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Internacional
Quinta - 15 de Janeiro de 2015 às 07:51

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REUTERS/Polícia de Paris/Divulgação via Reuters
Cherif Kouachi cometeu atentado
Cherif Kouachi cometeu atentado

A busca do paraíso. O casamento com virgens no céu. A redenção e os pecados perdoados por Deus, pelo combate aos infieis. Todos estes argumentos que permeiam a mente de um terrorista no momento de um atentado costumam ser atrelados a um ideal religioso e, às vezes, político.

Mas, segundo o psiquiatra Guido Arturo Palomba, especializado em analisar este tipo de comportamento, tal discurso acaba escondendo uma questão muito mais profunda.

Em entrevista ao R7, ele afirma que o motivo que leva uma pessoa a cometer um atentado, a se explodir com uma bomba em seu corpo, a sequestrar meninas e obrigá-las a se converter, ou qualquer aberração semelhante não tem como causa a ideologia, mas sim algum tipo de transtorno mental incurável.

Seja este indivíduo pertencente ao Boko Haram, ao Estado Islâmico, ou a qualquer outra entidade nesta linha. Referência na área de psiquiatria forense, Palomba, que atua desde 1975, afirma que não há influência externa capaz de convencer uma pessoa em estado normal a cometer um assassinato religioso, do tipo suicida ou não.

O mote que origina essas barbáries, segundo o médico, decorre de algum tipo de problema na mente. Na linguagem médica, na maioria das vezes, os autores são os chamados psicopatas.

Palomba observa que nem mesmo um ambiente regado por uma retórica radical, repetida por amigos ou parentes, é capaz de fazer uma pessoa dentro da normalidade ser levada a esta prática.

O especialista ressalta, porém, que tal anormalidade em geral é impulsionada pela situação de irrelevância social em que estes indivíduos se veem dentro das comunidades.

— Antes de aderirem a atos radicais, estas pessoas têm pouca expressão dentro da comunidade, não são bem posicionadas e são pouco realizadas na vida. Neste caso, o distúrbio mental se encaixa à situação deles e eles encontram nestes grupos radicais uma maneira de serem reconhecidos em seu mundo.

Mas do ponto de vista lógico, Palomba destaca que o Corão, base da crença islâmica e fonte para as justificativas das agressões mortíferas, em nenhuma de suas passagens prega a morte dos que são contra o islã.

— Os que cometem estes crimes são pessoas no mínimo com uma perturbação na saúde mental. Têm alguma debilidade psicológica, como uma psicopatia, por exemplo. Algum transtorno mental eles precisam ter para atender a um chamamento deste tipo ou aderir a uma causa como esta.

Ausência de valores éticos

A corrente contrária a esta tese argumenta que não dá para se detectar uma doença mental nestes indivíduos. Palomba, no entanto, não se refere especificamente a doença mental, mas a algum tipo de distúrbio, que se inclui no Código Penal Brasileiro, espelhado no de muitos países. No caso do psicopata, este indivíduo é desprovido de qualquer valor ético, moral, de culpa ou de remorso.

O psiquiatra explica que a psicopatia, que ele prefere chamar de condutopatia (doença na conduta), termo criado por ele próprio e incluído em seu Tratado de Psiquiatria Forense, o primeiro em Língua Portuguesa, não é uma doença ou uma loucura, como a psicose, que leva o indivíduo a fugir da realidade.

— A natureza não dá saltos: há o dia, a noite e a aurora. Na mente ocorre o mesmo. Entre a normalidade e a loucura, há a perturbação da saúde mental, onde se encontra o chamado psicopata, que não é louco porque ele enxerga a realidade. São questões de terminologia. Não é pelo fato de que este tipo de psicopatia não seja considerada loucura que deixa de ser perigosa.

No caso do atentado ao Charlie Hebdo, no último dia 7, em Paris, que causou a morte de 12 pessoas, a tranqulidade dos assassinos, os irmãos Chérif e Said Kouachi, filmados em fuga após o crime, demonstra esta frieza e arrependimento característicos deste tipo de caso.

Autor de mais de 13 mil laudos para a Justiça, nem todos de cunho criminal, Palomba argumenta que esses radicais já nasceram com esta anormalidade e não se restringem apenas ao mundo árabe. Como exemplo ele cita casos de brasileiros, americanos e franceses que já se integraram a estes grupos extremistas.

— São pessoas que acabam sendo captadas pelas lideranças em função desta perturbação. A causa é apenas uma porta de entrada para a qual eles são atraídos em função deste transtorno.

Casos incuráveis

Segundo o psiquiatra, não há como regenerar este tipo de pessoa. E nem dá para trabalhar nestes casos com a hipótese de que lavagem cerebral e busca da justiça religiosa, por exemplo, foram as causas dos atentados.

— Artigos que não atribuem a causa destes atos a um transtorno mental são levianos. Não atrelar a questões de psicopatologia [problemas psicológicos] não trará nenhuma explicação para esse fenômeno. Não há como ir contra o instinto primordial de preservação do ser humano sem haver uma anormalidade.

Ele descreve este tipo de atitude como algo fora de qualquer definição médica de normalidade psíquica.

— Uma pessoa em estado de raiva matar um desafeto, algum conhecido que ele considera que lhe fez um mal, é brutal e condenável social e moralmente. Mas tem lógica do ponto de vista psicológico, em muitos casos.

O médico vai mais além.

— Agora, como alguém entra em um lugar atirando, sem conhecer pessoalmente as vítimas, sem nenhum vínculo emocional com os atacados, que podem ser secretário, chefe ou quem for, sem que não haja nenhum tipo de distúrbio em sua mente? Como alguém chega a uma estação, onde há milhares de pessoas que ele nem conhece, que nunca lhe fizeram nada, e se explode, sem que tenha nenhuma perturbação?

Palomba também não confia em nenhuma estatística que diferencia cada tipo de caso dentro de uma população. Para ele, ainda não foi encontrado um método eficiente para levantar números a este respeito.

— Estatísticas deste tipo entre populações não existem. Felizmente estas pessoas são minoria, são dezenas de milhares em uma população de cerca de sete bilhões na Terra. Um psicopata também pode ser aquele cara que não se adapta em lugar nenhum, que não dá certo em trabalhos, por exemplo, e não oferece perigo a ninguém. Mesmo entre os chamados psicopatas, os criminosos são minoria.





Fonte: Do R7

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