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Esportes
Sexta - 18 de Junho de 2004 às 08:57
Por: Marcela Mourão

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"É uma frustração. A minha atleta está na Olimpíada, mas eu estou aqui, vendo pela TV". A declaração é de Adriana Rita Alves, técnica da ginasta Daiane dos Santos no Grêmio Náutico União (GNU) de Porto Alegre. Em entrevista ao Terra, ela disse que não conseguirá entrar no ginásio onde serão realizadas as competições de ginástica olímpica na Grécia.

"Eu não consegui credencial com a Confederação porque são apenas duas, para o Oleg e para a Irina, e eu não tenho ingresso. O clube (GNU) me dá passagem e estadia, mas eu não consigo entrar no ginásio. Na Olimpíada de Sydney, a Dai foi de reserva, então morri na porta; essa, ela é uma das maiores celebridades do país e eu não consigo entrar. A Dai foi feita aqui por nós, ela continua vinculada, é atleta do União, mas quando chega no topo eu não tenho como acompanhar, então é preocupante e lastimável".

É preocupante porque, de acordo com Adriana, é importante que os técnicos brasileiros sejam lembrados, mesmo que hoje os responsáveis pelo sucesso das atletas da Seleção sejam o casal ucraniano Oleg Ostapenko e Irina Iryashenko. "Hoje, a Seleção é composta de treinadores estrangeiros, só que vai chegar uma hora em que eles vão embora, e somos nós quem tem que fazer essa base. Por isso, precisamos de um apoio da Confederação, de uma estratégia para que nós tenhamos o suporte técnico desses que são considerados os melhores do mundo, para quando tivermos que voltar a assumir a posição de treinadores principais, tenhamos conhecimento para fazer isso".

Mesmo não sendo da equipe técnica da Seleção Brasileira, Adriana costuma ser presença constante ao lado de Daiane durante suas apresentações em competições nacionais e internacionais e a própria ginasta já ressaltou a importância disso em diversas entrevistas. A relação que as duas criaram após quase dez anos de treinamento é de confiança, de acordo com a técnica gaúcha. "Eu considero a Daiane a minha filha, mesmo não tendo idade para isso. Então, às vezes, só no olhar, ela já sabe o que eu gostei, o que eu não gostei. É muito comum ela entrar para fazer uma série e, se eu estou perto, ela só me olha. É uma questão de convívio de muitos anos".

Não é só com Daiane que isso acontece. A relação dos técnicos com os atletas de ginástica é como a de uma família. "A rotina de uma atleta criança hoje, aqui do clube, é: ela entra para o treino da manhã, das 8h30 ao meio-dia, almoça aqui, vai para escola com o transporte do clube - a escola particular é conveniada com o clube e elas não pagam nada. Após a aula, o transporte traz ela da escola de volta ao clube para o segundo turno até as 20h. Depois, o transporte leva ela para casa. Então o vínculo que elas criam conosco é muito grande".

Um talento descoberto aos 12 anos

Adriana foi apresentada para Daiane por uma professora de ginástica da escola estadual onde a menina de 12 anos estudava. No entanto, à primeira vista, a técnica não acreditou que aquela "mocinha, meio gordinha" pudesse ter futuro. ""Mas olha ela saltando", me disse essa professora cuja filha já era aluna minha. E, realmente, impressionou. Aí o Kiko, o outro treinador dela, e eu a convidamos para vir. Ela ficou em um período de experiência, no qual ela vinha, faltava, vinha, faltava. Ela não tinha uma condição financeira muito boa, não era pobre, pobre; ela vivia bem, mas sem muito. Então começamos a investir nela e, em dois anos, já era da Seleção Brasileira Juvenil e seguiu direto na Seleção Brasileira".

Mas falando assim, parece que foi simples. Adriana conta, porém, que a "gauchinha de ouro", como é conhecida, passou por um período de provação. "Ela enfrentou um pouco de preconceito e um pouco de inveja de outras atletas, porque ela apareceu do nada e um pouco tarde. Também teve muito aquele papo de "ah, mas negro fazendo ginástica", tem muito negro fazendo ginástica sim, no mundo inteiro. Mas isso foi só por um período. Hoje já não ocorre mais".

Adriana disse que Daiane provou que tinha potencial ao se alimentar de uma "raiva positiva", como ela coloca: "ela sofreu preconceitos por treinadores que no Brasil eram tidos como experientes, russos, inclusive, que diziam que ela não iria dar em nada. Me diziam "ela nunca vai ser campeã mundial" e, na época, nem nós imaginávamos em campeã mundial mesmo, mas sabíamos que potência ela tinha. Tinha um que dizia, "a minha atleta vai fazer elemento X antes da Daiane", então foi criando uma disputa, menosprezando a capacidade dela e nós fomos fazer o outro lado, usamos isso, de que não ia dar certo, porque começou tarde, não tem base, não tem técnica, para mostrar que dava".

Daiane começou a treinar em 1995, aos 12 anos, e em 1997 já tinha vencido o sul-americano juvenil no solo, sua especialidade na ginástica olímpica. Nessa época, o Brasil já estava vendo brilhar Daniele Hypólito, que é uma das maiores ginastas do país e também esperança de medalhas, principalmente, na trave. Adriana diz que o "boom" de Daiane foi durante o Pan-americano de Winnipeg, no Canadá.

"Quando chegou em 1999, a Dani foi favorita a seis medalhas de ouro e a Daiane foi sem nenhuma pretensão. No fim, por uma pressão, ou seja lá por quais problemas, a Dani não conseguiu, o que é normal na carreira de grandes atletas, e a Dai, que foi de sangue doce, acabou com duas medalhas. E aí, claro, uma negra, de família carente, carismática, encantando pela espontaneidade e naturalidade, vibrando, cativou o público e foi adotada pela mídia. A partir daí ela teve uma carreira de sucesso. As perdas e as derrotas foram pequenas".

Daiane sob a visão da Adriana

"Ela é uma ginasta que, além de treinar muito, tem um sucesso grande. Às vezes ela nem está tão bem emocionalmente, mas chega na hora e consegue fazer bem as provas".

"Ela é a única ginasta que passou pela nossa mão que eu nunca ouvi falar que queria desistir, nem teve algum tipo de pensamento "eu não vou conseguir". Eu nunca ouvi a Daiane dizer isso. Não é da característica dela. Se teve, ela escondeu muito bem, porque nunca demonstrou e nem se refletiu nos exercícios".




Fonte: Terra

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