Entidades pressionam, mas governo não vai ceder sobre Lei de Segurança Nacional
As recentes utilizações da Lei de Segurança Nacional para punir manifestantes, no campo e na cidade, têm preocupado defensores de Direitos Humanos no Brasil que pressionam o governo para que a lei, símbolo da Ditadura Militar, seja revisada ou mesmo suprimida. O caso chegou a ser apresentado na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA) há duas semanas, em Washington.
Além dos episódios relatados na audiência sobre o enquadramento de populações indígenas envolvidas com a questão fundiária, a preocupação se estende para o uso da Lei 7.170 sancionada em 14 de dezembro 1983, para reprimir manifestações, inclusive durante a Copa do Mundo, a exemplo do que ocorreu em São Paulo, no ano passado, quando um casal foi preso sob essa alegação.
A reclamação partiu de entidades como a Justiça Global, Justiça nos Trilhos, Associação Interamericana para a Defesa do Meio Ambiente (AIDA), International Rivers, Terra de Direitos e Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos.
Da parte do governo, a ordem é não tratar a questão. Diante da pressão, o assunto chegou a ser tratado numa conversa entre o ministro da Secretaria-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. A conclusão, no entanto, é de que a iniciativa de rever a lei não partirá do governo.
“Os atuais mandatários parecem não ter interesse em rever uma lei, que embora tenha sido cunhada em um período ditatorial, pode ser usada, oportunamente para conter manifestações contra o Estado”, criticou o presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Wadih Damous.
Damous também preside a Comissão da Verdade da OAB do Rio de Janeiro disse que nem se lembrava de que a Lei de Segurança Nacional estava em vigor. “Quando houve a prisão do casal em São Paulo, um jornalista me questionou sobre o assunto e eu passei até certo vexame”, declarou.
Para enquadrar o casal, a polícia se valeu do artigo 15 da lei que prevê prisão de três a dez anos a quem "praticar sabotagem contra instalações militares, meios de comunicações, estaleiros, portos, aeroportos". Para este tipo de crime a lei não estabelece fiança.
Damous acredita que o caminho mais viável será uma contestação da lei no Supremo Tribunal Federal (STF). “Em confronto com a Constituição Federal de 1988 a Lei de Segurança Nacional não se sustenta”, avaliou. “Estamos tentando convencer o Conselho da OAB Nacional a arguir a constitucionalidade da Lei de Segurança Nacional no Supremo”, informou.
“É uma lei repressiva que não tem nenhuma utilidade para proteger o território brasleito, por exemplo. O único objetivo é a proteção do Estado, sempre na ótica do inimigo interno, ou seja a sociedade”, criticou.
Já o jurista Dalmo Dallari sugere que o Congresso se debruce sobre a Lei de Segurança Nacional para revisar pontos conflitantes com a Constituição Federal. “Essa competência é do Congresso. Seria muito útil para a sociedade que o Congresso criasse uma comissão especial, da mesma forma que fez com o Código Civil e com o Código Penal, com o objetivo de fazer emendas ou mesmo de suprimir artigos”, disse o constitucionalista.
“É claro que ela tem dispositivos que não estão em consonância com a Constituição Federal e por isso ela deve ser revisada”, defendeu.
Dallari explicou que há muito tempo a lei não vinha sendo utilizada no Brasil e por isso não chamava a atenção da sociedade. “Após a redemocratização, essa lei realmente parou de ser aplicada. Em parte porque juristas não a consideravam válida por ser do período ditatorial. Já os que sabiam da sua validade ficavam constrangidos de utilizar um direito da ditadura”, lembrou.
“O fato de ter sido feita na época da ditadura não tira o caráter jurídico da lei, portanto, ela está em vigor. Não tem porque não aplica-la. Por isso é importante sua revisão”, defendeu.
Com o objetivo de discutir o assunto no Congresso, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) disse que encomendou um estudo sobre a lei para avaliar a possibilidade de reforma-la ou eliminá-la. “O objetivo é eliminar do texto todo artigo que tenha como princípio a ideia do inimigo interno ou que tenha como essência a defesa do estado contra o cidadão”, disse a deputada.
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