Projeto LetrAção muda a vida da comunidade mato-grossense
Sonhos para o futuro? “Sim, vou ser advogada. Com esta oportunidade não vou parar mais de estudar”, afirma. Ela conta que sua rotina mudou. “Hoje faço todo o serviço da casa, depois vou fazer a tarefa da escola e ainda reservo um tempo para ler”. Maria fez uma cobrança a Seduc, que para o ano que vem, tenha turmas da Educação de Jovens e Adultos (EJA). “Não quero mais parar de estudar, e só conseguirei realizar meu sonho se a Secretaria abrir turmas do EJA”, enfatizou ela.
Para o colega de classe de Maria, Sinfrônio Teixeira, 57 anos, o LetrAção é a chance de retomar o que deixou para trás há mais de 35 anos. “Perdi a pouca noção que tinha de escrever. Pela necessidade e vontade de aprender é que me inscrevi no projeto”, frisou.
Natural de Minas Gerais, Sinfrônio reside em Mato Grosso há 35 anos, é casado, pai de quatro filhos, sendo que a professora é uma de suas filhas. “É com grande alegria que estou aprendendo tudo e convivendo com outros colegas, a sensação é de uma vida nova”, relata.
Eurídes Nonato da Silva, 53 anos, solteiro, natural de Mato Grosso, também freqüenta o LetrAção. Mora com uma irmã e é aposentado por invalidez. Finalmente está realizando um sonho antigo, em que as circunstâncias da vida levaram-no a adiar por mais de 40 anos. Nem mesmo as sessões de hemodiálise, três vezes por semana, o afasta das aulas. “No dia de hemodiálise, venho fraco para a aula, mas não falto. É minha grande oportunidade de aprender a ler a Bíblia”, ressalta.
A vida dessas pessoas se parece com a de milhares de mato-grossenses que hoje freqüentam as aulas do LetrAção. O projeto tem como meta alfabetizar os 224.760 jovens e adultos analfabetos do Estado até 2006.
Graças a projetos como esse, e a força de vontade de professores como Marlene Teixeira
Pereira, de 27 anos, que a realidade de muitas pessoas no Estado está mudando. A professora que dá aula à noite, é agente de saúde durante o dia, e também cuida dos seus dois filhos. De segunda a sexta-feira, das 18h às 20h, ela atende 25 alunos com idade acima de 20 anos. “Me sinto altamente estimulada e feliz por participar desse projeto e poder ajudar essas pessoas”, cobrou.
CIDADANIA
Cerca de 11% da população de Mato Grosso, que não sabe ler ou escrever, tem em sua maioria 25 e 59 anos. Para mudar essa realidade, o governo do Estado lançou em novembro de 2003, por meio da Seduc, o projeto LetrAção, que visa a erradicar o analfabetismo até 2006.
A primeira etapa do LetrAção foi um sucesso. A Secretaria conseguiu cadastrar 36.339 mil não alfabetizadas e 1.718 alfabetizadores em 78 municípios que apresentaram a maior concentração de pessoas não alfabetizadas de acordo com o último censo populacional. As aulas serão ministradas durante cinco meses, com duas horas por dia e 10 horas por semana. O professor do LetrAção ganha R$ 15 reais por aluno em sala de aula freqüente.
Para que o projeto saísse do papel e chegasse até os bancos escolares, a Seduc propiciou a formação dos técnicos dos Centros de Formação dos Profissionais (Cefapros), assessores pedagógicos e técnicos da Secretaria e do Conselho Estadual de Educação (CEE), por meio de um convênio com as Universidades Federal de Mato Grosso (UFMT); do Estado de Mato Grosso (Unemat); e de Cuiabá (UNIC); juntamente com a equipe do EJA.
No mês de setembro, esses formadores capacitaram 429 professores de Cuiabá e baixada cuiabana. Na segunda etapa, que ocorreu em outubro, 930 alfabetizadores do restante do Estado foram capacitados. As aulas começaram no dia 18 de outubro.
Para os professores participantes, a capacitação é o passo inicial para um Estado que possui muitas pessoas que não alfabetizadas. “Erradicar o analfabetismo é uma ansiedade de qualquer educador e nós estamos aqui para dar a muitos jovens e adultos o direito de exercer sua cidadania”, comentou a professora alfabetizadora, Maria Auxiliadora da Silva Garção, de Várzea Grande.
A superintendente-adjunta de Ensino e Currículo da Seduc, Evanildes Bordalho, afirmou que a meta de cadastramento de não alfabetizados e professores, da primeira etapa, foi alcançada. Ela adiantou que o MEC abriu o cadastramento para novos alfabetizadores e alfabetizandos em todo o Estado.
Para se cadastrar no Letração, a pessoa deve ter mais de 15 anos e morar em um dos municípios contemplados. Podem se cadastrar como professores-alfabetizadores profissionais que tenham no mínimo o Magistério, e não tenham vínculo empregatício com a rede pública de ensino. A inscrição deve ser feita nas Assessorias Pedagógicas ou nas Secretarias Municipais de Educação (SMES).
A secretária de Estado de Educação, Ana Carla Muniz, mostrou-se satisfeita com a concretização do projeto. “É com grande alegria que o LetrAção está fazendo parte da vida dessas pessoas, que para exercer efetivamente sua cidadania precisam saber ler e escrever”, frisou ela.
Além de garantir o aprendizado, dessas pessoas, o grande desafio do professor é garantir a permanência do aluno até o final do curso. Já o próximo passo da Seduc é encaminhar os futuros alunos alfabetizados às escolas de Educação de Jovens e Adultos para continuarem seus estudos.
Portanto, a previsão é de que em março de 2005, a quantidade de alunos matriculados no Ensino Fundamental da EJA suba dos atuais 12.276 mil para, aproximadamente 30 mil. Ana Carla adianta que a Seduc, juntamente com os consultores já está trabalhando para atender esta demanda.
NÚMEROS
Atualmente, o país conta com 35 milhões de analfabetos funcionais (são aqueles que já passaram pelo sistema de ensino) jovens e adultos, e cerca de 16 milhões de analfabetos absolutos acima de 15 anos, representando 13,6% da população brasileira.
A meta do Plano Nacional da Educação (PNE) é oferecer a Educação de Jovens e Adultos de 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental para 50% da população de 15 anos ou mais que não possui esta escolarização, em cinco anos. Em dez anos, está prevista a oferta da EJA de 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental para todos aqueles que já concluíram a 4ª série. No Brasil, existem 30,6 milhões de pessoas de 15 anos ou mais, fora da escola, que têm menos que quatro anos de estudo.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), o Ensino Fundamental para a faixa etária de 7 a 14 anos é o único nível de ensino no qual haverá queda do número de estudantes. Dos atuais 31,5 milhões de alunos no setor público, o número tende a diminuir para 24,7 milhões, em 2011. A queda na matrícula, já verificada nos últimos anos, está acontecendo em função da melhoria do fluxo escolar, aliada à taxa de atendimento de 97%.
Segundo o INEP, o desafio para este tipo de ensino será melhorar a qualidade da educação. Também deverão ser asseguradas às escolas, de acordo com o PNE, padrões mínimos de funcionamento, a ampliação para nove anos do Ensino Fundamental e a ampliação da jornada escolar.
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