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Terça - 22 de Julho de 2014 às 20:14

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André Naddeo / Terra
Ativista dentro do consulado uruguaio no Rio de Janeiro
Ativista dentro do consulado uruguaio no Rio de Janeiro

Olheiras profundas, uma mochila de médio porte com algumas roupas e o medo de voltar para a prisão a qualquer momento. O discurso ferrenho-ativista das manifestações desde junho do ano passado deu lugar ao medo e nervosismo na vida da advogada Eloísa Samy, uma das 23 pessoas indiciadas no inquérito da Polícia Civil do Rio de Janeiro e uma das 18 consideradas, hoje, foragidas.

A medida de procurar o Consulado Geral do Uruguai numa tentativa frustrada de pedir asilo político, na última segunda-feira, reflete o estado de espírito de alguém que se diz abandonada pelos amigos de longa data e que hoje, sem vínculo efetivo com nenhum coletivo de advogados, está sem dinheiro e ainda sofre com o preconceito de ver o seu nome envolvido em formação de quadrilha. “Eu estou pedindo socorro mesmo”, disse ao Terra, num encontro pouco depois de chegar ao consulado uruguaio para tentar deixar o Brasil.

Após deixar o complexo penitenciário de Bangu, na semana passada, “onde éramos oito mulheres para três cobertores e se come a quentinha de arroz e feijão com as mãos ou com a tampa”, o habeas corpus que a liberou foi substituído por um pedido de prisão preventiva aceito pela Justiça após a denúncia formal do Ministério Público (MP-RJ).

“Resolvi passar em casa, pegar algumas roupas e sair para a rua, sem ter para onde ir”, relatou Eloísa, na companhia de Camila Nascimento e David Paixão, o jovem de 18 anos que sempre foi outra figura bastante presente nas manifestações de rua. É ele quem aparece nas gravações divulgadas pelo jornal O Globo dizendo para a namorada, a mesma Camila, que “colocamos o (batalhão de) Choque para correr”, após um dos atos violentos. Ele consta no processo como menor de idade por ter cometido os supostos atos ilícitos quando ainda tinha 17 anos.

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Os dois hoje são os fiéis escudeiros de Eloísa. David foi acolhido pela advogada após se tornarem próximos pelas participações nos atos – existe a história de que o jovem teria sido expulso de casa da família, após ser detido pela polícia por diversas oportunidades nos ato e acabou indo morar com a advogada, mas a reportagem não conseguiu contato com os familiares para confirmar a informação. Nem com o próprio David que, ainda mais assustado que a atual tutora, limitou-se a responder ao Terra: “não sei nem o que dizer, cara”. Eloísa não quis dar detalhes na ocasião.

Por mais que algumas pessoas tenham demonstrado solidariedade com a causa, como alguns advogados e, agora, a deputada estadual Janira Rocha (PSol-RJ), que deu uma carona para o grupo deixar o consulado até São Conrado, na zona sul, a verdade é que Eloísa se sente sozinha, e desamparada. Ao contrário da grande parte dos jovens envolvidos na denúncia, que contam com o apoio dos pais, a advogada não tem um porto seguro a recorrer.

Três ativistas pediram asilo político ao Consulado do Uruguai na capital fluminense na manhã desta segunda-feira.

“Até cheguei a procurar uma amiga minha antiga para ver se ela me acolhia, mas ela não aceitou. A única coisa que ela me deu foi R$ 300”, contou. Ela relatou ainda que a tal amiga se sentiu incomodada com a presença do trio em sua residência.

“A gente ainda deu o azar de na hora tentarem assaltar um carro perto do prédio onde ela mora, e ela nos perguntou: ‘não foram vocês que tentaram roubar aquele carro, não, né?’. Eu disse: ‘imagina, o que é isso’. E ela ainda perguntou se nós estávamos armados. Uma pessoa que me conhece há quase 20 anos”, lamentou.

A solução pensada foi tentar consolidar o que acredita ser um fato político. Ela nega qualquer tipo de envolvimento e se considera vítima “de uma tremenda arbitrariedade”. Mas na denúncia do MP-RJ, é tida como a pessoa que “determinava o momento em que a confusão tinha que começar”. A reportagem do Terra sempre encontrou Eloísa Samy nas manifestações de rua, muito embora não tenha tido nenhuma prova de que ela incitasse os jovens ao confronto.

Em junho do ano passado eclodiram os atos nas ruas de todo o Brasil. Foi nesta época que Eloísa Samy tornou-se membro do Instituto de Defesa dos Direitos Humanos (DDH), o grupo de advogados existente desde 2007 e que sempre auxiliou manifestantes detidos pela PM. O processo de isolamento atual começou justamente nos constantes atritos com o coletivo. Fontes consultadas pelo Terra apontaram que ela optava por agir sozinha, sem o aval do grupo de advogados.

Isso fez com que o DDH rechaçasse algumas ações dela. E a presença por conta própria, mas sempre em nome do instituto junto aos jornalistas, causava inúmeros transtornos e reavaliações sobre o seu trabalho. Em meados de abril desse ano, ela decidiu abandonar o instituto.

Pouco antes, em janeiro, no episódio da remoção favela Metrô-Mangueira, na zona norte do Rio de Janeiro, Eloísa não concordou com os rumos que o ato tomou e já havia discutido com Luisa Maranhão, outra advogada e ferrenha ativista. E as duas então pararam de se falar. Na ocasião em que tentou refúgio no consulado uruguaio, diversos manifestantes levaram cartazes em seu apoio, mas Eloísa sabe no íntimo que está isolada.

“Ela ficou muito focalizada também pelo fato de ter adotado um menor que era manifestante (e teve diversas passagens por delegacias nos atos). Por isso ficou ainda maior a repressão pelo papel de advogada que ela executava e por ter se tornada a responsável legal por esse adolescente, que hoje já é maior de idade”, contou Rodrigo Mondego, do CDA-RJ, o coletivo de advogados do Rio.

Lá do alto da sala do sexto andar do consulado, com as luzes apagadas, Eloísa Samy pensava nos próximos passos. Pouco antes, ela declarou que “inclusive temo pela minha vida. No dia que o David foi liberado e voltava para casa, um homem esbarrou com ele e disse: ‘eu sei onde você mora, sei quem você é, sua família, conheço a Eloísa eu vou te matar. Você vai para a vala’. Ele perguntou se essa pessoa era bandido, polícia, quem era, e ele disse que poderia ser até psicopata. E que se cruzasse no caminho dele de novo ele iria para a vala”, afirmou antes de completar, sempre muito nervosa.

“Eu preciso de proteção. Preciso dos organismos de direitos humanos, das pessoas que sabem realmente o que está se passando. Em defesa minha e de todos os manifestantes. São 18 foragidos e estão todos apavorados com essa arbitrariedade do Estado”, complementou.





Fonte: Terra

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