'Não houve intenção de enganar ninguém', diz ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró foi à Câmara esclarecer compra de refinaria nos EUA. Ele é o autor do relatório classificado de 'falho' pela presidente Dilma.
O ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró afirmou nesta quarta-feira (16), em audiência na Câmara dos Deputados, que não teve a "intenção de enganar" o Conselho de Administração da estatal ao apresentar, em 2006, um resumo que não mencionava cláusulas consideradas lesivas sobre a compra da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA).
Segundo o ex-dirigente da petroleira, a decisão de adquirir a refinaria norte-americana foi compartilhada com os conselheiros da Petrobras.
Não houve nenhuma intenção de enganar ninguém, não há nenhum sentido de enganar ninguém. A posição [de comprar a refinaria de Pasadena] não é uma posição só minha, é da diretoria e do conselho [da Petrobras] que aprovou este projeto."
Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobras
"Eu apresentei um trabalho que foi desenvolvido durante mais de um ano. Não houve nenhuma intenção de enganar ninguém, não há nenhum sentido de enganar ninguém. A posição [de comprar a refinaria de Pasadena] não é uma posição só minha, é da diretoria e do conselho [da Petrobras] que aprovou este projeto. Não existem decisões individuais nem na Diretoria nem no Conselho. Foi tudo baseado numa série de consultorias por mais de um ano", disse Cerveró ao ser indagado pelo deputado Vanderlei Makris (PSDB-SP) sobre se considerava ter enganado a presidente Dilma Rousseff.
Em março, a Presidência da República divulgou nota oficial na qual afirmava que a compra da refinaria foi realizada com base em documento "técnica e juridicamente falho" porque, segundo ela, omitia duas cláusulas que, "se conhecidas, seguramente não seriam aprovadas pelo Conselho". Trata-se das cláusulas Marlim e Put Option, presentes no contrato assinado posteriormente.
A primeira cláusula exigia um lucro mínimo anual à empresa belga Astra Oil, sócia da Petrobras na refinaria, independentemente do mercado. A segunda obrigava uma das sócias a comprar a parte da outra em caso de litígio. Foi essa regra que obrigou a Petrobras a desembolsar US$ 1,25 bilhão pela refinaria.
Na audiência, porém, Cerveró minimizou a importância dessas regras para a compra, que, segundo ele, era considerado um bom negócio.
Essas cláusulas [Put Option e Marlim], na avaliação que fizemos, não têm essa representatividade no negócio [...] Não é importante do ponto de vista negocial, do ponto de vista da negociação, nem uma cláusula nem outra"
"Essas cláusulas [Put Option e Marlim], na avaliação que fizemos, não têm essa representatividade no negócio. A apresentação que foi feita buscava destacar os principais aspectos do negócio e não é importante do ponto de vista negocial, do ponto de vista da negociação, nem uma cláusula nem outra", ponderou o ex-dirigente da Petrobras ao tentar esclarecer os motivos de não ter detalhado no resumo entregue aos conselheiros o teor das duas cláusulas polêmicas.
Nesta terça (15), em audiência no Senado, a presidente da Petrobras, Graça Foster, disse que Cerveró era o responsável por informar o Conselho de Administração sobre as cláusulas Put Option e Marlim. “Quem tem obrigação de levá-las é sim o diretor da área internacional”, enfatizou.
Cerveró evitou dizer se o Conselho de Administração teve de fato conhecimento das cláusulas antes de aprovar a transação. Segundo o ex-diretor, porém, todos os contratos, depois de passarem pela diretoria, são encaminhados ao conselho.
Ele contou que o resumo apresentado durante reunião do conselho tinha uma página e meia. Já a íntegra do contrato – onde constavam as cláusulas –, mais de 400.
"Estamos falando de um resumo executivo de uma página e meia. São apenas os pontos principais da negociação. Só o contrato tem 400 paginas. Eu não posso afirmar pelos outros. O contrato é encaminhado ao conselho. Isso é uma sequência", afirmou Cerveró, que não precisou quanto tempo os conselheiros tiveram para analisar o contrato.
No início do mês, a Presidência da República informou que Dilma, como integrante do conselho, não recebeu cópia do contrato de Pasadena.
"Essa questão de tempo hábil é relativa. É uma coleção enorme de documentos que são colocados a disposição. Depois de aprovado pela diretoria, tudo é encaminhado. O prazo que chegou as mãos do conselho eu não sei", disse Cerveró.
'Projeto malfadado'
A audiência com Cerveró teve início por volta das 11h30 e terminou às 16h30. No início da sessão, o ex-diretor da estatal fez uma exposição aos parlamentares sobre suas atividades na área internacional da companhia.
Ele deixou o comando da diretoria em 2008, após a Astra Oil ter ido à Justiça reivindicar que a empresa brasileira comprasse sua parte na usina.
Segundo Dilma, foi somente neste momento que o Conselho de Administração tomou conhecimento sobre as cláusulas Put Option e Marlim, que haviam sido omitidas dois anos antes pela direção da estatal, no momento em que foi aprovada a compra de metade da refinaria.
Não é um projeto malfadado, não é justo. Eu admitiria que houve equívocos e que não foi o melhor projeto do mundo, realmente não foi. Não é justo classificar essa operação como malfadada e como causadora de prejuízo à Petrobras"
Na tentativa de justificar o negócio, Cerveró disse aos deputados que, à época em que a transação foi concluída, fazia parte da estratégia da empresa adquirir refinarias nos mercado norte-americano. Ele negou que a operação possa ser classificada como "malfadada".
"Não é um projeto malfadado, não é justo. Eu admitiria que houve equívocos e que não foi o melhor projeto do mundo, realmente não foi. Não é justo classificar essa operação como malfadada e como causadora de prejuízo à Petrobras", alegou o ex-dirigente.
Na terça (15), durante a audiência no Senado, Graça Foster também ressaltou que a aquisição da refinaria de Pasadena "não foi um bom negócio" para a estatal do petróleo. No total, disse a dirigente da companhia, a refinaria dos Estados Unidos custou US$ 1,25 bilhão e resultou num prejuízo à Petrobras de US$ 530 milhões.
A avaliação de Graça Foster contraria a do ex-presidente da empresa Sérgio Gabrielli, que, no último dia 8, em reunião com deputados do PT, classificou a aquisição como "bom negócio". A opinião da dirigente, contudo, coincide com as explicações dadas pela presidente da República para justificar o fato de ter aprovado a compra da refinaria em 2006, quando presidia o Conselho de Administração da Petrobras.
Na visão de Cerveró, quando Graça Foster afirma que a operação não foi um "bom negócio", ela se refere ao fato de que "não foi um negócio projetado".
"Olhando no ponto de vista atual, evidentemente, que não foi [um bom negócio]. Mas isso não é uma consequência do projeto em si. É uma consequência das mudanças que ocorreram no mercado. A situação de mercado manda. É um projeto que não pôde ser concluído", defendeu Cerveró.
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