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Tecnologia
Quinta - 07 de Agosto de 2014 às 16:54

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A internet é uma grande experiência, e você é parte dela. Todos os dias, milhões de testes manipulam o que você vê quando navega online, para descobrir como manter sua atenção, te fazer você clicar em mais links - e gastar mais dinheiro. E essas experiências são muitas vezes secretas. Você provavelmente nunca vai saber que é parte delas.

Tudo isso se dá graças a algo agora bem conhecido na indústria de tecnologia, o chamado teste A/B. Isso significa que as páginas que você vê não são necessariamente as mesmas exibidas para outra pessoa - elas podem ter cores ligeiramente diferentes, títulos alternativos ou, no caso de redes sociais, você pode ver informações pessoais diferente sobre amigos e familiares.

O que começou como uma forma de ajustar o design dos sites está se tornando em algo cada vez mais controverso - nos casos mais polêmicos, os testes A/B podem ajudar as empresas a influenciar o humor das pessoas e até mesmo a vida amorosa.

Recentemente, verificou-se que o Facebook usou a técnica para testar em seus usuários, sem o conhecimento deles, uma maneira influenciar suas emoções. E , no mês passado, veio a revelação de que a rede social de namoro OkCupid mentiu para alguns de seus usuários sobre eles terem "combinado" romanticamente com outro membro do site. A empresa ligou parceiros "inadequados" para rastrear suas interações.

Mas em que momento todos estes experimentos se tornam pura e simples manipulação?

O fenômeno dos testes A/B começou como uma ideia relativamente benigna de melhorar os sites. Eles são amplamente usados para melhorar a chamada "Taxa de Conversão e Otimização" (CRO, na sigla em inglês), que é uma medida de avalia o quanto a página é capaz de engajar os usuários.

O que tornou a ferramenta tão poderosa, no entanto, é que ela fornece resultados que ninguém poderia prever.

'Chama-clique'
No início deste ano, por exemplo, um executivo do Google revelou que o uso de um tom diferente de azul para links de publicidade nas páginas de resultados de busca tem feito mais pessoas clicarem nos links, aumentando a receita da empresa em US$ 200 milhões (R$ 455 milhões).

O portal de viagens TripAdvisor também usou testes A/B e descobriu que certas cores atraem mais pessoas. Quando elas chegam a uma página vindas de um anúncio do TripAdvisor no Google, por exemplo, elas estão mais propensas a clicar em um botão azul. Os usuários que navegam dentro do próprio site, no entanto, preferem amarelo.

É como Stewart Ulm, diretor de engenharia do site de buscas de viagens Kayak, explica: às vezes você não sabe por que um resultado A/B funciona – só que ele funciona. "Tentamos chegar a teorias para explicar os resultados que obtemos, mas quando fazemos nossas experiências apenas com análise estatística pura nunca sabemos com certeza."

A maioria dos exemplos de testes A/B é relativamente inofensiva. No entanto, nos últimos meses, o uso da técnica tem gerado uma espécie de reação do público.

Para começar, os testes A/B começaram a afetar as notícias que você lê - e não necessariamente para melhor. As revistas eletrônicas Slate e Upworthy, por exemplo, muitas vezes testam até 25 manchetes usando programas criados especialmente para medir o melhor desempenho. Isto leva a manchetes como: "eles tiveram a idéia brilhante de dar câmeras para moradores de rua. Agora as câmeras estão viradas para nós."

Chamadas desse tipo podem receber uma enorme atenção online e serem amplamente compartilhadas, mas são chamadas de "enganosas" e "chama-clique", porque os artigos ou vídeos a que elas se relacionam muitas vezes podem ser uma decepção.

Agora que empresas como Facebook estão testando nossas emoções, e usando a dissimulação para ampliar o engajamento, muitos sentem que o teste A/B entrou em uma fase preocupante. Experimentos como o do OkCupid mostraram como simples testes A/B podem ter impacto direto na sua vida.

Além de encorajar encontros entre pessoas que não "combinavam", o OkCupid realizou recentemente outro teste em que alterou o assunto dos e-mails de notificação para uma parcela dos membros do site.

Falsa 'combinação'
Segundo o co-fundador do OkCupid, Christian Rudder, um grupo recebeu um e-mail com um título no seguinte formato: "você tem uma nova mensagem de [nome do remetente]", enquanto o outro grupo recebeu o mesmo e-mail com este título: "Nova mensagem de [nome do remetente]" e o símbolo de um envelope. A segunda mensagem teve um desempenho 4% melhor que a primeira. Em um site com mais de 30 milhões de usuários, 4% é significativo.

Imagine 4% em relação a um teste com um milhão de usuários. "São 40 mil cliques que nunca teriam acontecido", diz Rudder. "E naqueles 40 mil, talvez 10 mil pessoas comecem uma conversa que nunca teriam iniciado. E talvez 1 mil deles realmente acabem em um encontro - apenas por causa deste experimento aleatório."

À medida que a precisão destes testes se torna maior, há aqueles que se preocupam que a ética esteja sendo desprezada na busca por engajamento de curto prazo e lucro gigante.

Harry Brignull é um consultor de design que mantém um catálogo online de "padrões obscuros" - truques de design que, segundo ele, manipulam usuários de forma antiética a fazerem coisas que de outra forma não fariam. E esses truques variam de uma formulário de inscrição a termos de concordância em que os seus dados pessoais podem ser compartilhados com terceiros.

Muitos desses truques fazem com que formulários sejam elaborados de forma confusa nos procedimentos de cadastro e caixinhas que parecem inofensivas, mas que, marcadas, fazem com que você entregue sua privacidade em um clique. Como uma empresa sabe que esses métodos são realmente eficazes? Com testes A/B, claro.

"Se um designer diz que o projeto X dará muito dinheiro, mas que o projeto Y dará ainda mais, quando você olhar para eles pensando no dinheiro pode ser muito difícil não usar todos esses pequenos truques - especialmente quando seus concorrentes usam", explica Brignull.

Entusiastas de testes A/B, como Siroker, da Optimizely, insistem que, a longo prazo, as empresas só prejudicarão sua reputação e seu sucesso se agirem de forma antiética. Mas, como Brignull aponta, técnicas para enganar as pessoas para comprar as coisas existem há milênios, e muitos têm lucrado com elas através dos tempos.

De certo modo, já estivemos nessa situação antes: no século 20, cresceram os temores sobre efeitos manipuladores da publicidade, levando à regulamentação do setor. Talvez tal fiscalização chegue aos testes A/B no futuro.

Infelizmente, a linha entre um "padrão obscuro" e uma alteração de design que faz um site melhor para os usuários é tênue. Mas para Christian Rudder, do OkCupid, a acusação de que "mentiras" foram criadas para usuários desavisados não leva em consideração o fato de que as experiências do site são para um "bem maior".

"Estamos fazendo algo que apenas soma à felicidade no mundo", ele insiste. "Nós estamos fazendo com que solteiros encontrem um relacionamento, uma relação casual ou um casamento. Não há nenhuma desvantagem para qualquer pessoa envolvida."

Ainda assim, estamos nos tornando mais conscientes dos experimentos secretos da internet para descobrir o que nos faz clicar em algo. E eles vão continuar, quer queiramos ou não.





Fonte: Terra

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