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Cidades/Geral
Sábado - 26 de Novembro de 2005 às 08:09

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Numa região remota da fronteira seca do Brasil com a Bolívia, distante 410 km de Cuiabá, a Funai tenta criar a Terra Indígena Portal do Encantado, de 43.057 hectares, para descendentes de bolivianos que vivem em Mato Grosso, e que seriam indivíduos da etnia chiquitana. Esse tema, tratado discretamente há quatro anos, pode ser a chave para se implantar 32 reservas para esse povo ao longo dos 730 km da linha imaginária que une os dois países.

A reserva Portal do Encantado, que a Funai quer implantar isolaria parte da fronteira com a Bolívia e avançaria até o Parque Estadual Serra de Santa Bárbara. Juntas as duas áreas somariam 162.149 hectares. Fração da região pretendida pela Funai pertence ao Ministério da Defesa que ali mantém o Destacamento Militar de Santa Rita. A maior parte da área é ocupada por pecuaristas.

A comunidade que reside na área discorda da criação da reserva e discorda ainda mais da tentativa da Funai de transformá-la na etnia chiquitana. Esse assunto, que extrapola a questão indígena e avança pela questão da segurança nacional foi debatido nesta sexta-feira, em Porto Esperidião, numa Audiência Pública da Assembléia Legislativa. Todos os políticos estiveram lá. Na verdade, quase todos. Evidentemente, para dizer que são a favor dos eleitores.

A audiência transformou-se numa grande tribuna para autoridades e moradores da fronteira extravasarem o descontentamento com a proposta da criação da reserva. Não houve debates, porque a Funai embora convidada não mandou representantes, e o padre de Porto Esperidião, Adevair Braga Caldeira - que defende o posicionamento da Funai -, também não se fez presente.

O deputado José Riva (PP), autor do requerimento que convocou a audiência definiu a proposta de criação da reserva como "inusitada". Disse que a Funai quer transformar o cidadão brasileiro livre em indivíduo tutelado. Riva anunciou que a Assembléia pedirá ao Tribunal Regional Eleitoral que faça consulta plebiscitária na região em questão para que a população se manifeste. E o governador Blairo Maggi assegurou que os recursos necessários para esse plebiscito serão bancados pelo governo.

O governador Blairo Maggi se posicionou contrário à criação da reserva e revelou que enviou farta documentação ao Ministério da Justiça, Funai, Procuradoria Geral da República e Polícia Federal, contendo um levantamento sigiloso efetuado pelo Serviço Reservado da Polícia Militar, onde consta que a população da faixa de fronteira é contrária à tentativa de ser criar reserva para aquele que seria o povo chiquitano.

Na prática, até o momento, a Funai elaborou e aprovou um laudo antropológico para a criação da reserva Portal do Encantado. Os municípios de Porto Esperidião, Pontes e Lacerda, e Vila Bela da Santíssima Trindade - base territorial postulada - entrarão com contraditório no Ministério Público Federal na próxima segunda-feira. Solidários com as prefeituras o governo estadual, Assembléia Legislativa e a Federação da Agricultura e Pecuária (Famato) também serão signatários do documento.

Uma faixa estendida na audiência deixava claro a resistência dos moradores da fronteira: "Somos descendentes de bolivianos, e não índios como quer a Funai".

O professor Roberto Luciano Ortiz da Silva, descendente de bolivianos e casado com Acilda Costa Leite, filha de casal boliviano, conhece a realidade da área onde se pretende implantar a reserva. Roberto leciona na Escola Estadual Indígena Chiquitano, na comunidade de Acorizal, de Porto Esperidião, e que tem 120 alunos. Segundo ele, nem os estudantes nem seus familiares sabem o dialeto chiquitano, e na região a maioria absoluta não aceita a idéia de se criar tal reserva.

A população da comunidade Acorizal, onde a Funai que implantar a reserva é mesclada de brasileiros e bolivianos. Aparecido Reis Siqueira é paulista e vive em Acorizal há mais de 12 anos. Aparecido liderou um grupo de moradores que enfrentou 200 km de rodovia de chão para participar da audiência. "A Funai está semeando a discórdia. Ela quer que a gente deixe de ser brasileiro para virar índio boliviano e isso não aceitamos", se posicionou.

O presidente da Famato, Homero Pereira, alertou para o risco de que a proposta da Funai tenha por objetivo a internacionalização da Amazônia. "Eles já fizeram isso antes, quando da criação da reserva binacional ianomâmi, numa área que tem rica província mineral entre o Brasil e a Venezuela", comparou.

Homero salientou que tem informações que a Funai com apoio de ONGs e do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) pretende criar 32 reservas na fronteia seca com a Bolívia, de Cáceres a Comodoro.





Fonte: 24 HorasNews

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