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Polícia Brasil
Domingo - 05 de Dezembro de 2004 às 06:44
Por: Alexandre Rodrigues

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Rio de Janeiro - A pedido do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, a Justiça arquivou o inquérito que apurava a morte de Luciano Custódio Sales, de 24 anos, e Charles Machado Silva, de 16, no Morro da Providência (zona norte do Rio), numa ação da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) da Polícia Civil do Rio. A promotora Dora Beatriz Wilson pediu o arquivamento após depoimento do padrasto de um deles e receber laudos de perícia. Ela ficou convencida de que os rapazes foram mortos num tiroteio, apesar de rendidos por dois agentes da Core minutos antes. Defensores dos direitos humanos criticaram a decisão.

Repórteres do jornal O Dia viajavam num helicóptero da unidade que foi atacado a tiros quando sobrevoava a favela no dia 27 de setembro. Em fotos, a equipe registrou quando os agentes, em terra, renderam os dois suspeitos de terem feito os disparos. Minutos depois, as imagens mostram os policiais descendo o morro com os corpos dos dois jovens. A suspeita de que foram executados depois de presos pelos policiais foi corroborada por uma testemunha que afirmou ter visto a cena. O episódio levou ao afastamento de cinco policiais e do comandante da Core, o delegado Gláucio Santos, que estava no helicóptero.

A promotora justificou seu pedido neste sábado, contando que o depoimento do padrasto de Charles, Francisco de Assis da Silva, foi decisivo. Ele contou, em depoimento na delegacia da Lapa, que o jovem estava envolvido no tráfico de drogas e teria disparado com um fuzil atirando contra o helicóptero. Ele disse que a testemunha que afirmou ter visto a execução é mulher de um traficante da favela e foi instruída a mentir.

Silva dá uma versão que confirma o que alegam os policiais: entre a foto em que aparecem rendidos e a que mostra os corpos, teria havido uma tentativa de resgate. "Quando eles estavam rendidos no chão, veio o resgate. Os policiais passaram a responder aos tiros dos comparsas e descuidaram dos dois. Eles entraram na casa da testemunha e pegaram os fuzis escondidos lá. No tiroteio com os policiais, foram mortos. As armas foram apreendidas com sangue deles, está nos autos", disse a promotora.

O laudo do Instituto de Criminalística Carlos Éboli que constata marcas de bala em sentidos opostos no local e resquícios de pólvora nas mãos de um deles ajudaram a promotora a concluir que os policiais agiram em legítima defesa. "Eles não negaram que atiraram e repetiram essa versão sem vacilar. Essa história acabou. Não posso acreditar em execução sem o mínimo de provas", disse.

Resgate

Segundo a promotora, o padrasto de Charles disse que é comum um dos chefes do tráfico local, conhecido como Sapinho, oferecer altas quantias em dinheiro por resgates de suspeitos detidos por policiais na comunidade. Dora recorreu ainda ao depoimento de um preso da Providência na Polinter que revela o mesmo esquema. O preso chegou a dizer que, no caso da Core, a tentativa não deu certo porque os policiais reagiram. A promotora lembrou que a perícia encontrou resquícios de sangue na parede oposta àquela em frente à qual os rapazes aparecem rendidos em uma das fotos.

A decisão de arquivar o inquérito foi tomada pelo juiz Sidney Rosa da Silva, do 3º Tribunal do Júri, na última quinta-feira.

Protesto

"Acompanhei esse caso desde o início, e todos os indícios apontam para execução. É uma decisão absurda, fiquei estarrecido quando soube", reagiu o deputado estadual Alessandro Molon (PT), membro da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio. Já para o delegado Gláucio Santos "ficou comprovado que de execução só ficou a manchete do jornal".

Ocupando o cargo de delegado-adjunto da delegacia da Tijuca (zona norte), ele afirmou que sempre confiou na versão dos policiais afastados. "Sei que eles disseram a verdade. Fui exonerado pelos jornais, que não quiseram me ouvir. Quem perdeu foi o Rio, que teve cinco policiais de elite afastados e totalmente desmotivados. Nossa equipe já tinha feito mais de 80 prisões este ano".

O sociólogo Marcelo Freixo, coordenador da ONG Justiça Global, levantou suspeitas sobre a independência do Ministério Público. "Isso entristece quem luta por Justiça. Essa promotora cometeu um desserviço. Não é esse o MP que queremos. Lamentavelmente o Estado continua impune, acobertado por essa Justiça que não tem nada de independente". Freixo lembrou que o caso foi relatado à Organização das Nações Unidas e fez parte do anexo do relatório sobre violência policial entregue há poucos meses à Organização dos Estados Americanos (OEA), que tinha uma das fotos na capa.

A defensora pública Carla do Amaral, que defende a família dos mortos, contou que até hoje espera cópia do inquérito com as provas técnicas, às quais não teve acesso, e declarou não ter sido informada do arquivamento. "O que temos são as fotos, que deixam claro que a morte foi provocada pelos agentes do Estado", afirmou, sustentando que não vai paralisar a ação cível que pede o ressarcimento financeiro das famílias das vítimas.




Fonte: Agência Estado

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