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Nacional
Terça - 26 de Outubro de 2004 às 15:31

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“Aquelas fotos nos indignam, mas para nós aquilo não era surpresa. Era prática cotidiana do regime militar. Então, quando a gente viu aquelas fotos que disseram que era do Vladimir Herzog, não nos surpreendeu. Agora, não interessa se é de Vladimir, se é de A, B ou C, nos interessa que uma pessoa tenha sido submetida à humilhação e isto tem que ser denunciado”. A afirmação é da vice-presidente da organização não governamental Tortura Nunca Mais, Cecília Coimbra.

Em entrevista à rádio Nacional AM, Cecília criticou as declarações do Secretário Nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, que em nota oficial afirmou que as fotos divulgadas pela imprensa na semana passada não eram do jornalista Vladimir Herzog, que foi preso e assassinado durante a ditadura militar.

“Para nós, é espantoso que o Secretário Nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, um ex-preso político, diga em nota oficial que a foto não é do Herzog e fique tudo por isso mesmo. Tratar com naturalidade não só uma ilegalidade, mas uma violação do direito humano. Isso para nós é uma coisa que espanta muito. Ficamos bastante impressionados com a declaração do secretário”.

O grupo Tortura Nunca Mais decidiu lançar uma campanha nacional exigindo a abertura dos arquivos da repressão. A campanha também vai pedir a anulação do decreto aprovado ao final do governo Fernando Henrique determinando que documentos classificados como ultra-secretos devem permanecer em sigilo por 50 anos, e o prazo pode ser renovado por tempo indeterminado.

Nacional AM - No caso Vladimir Herzog, onde se discute se a foto é ou não é dele, isso é o de menos diante dessa questão?

Cecilia - Lógico. Veja bem, para nós, que passamos pelo período da ditadura - eu estive presa no Rio de Janeiro - aquelas fotos nos indignam e não há como não ficar indignado diante daquilo. Mas, para nós, aquilo não era surpresa, era prática cotidiana do regime militar. Era realmente uma humilhação ficar totalmente indefeso e sob o domínio do torturador.

Então, quando a gente viu aquelas fotos que disseram que era do Vladimir Herzog, não nos surpreendeu. Nos indignamos, mas não nos surpreendemos porque aquilo era prática comum. Agora, não interessa se é de Vladimir, se é de A, B ou C, nos interessa que uma pessoa foi submetida a tratamento vil, foi submetida à humilhação e isto tem que ser denunciado.

Para nós é espantoso que o Secretário Nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, um ex-preso político, diga em nota oficial que a foto não é do Herzog, mas sim de uma outra pessoa qualquer e que foi feita em uma operação ilegal e fique tudo por isso mesmo. Quer dizer, tratar com naturalidade não só uma ilegalidade, mas uma violação do direito humano. Isso para nós é uma coisa que nos espanta muito e nós ficamos bastante impressionados com a declaração do secretário.

Nacional AM - Daqui para frente, o que o movimento Tortura Nunca Mais espera desta questão? Abrir ou não abrir os arquivos do regime militar?

Cecilia - Nós esperamos que estes arquivos sejam abertos. E que sejam abertos sem uma proposta, que já está sendo veiculada pelas autoridades federais, que nos lembra muito a abertura do General Geisel: uma abertura lenta, gradual e segura.

Acho que nós não precisamos mais disso. Precisamos que a sociedade efetivamente conheça esses documentos, conheça parte da sua história. A gente precisa resgatar este período da história sem medos. Em nenhum momento nós queremos revanchismos, mas apenas queremos queremos que a verdade apareça. Queremos que os familiares dos mortos e desaparecidos possam enterrar definitivamente seus entes queridos. Os argumentos de que isso é revanchismo, que é remoer velhas feridas, são argumentos da ditadura. São argumentos de pessoas saudosistas daquele período. O que nós queremos é conhecer a nossa história para que possamos construir uma democracia neste país.

Nós estamos, então, pedindo que qualquer pessoa interessada em resgatar esta história reivindique isso diante das autoridades, mandando mensagens dizendo que é fundamental para o povo brasileiro conhecer um pouquinho do que aconteceu em um passado recente - tão recente que isso não é passado, é ainda presente. Isso está no cotidiano da gente, nas violações dos direitos humanos e na impunidade com que as pessoas são tratadas. Então, eu acho que resgatar aquele período da nossa história é estar atento ao que está acontecendo hoje no presente.




Fonte: Agência Brasil

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