a unha. Somente na parte da tarde é que eu fiquei sabendo que estava sendo procurado para ser preso porque eu tinha comprado voto e “tale coisa e coisa tale”. A presidente da mesa me chamou para ver o que estava acontecendo e que a Marister estava reclamando muito, e eu expliquei que tinha demorado para aparecer por estava em casa, então ela disse que não tinha fundamento o que a Marister reclamou para ela. Os fiscais da outra coligação ficaram na minha cola, o Carlos Fulgêncio e o Ede, mas eu somente fui advertido pela Gorete e pela Marister. Não me recordo de ter falado com o Fulgêncio sobre compra de voto. O Fulgêncio foi meu vizinho por mais de dez anos. Encheram meu estabelecimento e o local de votação com propaganda eleitoral, inclusive eu tive que limpar depois na parte da tarde. Pode até ser que eu falei que comprei votos, mas não me recordo, se houve foi de brincadeira, imagine.”.
Convém registrar também o que o mesmo Depoente afirmou em relação à intervenção do Órgão Ministerial (fl. 405): “O único ônibus que eu vi chegando foi na parte da tarde, e inclusive parou longe da minha borracharia. Na parte da manhã não presenciei a chegada de nenhum ônibus. Não conversei com os índios, as únicas pessoas que eu conversei foram com os dois eleitores que já haviam votado. Eu não estava portando nenhum material de campanha e quando eu cheguei já havia o tumulto dos fiscais do outro partido. A gente já sabia que eles iriam fiscalizar mesmo e atuar efetivamente na campanha. Não entrei dentro de nenhum ônibus e nem dei dinheiro aos índios. Os dois que eu disse que conversei, que me chamaram para falar da Marister, eram índios, e fomos andando e conversando até a frente do posto de saúde, e também já voltamos. O meu “santinho” de propaganda eleitoral era vermelho.”.
Em favor dos Recorridos destacam-se as declarações de JAILSON PRADO (fl. 410), que afirmou morar em Brasnorte/MT, há 19 anos e não ter sido procurado por ninguém, antes ou no dia do pleito, para votar em nenhum candidato e, principalmente, de VALQUÍRIA PEREIRA MENDONÇA (fl. 415), cujo teor é o seguinte: “Vim depor porque foi ameaçada pela coligação do partido 25, do lado da Isolete. Eu trabalhava na campanha com a Isolete, e minha mãe trabalhava junto comigo, e ela saiu e foi trabalhar para o lado do 22, do Mauro, mas eu fiquei trabalhando com a Isolete. Como minha mãe passou para o lado do 22 eles queriam que eu gravasse um áudio, a Jane e a Bel, secretárias do comitê. Elas entraram em contato com o Adriano e o Adriano ia entrar em contato com o Celeste para ele me ensinar a gravar. Eu falei que não tinha como gravar, porque eu sei que o homem (Mauro) não dá nada para ninguém. Peguei o gravador e fui embora para casa, às 18:00h, meia hora depois a Jane e a Bel foram me pegar para me levar para ensinar a gravar. Meu marido até brigou comigo. Eles me levaram atrás do cemitério, e se eu conseguisse a gravação meu marido iria subir, porque ele é funcionário público de Brasnorte. Elas queriam que eu gravasse o Mauro dando alguma coisa para alguém. A promessa era de que meu marido iria deixar de ser gari e iria subir na profissão, e o Sr. Celeste me ofereceu R$ 30.000 (trinta mil reais), se eu conseguisse a gravação. Eu não gravei e devolvi o gravador. No dia seguinte, quando eu fui trabalhar, a Jane e a Bel disseram que se eu abrisse o bico eu ia ser atropelada na rua. Esses fatos aconteceram bem no começo da política. Aí eu saí do comitê da Isolete e fui trabalhar para o Mauro.”.
Verdadeiras ou não, total ou parcialmente, as declarações da mencionada Depoente afiguram-se interessantes, ao passo que num momento fazem referência a uma gravação de áudio, e este instrumento, de uma outra maneira, restou utilizado como indício de prova pela Recorrente no ajuizamento da Ação de Investigação Judicial.
Por oportuno, ressalto que o CD de áudio cujo conteúdo vê-se degravado nos autos às fls. 31/33, assim como a fita VHS cujas imagens e falas vêem-se reproduzidas às fls. 52/57, estão longe de configurar qualquer ilícito eleitoral, posto que tais materiais, ao que tudo ficou demonstrado na instrução probatória, foram obtidos clandestinamente, e ainda assim não apontam sequer a participação indireta dos Recorridos numa das condutas descritas no art. 41-A da Lei nº 9.504/97.
Atribui-se também ao Recorrido MAURO RUI HEISLER, a doação de medicamentos e de mercadorias a eleitores indígenas, tendo como alvos principais os silvícolas de uma comunidade próxima a Brasnorte/MT, colhidos os depoimentos de CARLOS ALBERTO POLETTO (fl. 416) e CLAUDETE TREVISAN (fl. 417) conferem em mão oposta e invalidando tais acusações, posto inexistir qualquer impugnação pela Recorrente, às suas declarações, se não vejamos:
CARLOS ALBERTO POLETTO, proprietário do Supermercado Alvorada, em Brasnorte/MT, disse que: “O Mauro é meu freguês há muitos anos, e o Sebastião não. O Celeste também não é meu freguês. O Mauro somente faz compras para a casa dele. O faturamento do meu mercado permaneceu o mesmo dos meses anteriores à eleição. Nas ocasiões que fazia as compras às vezes ia ele, às vezes a mulher dele. Não foi nenhum eleitor adquirir mercadoria em nome do Mauro e o Mauro também não comprou cestas básicas na época eleitoral. A Prefeita atual não é minha freguesa.”.
CLAUDETE TREVISAN, proprietária da Farmácia e Laboratório São Lucas, afirmou que: “Em Brasnorte existem três farmácias sendo que uma é a minha, e eu só assino por ela. ... O candidato Mauro é meu cliente, desde há muito tempo atrás, sendo que eu abri a farmácia em 1992, e a partir de então ele foi meu cliente. As compras eram feitas diretamente pelo Mauro, sendo que ele consome pouco mensalmente, considerando ainda que sua sogra é hipertensa e também a perda do seu filho, teve mais alguns gastos, lembrou também que sua esposa consome alguns medicamentos. Não veio nenhuma pessoa autorizada pelo Mauro para buscar medicamentos na minha farmácia.”.
Diante de tais declarações, nada mais justo e óbvio, penso eu, que se o Recorrido pretendesse ou estivesse doando mercadorias e medicamentos às vésperas do pleito a eleitores, indígenas ou não, em troca de seus votos, utilizasse desses dois estabelecimentos para realizar essas doações, sobretudo até pela facilidade de conseguir prazo para pagamento do que fosse consumido, dado o grau de amizade compartilhado com seus respectivos proprietários.
Assim, uma vez mais o que se vê diante deste Sodalício, são meras ilações de uma das partes, na tentativa de provar algo, que segundo ela, teria ocorrido, enquanto o que sobressai, à evidência, é o que verdadeiramente não restou demonstrado em toda a fase probatória.
Isto põe por terra, conseqüentemente, a acusação de que Recorrido MAURO RUI HEISLER teria declarado, expressamente, em seu programa de propaganda política eleitoral, levado a efeito em 22/09/2004, que realizou tais distribuições, consoante o clipping eletrônico visto às fls. 49/50, mesmo não sendo esta matéria adequada para apuração via esta demanda.
Por conta de tudo que foi exposto, assinalo que as provas trazidas à colação pela Recorrente, notadamente o CD cujo conteúdo foi degravado às fls. 31/33, e as cédulas de R$ 50,00 (cinqüenta reais) vistas às fls. 34/35, revestem-se de elevado grau de insegurança e fragilidade, a desmerecem qualquer valor probatório.
Quanto às referidas cédulas falsas de dinheiro, ninguém sabe quem as recebeu e se alguém recebeu alguma delas, e se o propósito desse recebimento foi o de votar nos Recorridos. Além disso, se foi para votar nos Recorridos, o que se admite por mera especulação, não houve, por derradeiro, nenhuma confirmação sobre tais fatos em Juízo.
Tais provas, ao meu ver, além de serem isoladas, padecem do vício ainda maior de não terem sido submetidas ao crivo do contraditório.
Na verdade, todas as provas se mostram isoladas do contexto dos autos, mas somadas a algumas das provas testemunhais igualmente produzidas no feito, acabam por revelar um farto material construído pela Recorrente, como verdadeiro arcabouço de sua insatisfação com a derrota no pleito passado.
Um outro ponto importante a se destacar e anotar, é o de que embora a Recorrente – Coligação BRASNORTE CADA VEZ MAIS FORTE, tenha submetido ao crivo desta Justiça Eleitoral, esse grande arcabouço de provas tentando demonstrar os supostos ilícitos cometidos pelos Recorridos, isso só o fez depois do resultado das eleições, mais precisamente em 12 de novembro de 2004.
Também bastante curioso, é o fato de que nenhum dos Depoentes procurou a própria Justiça Eleitoral ou o Representante do Ministério Público Eleitoral daquela localidade, para narrar tais acontecimentos, preferindo, um por um, relatar sua respectiva versão para o próprio Representante da Recorrente, o Senhor Celeste Rosin.
Como podemos constatar, Senhor Presidente e Eminentes Pares, através dos depoimentos antes mencionados, nada mais se comprova, do que as formas de disputa de um pleito eleitoral, além da tentativa desesperadora da Recorrente de, a todo custo, reverter um resultado desfavorável nas urnas de seus candidatos, uma vez repita-se, que as provas por ela carreadas aos autos, revestem-se de enorme fragilidade e precariedade.
Todos sabemos que a conduta vedada pelo artigo 41-A da Lei nº 9.504/97, consiste na captação ilícita de votos e tende a abalar a normalidade e legitimidade das eleições, e para que reste tal ilícito configurado, é necessário e se requer provas sólidas e contundentes.
Só assim, a ameaça ou a efetiva prática de abuso de poder econômico e de autoridade poderá ser repelida pela Justiça Eleitoral, não podendo esta Justiça Especializada, de maneira alguma, depois do resultado das urnas, interferir na livre e verdadeira vontade do eleitor.
No mais, convém salientar que a captação ilícita de sufrágio pode ocorrer mesmo que o candidato não tenha lançado mão desse recurso diretamente, mas, de todo caso, exige-se seu pleno conhecimento e anuência com o comportamento proibido e praticado por terceiros, o que não se evidenciou e muito menos ficou provado nos presentes autos.
De outra forma, não vejo como se cassar os mandatos eletivos dos candidatos e ora Recorridos, que foram eleitos pela maioria do seu eleitorado, sob pena de, ao contrário, inverter a ordem das coisas, além do que se estar praticando um ato de verdadeira injustiça.
O entendimento e a jurisprudência do Egrégio Tribunal Superior Eleitoral, e deste Sodalício consolidaram-se no sentido de se exigir provas robustas e incontroversas, assim como o nexo de causalidade entre as condutas e atos abusivos praticados na captação ilícita de sufrágio, para a cassação de mandatos eletivos, conforme alguns de seus julgados que cito a seguir:
1 - ACÓRDÃO 25335 CONCEIÇÃO DO COITE - BA 01/12/2005
Relator(a) FRANCISCO CESAR ASFOR ROCHA Relator(a) designado(a)
Publicação DJ - Diário de Justiça, Volume 1, Tomo -, Data 17/03/2006, Página 148 Ementa RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2004. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL. DISTRIBUIÇÃO DE COMBUSTÍVEL PARA PARTICIPAÇÃO EM COMÍCIO (ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97 E ART. 22 DA LC Nº 64/90). REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO CONFIGURADO.
I - Para a caracterização da conduta do art. 41-A da Lei das Eleições, necessário que o candidato direta ou indiretamente tenha ofertado a benesse em troca de voto, o que não restou provado nos autos.
II - A teor da jurisprudência deste Tribunal, a procedência da investigação judicial eleitoral requer a demonstração da potencialidade de o ato influir no resultado do pleito. In casu, o acórdão asseverou não estar demonstrada a potencialidade, conclusão que, para ser afastada, requer reexame de fatos e provas.
III - O dissídio jurisprudencial requer, para sua caracterização, não só o devido confronto analítico, como também a identidade ou semelhança entre o julgado e o paradigma, afastadas na espécie.
IV - Recurso não conhecido.
RECURSO ELEITORAL - NOVA SANTA HELENA - REFERENTE AO PROCESSO Nº 103/2004 DA 23ª ZONA ELEITORAL - AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO.
ACÓRDÃO Nº 15631/2005
RECURSO ELEITORAL - AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL - CARGOS MAJORITÁRIOS - COMPRA DE VOTOS - NÃO CARACTERIZAÇÃO - IMPROVIMENTO.
A cassação de mandatos via Ação de Investigação Judicial somente pode se dar quando há nos autos prova robusta, inconcussa e estreme de dúvida do abuso alegado.
Recurso a que se nega provimento. Precedentes do Eg. TSE e da própria Corte Regional Eleitoral.
(Publicado no DJ/MT, em 19/12/2005).
1 – ACÓRDÃO 21312 CONCEIÇÃO DO TOCANTINS - TO 02/12/2003 Relator(a)
CARLOS MÁRIO DA SILVA VELLOSO Relator(a) designado(a)
Publicação DJ - Diário de Justiça, Volume 1, Data 20/02/2004, Página 101
RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 15, Tomo 1, Página 241
Ementa ELEITORAL - AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CASSAÇÃO DE DIPLOMA DE PREFEITO E VICE-PREFEITO E DECLARAÇÃO DE INELEGIBILIDADE. REFORMA DA DECISÃO PELO TRE. PROVAS INSUBSISTENTES. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADO. DISTINÇÃO ENTRE CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E ABUSO DO PODER ECONÔMICO. PRECEDENTES.
- Impossibilidade de se infirmar decisão regional que, ao analisar a prova dos autos, inclusive testemunhal, assentou a inexistência de captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico (Súmula nº 279/STF).
Agravo regimental a que se nega provimento.
Jurisprudência do TRE/MT:
“RECURSO ELEITORAL – REPRESENTAÇÃO ELEITORAL – CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO – INOCORRÊNCIA – PROVA TESTEMUNHAL – AUSÊNCIA DE ROBUSTEZ – RECURSO IMPROVIDO – SENTENÇA MANTIDA.
Para a caracterização da captação ilícita de sufrágio, exige-se prova robusta que demonstre o liame entre os fatos alegados e os testemunhos colhidos, bem como a anuência do beneficiário às condutas abusivas e ilícitas capituladas no art. 41-A, da Lei nº 9.504/97, conforme precedentes do TSE. ”
(Ac. 15.508 – Proc. 1487 – Pontes e Lacerda – Rel. Dr. Alexandre Elias Filho – DJ de 03/08/05 – P. 40).
“ RECURSO ELEITORAL – CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO – CONDENAÇÃO – DISTRIBUIÇÃO DE ‘VALES-COMBUSTÍVEIS’ A ELEITORES – AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA E INCONTESTÁVEL DO ABUSO DE PODER ECONÔMICO IMPUTADO AO CANDIATO ELEITO – ABSOLVIÇÃO DECRETADA – PRELIMINARES SUSCITADAS OBJETIVANDO ANULAR O ÉDITO CONDENATÓRIO DECLARADAS PREJUDICADAS – RECURSO PROVIDO – SENTENÇA REFORMADA.
Em se tratando de representação eleitoral por abuso de poder econômico, a condenação de candidato eleito acusado de captação ilegal de sufrágio, (...), somente se justifica diante de provas inconcussas e verossímeis da prática desse crime eleitoral. ”
(Ac. 15.498 – Proc. 1527 – Denise – Rel. Dr. Antonio Bitar Filho – DJ de 11/07/05 – P. 61).
“ RECURSO ELEITORAL – CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO – AUSÊNCIA DE BENEFÍCIO – OU PARTICIPAÇÃO DE CANDIDATO – FRAGILIDADE DAS PROVAS – INOCORRÊNCIA DO REFERIDO ABUSO – RECURSO IMPROVIDO – SENTENÇA MANTIDA.
A condenação em sede de representação com fundamento no artigo 41-A, requer provas robustas e incontestáveis que corroborem a prática de captação ilegal de sufrágio, inobstante prescinde da participação direta do candidato. ”
(Ac. 15.433 – Proc. 1533 – Dom Aquino – Rel. Des. Paulo Inácio Dias Lessa – DJ de 31/03/2005 – P. 42).
Assim, e diante de todo o exposto, constato que a Recorrente não logrou êxito em provar o ilícito imputado aos ora Recorridos, sem o que não há como restar caracterizado o abuso de poder econômico a eles imputados.
Com tais considerações, Senhor Presidente e Eminentes Pares, NEGO PROVIMENTO ao presente Recurso, em consonância com o parecer da Douta Procuradoria Regional Eleitoral.
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