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Sábado - 19 de Março de 2005 às 11:34

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Até hoje, 15 anos depois, a Globo ainda deve estar arrependida por não ter produzido a novela Pantanal. Afinal, antes de levar o projeto para a Manchete, o autor Benedito Ruy Barbosa ainda tentou emplacá-lo na Globo. Em vão. Na época, o então "todo-poderoso" vice-presidente da emissora, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, argumentou que a região não oferecia a infra-estrutura necessária para produzir a novela. Azar o da Globo.

A trama, que estreou na extinta Manchete em 27 de março de 1990, entrou para a história da teledramaturgia brasileira por ter sido uma das poucas a ameaçar a supremacia da líder, com uma média de 40 pontos de audiência. "Tivemos problemas, sim, e muitos, durante as gravações, mas jamais, em tempo algum, ator ou atriz se queixaram por estarem gravando no Pantanal. Pelo contrário. Adoravam", garante o autor.

De fato, a inexplorada paisagem pantaneira foi um dos trunfos da novela. Na ocasião, Boni ainda mandou uma equipe, formada pelo autor Benedito Ruy Barbosa e pelos diretores Herval Rossano e Atílio Riccó, para avaliar as condições do lugar. Como a época era de cheias no Pantanal, Herval só fez fotografar água e matas. Bichos? Só capivaras. Pássaros? Só o velho papagaio falastrão que o cantor Sérgio Reis mantinha num poleiro, na porta da cozinha da única pousada que existia por lá.

Por essas e outras, a Globo justificou o engavetamento do projeto. "Tentei imaginar a Glorinha Pires trabalhando lá e não consegui. Ator da Globo não se sujeitaria àquilo", recorda Herval Rossano, hoje diretor de A Escrava Isaura, da Record, citando a atriz inicialmente cotada para o papel de Juma Marruá.

Mais do que depressa, o então diretor artístico da Manchete, Jayme Monjardim, convidou um descontente Benedito Ruy Barbosa a mudar de emissora. Hoje diretor de América, da Globo, Monjardim reproduz o diálogo travado entre os dois na ocasião: "Qual é o seu sonho, Benedito?", perguntou ele. "Fazer uma novela no Pantanal", respondeu o autor. "Então, vamos fazer o seguinte: Eu realizo o seu sonho e você, o meu, que é tê-lo na Manchete. Fechado?". Fechado.

Logo, os dois se puseram a escalar o elenco, mesclando jovens talentos, como Cristiana Oliveira, Marcos Palmeira e Carolina Ferraz, com veteranos esquecidos, como Sérgio Britto, Nathália Timberg e Cláudio Marzo. Intérprete de três personagens - entre eles o lendário Velho do Rio, que, à noite, se transformava em sucuri -, Cláudio Marzo só aceitou fazer a novela porque teria a rara oportunidade de conhecer o Pantanal. E pensar que, a princípio, o ator só faria uma participação especial nos primeiros capítulos... "Gostei tanto que virei para o Jayme e perguntei: 'Vem cá, não tem como eu continuar na novela, não? Por que eu não posso fazer também aquele Velho do Rio?", recorda.

Gravar no Pantanal, de fato, não foi uma experiência das mais fáceis. Para chegar lá, os atores viajavam de avião até Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, e, depois, pegavam um bimotor até a fazenda que servia de locação para a novela. No local, não havia televisão ou telefones. A comunicação com o Rio e São Paulo, por exemplo, era feita através de barulhentos rádios amadores. "Na fazenda, também não havia quartos individuais. Mas não estou reclamando. Meus colegas de quarto eram o Sérgio Reis e o Almir Satter. Toda noite, tinha seresta", diverte-se Cláudio.

Logo, o inesperado sucesso da novela começou a compensar todas as dificuldades. Mesmo quem não gostava muito de gravar no Pantanal, como foi o caso da atriz Cristiana Oliveira, reconhece a importância da novela não só na sua carreira, mas também na história da teledramaturgia brasileira. "No último dia de gravação, chorei muito. Vi o quanto aquilo tinha sido importante para mim e mudado a minha vida. Caí no rio de roupa e tudo e agradeci a Juma por tudo que ela tinha me dado", emociona-se Cristiana Oliveira, referindo-se à selvagem Juma Marruá.

Selva de números

Na trama de Benedito Ruy Barbosa, Juma Marruá era uma jovem pantaneira que, quando acuada, virava onça. Mas, na verdade, quem virou onça mesmo foi a concorrência. Na época, Jayme Monjardim esperava terminar a novela das oito da Globo, A Rainha da Sucata, de Sílvio de Abreu, para só então pôr no ar Pantanal.

"As duas novelas jamais concorreram no mesmo horário e nunca deixaram de fazer sucesso. Mesmo assim, a imprensa tentou de todas as maneiras acabar com a reputação de Rainha da Sucata, inclusive acusando a novela de ter sido encomendada pelo então presidente de triste memória, Fernando Collor de Mello, para divulgar o seu nefando plano econômico", queixa-se o autor Sílvio de Abreu.

Com o arrebatador sucesso de Pantanal, a Globo viu-se obrigada a tirar da programação, um por um, todos os programas de sua linha de shows, como o Chico Anysio Show e o TV Pirata.

Não satisfeita, inaugurou também, em outubro de 1990, um novo horário de telenovelas, o das 21h30, na esperança de competir com Pantanal. De nada adiantou. Feita às pressas, a novela Araponga, escrita por Dias Gomes, Ferreira Gullar e Lauro César Muniz, nada pôde fazer para reverter a situação.

No último capítulo de Pantanal, exibido em 11 de dezembro de 1990, a novela da Manchete atingiu históricos 41 pontos de audiência, contra apenas 21 de Araponga, da Globo, cinco do Programa Hebe, do SBT e um do filme Divina Loucura, da Band. "Na época, a Globo programou o filme Os Intocáveis para competir com a gente. Mesmo assim, demos de lavada. No dia seguinte, publiquei o seguinte anúncio nos jornais: 'Pantanal continua intocável!'", diverte-se Monjardim.



Instantâneas # A novela Pantanal não foi a primeira de Benedito Ruy Barbosa a ser recusada pela Globo. Antes disso, a emissora já havia rejeitado a sinopse de Os Imigrantes. Resultado: a novela foi produzida em 1981 pela Band. # A produção da Manchete já foi exibida em diversos países, como Rússia, Grécia, Itália e Estados Unidos. No Brasil, o acervo original permanece abandonado numa sala qualquer da antiga sede da Manchete na Zona Sul do Rio. # A novela da Manchete entrou para a história também graças aos intermináveis banhos de rio das personagens Juma, Guta e Muda, interpretadas por Cristiana Oliveira, Luciene Adami e Andréa Richa, respectivamente. # Na trilha sonora da novela, algumas músicas se destacaram como Comitiva Esperança, de Sérgio Reis, Um Violeiro Toca, de Almir Satter, e Estrela Natureza, de Sá & Guarabira.




Fonte: TV Press

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