PRODUÇÃO AUTOMOBILÍSTICA
Novo Duster não quer ser o renegado da turma SUV compacto da Renault ganha retoques no visual, mais conectividade e aposta nas versões de entrada para virar coadjuvante; versão 1.6 parte dos R$ 62.990
Ficou ruim para ele. Convenhamos que o Renault Duster já teve seus dias de glória e soube aproveitá-los. Valendo-se de bom espaço interno e robustez, o jipinho conseguiu emplacar mais de 150 mil exemplares no Brasil desde que foi lançado, em 2011.
Apenas no ano de 2014 foram vendidas 48.877 unidades, um número expressivo que o coloca como vice-líder da categoria pouco atrás do Ford EcoSport. Não é necessário fazer consulta à vidente, astrólogo ou pai de santo para saber que 2015 será bem mais difícil para ele, ou melhor, para eles.
Inimigo em dose tripla
A razão para um ano tão “desenganado” para o Duster tem nome, sobrenome, controle de tração e estabilidade, freio de estacionamento elétrico, ar condicionado digital... São eles: Honda HR-V, Jeep Renegade e o Peugeot 2008, cujo lançamento acontece na próxima semana. Três projetos novinhos em folha que estão desembarcando no mercado recheados de equipamentos, com preços competitivos e muita vontade de liderar o segmento.
Espaço interno e robustez não são mais suficientes para fisgar o cliente em meio a concorrentes tão interessantes. A estratégia da Renault foi retocar o visual interno e externo para que o SUV parecesse mais moderno, oferecer mais conectividade com a nova geração da central multimídia Media NAV Evolution e aperfeiçoar o acabamento.
A mecânica permanece a mesma, porém, os motores 1.6 e 2.0 foram retrabalhados para tornarem-se mais eficientes, tanto é que ambas motorizações quando acopladas ao câmbio manual receberam nota A na classificação do Inmetro, enquanto a 2.0 com câmbio automático de quatro marchas (isso mesmo, 4!) teve nota B.
Entrada para o mundo dos SUVs
Para driblar o mercado e continuar a ter participação no segmento, a Renault tem duas saídas: trabalhar com uma boa tabela de preços para as versões 1.6, especialmente na faixa abaixo dos R$ 70 mil, reforçando a imagem de SUV de entrada, e ganhar terreno na versão 4x4, já que é o modelo mais em conta do segmento a oferecer o sistema de tração. A versão "trilheira" é responsável por apenas 6% do mix de vendas do Duster.
Para esta nova fase, digamos, a configuração 1.6 Expression parte de R$ 62.990, R$ 500 a menos do que antes, enquanto a 1.6 Dynamique chega a custar R$ 1.000 a menos, R$ 67.990. Ambas são equipadas com câmbio manual de cinco marchas. As demais versões mantiveram os valores: R$ 72.990 para a 2.0 Dynamique com transmissão manual de seis velocidades, R$ 75.990 para a 1.6 Dynamique automática e R$ 78.490 para a Dynamique 2.0 manual 4x4.
A versão 1.6 “pé de boi”, que era vendida a R$ 59.600 saiu de linha. Segundo Bruno Hohmann, diretor de marketing da Renault do Brasil, as vendas eram inexpressivas e dependendo de como se comportar o mercado eles irão avaliar a chegada de mais configurações.
Vale investir no Duster?
Depende. Sem dúvida, ele melhorou, o que significa que se você tem um exemplar do SUV em casa e pretende trocar seu carro por um novo, irá ficar satisfeito. Contudo, para peitar a nova concorrência, só nascendo de novo.
Quanto ao visual, as mudanças foram sutis. Os para-choques dianteiro e traseiro com novo desenho, a barra no teto que agora leva o nome do carro, rodas novas e, especialmente, os novos faróis e lanternas traseiras com LED deram ao projeto da Dacia ares mais modernos, embora ele ainda não seja sinônimo de beleza. A grade também foi alterada e substituiu as barras cromadas por um filete preto evidenciando o losango da Renault.
O acabamento da cabine ainda deixa a desejar, mas agora conta com materiais melhores. No painel, uma moldura grosseira em Black Piano envolve as saídas de ar e a tela do sistema de entretenimento, chega a lembrar alguns modelos chineses que abusam do acabamento brilhante. Os bancos tem desenho bonito, mas o apoio de cabeça dos dianteiros não conversa com o encosto do assento, o que torna difícil encontrar uma posição ideal para guiar. O volante foi herdado dos novos Logan e Sandero e novos porta objetos foram boas sacadas nas portas, no painel e no console central.
O quadro de instrumentos agora possui iluminação branca com três mostradores: o conta-giros e o velocímetro, analógicos, e um mostrador digital, com indicador do nível de combustível e computador de bordo multifuncional. Ainda entre os equipamentos de séria, há também indicador de troca de marcha.
As inovações no campo da conectividade chegam apenas para a versão Dynamique. De série ela traz a central multimídia Media NAV Evolution, que agora possui acesso a mídias sociais e aplicativos como TripAdvisor, que indica hotéis e restaurantes na região, além de fornecer informações de trânsito em tempo real via ondas de rádio, funcionando mesmo em locais onde não haja acesso à internet móvel. Comando de voz está disponível apenas para os usuários de iPhone, através do próprio sistema SIRI do smartphone, que permite a busca de músicas e pessoas da lista de contatos, sem tirar as mãos do volante.
Encontre as diferenças
A Renault diz ter feito um trabalho forte para inibir o ruído na cabine, que certamente melhorou, assim como a vibração. No entanto, não se compara ao silêncio que encontramos a bordo do Jeep Renegade, mesmo na versão com motor a diesel.
Quanto ao espaço no porta-malas, O Duster sai na frente da concorrência. São 475 litros de capacidade. O único que consegue encostar nele é o Honda HR-V com 437 litros. O EcoSport comporta 362 litros e o Renegade míseros 260 litros.
Itens de conforto como câmera de ré e piloto automático estão disponíveis apenas como opcionais. Outros equipamentos importantes, como o ESP (controle de tração e estabilidade) nem sequer fazem parte do “cardápio”. Hohmann explica que foi cogitado pela montadora adicioná-lo, porém, o valor final do produto subiria muito e ele deixaria de ser atraente nas versões de entrada. O executivo não descarta futuras versões equipadas com o sistema.
Como anda?
No trecho mais longo do test-drive conduzimos a versão Dynamique 2.0 4x4 equipada com câmbio manual de seis marchas, cujo desempenho mostrou-se o mais satisfatório da gama. Embora os engates do câmbio não tenham muita precisão, ele dá um baile na preguiçosa transmissão automática que se esforça para trabalhar limitada em quatro marchas.
A parte boa é que o motor 2.0 está um pouquinho mais esperto graças a ajustes na taxa de compressão. Ele ganhou 6 cv e agora gera 148 cv a 5.750 rpm quando abastecido com etanol e 143 cv a 5.750 rpm quando abastecido com gasolina. Também houve ganho de 1 kgfm de torque em baixa rotação, passando para 18,8 kgfm a 2.250 rpm, quando abastecido com etanol.
A motorização 1.6 de 115 cv no etanol sofre para empurrar os quase 1.300 kg do SUV. Com quatro ocupantes mais bagagem, só com muita reza braba e paciência para subir uma ladeira. Esse propulsor também ganhou 1,0 kgfm de torque em baixa rotação, passando para 14,6 kgfm a 2.500 rpm, quando abastecido com etanol.
Já comentamos sobre o bom desempenho do Duster na tabela de consumo do Inmetro, mas se você quiser economizar ainda mais, a função EcoMode pode ajudar. Por meio de um botão escondido na parte inferior do painel, a função limita a potência e o torque do motor e reduz a potência do ar-condicionado, o que permite uma redução de 10% no consumo de combustível, segundo a Renault.
Ele quer entrar na lama
A marca nunca deu muita ênfase à versão 4x4 do Duster, mas agora parece que todos os holofotes estão voltados para sua capacidade off-road. A tração 4x4 definitivamente faz do jipinho uma opção interessante na faixa dos R$ 80 mil. Sua robustez foi posta à prova em trechos com subidas e descidas íngremes, pedras, areia e erosões. Embora ele seja o concorrente que mais se aproxima do Renegade no quesito "terra", não dá para compará-los. O Renegade 4x4 é oferecido apenas com motorização turbodiesel e câmbio de nove marchas, uma diferença de exatos R$ 21.490 na carteira e um abismo de distância em matéria de conteúdo.
Voltando ao nosso avaliado Duster, com ângulo de entrada de 30º, ângulo de saída de 34,5º e altura em relação ao solo de 21 cm ele também não fez feio na terra. Para a alegria do departamento de marketing da Renault, há vídeos na internet que comprovam sua valentia, com cenas onde ele “salva” uma Mitsubishi L200 e até um Porsche Macan. Tive que citá-los, pois, para minha decepção, nosso teste off-road foi realizado do banco do passageiro (Oi?).
Consegui sentir mais o carro em situações adversas em um trecho comum de estrada de terra. O conjunto de suspensão, que utiliza multilink na traseira para a versão 4x4 (as demais utilizam eixo semi-independente), absorveu bem a buraqueira do solo. Ele mostrou-se melhor na terra do que no asfalto, onde é notável o acentuado rolamento da carroceria em curvas.
Em suma, se você não tem pretensões de se aventurar por aí mas curte a atmosfera fora de estrada, a nova cor Marrom Safari pode ser uma boa pedida (e nem precisa sujar o carro!).
Prontos para a guerra
Como a Renault prevê, as versões que devem sentir mais a “rejeição” frente aos novos SUVs são as com motor 2.0, que custam entre R$ 72.990 e R$ 78.490. A montadora estima que as versões 1.6 sejam responsáveis por 75% das vendas, sendo 25% da Expression e 50% da Dynamique.
Como em um jogo de tabuleiro, os estreantes do segmento tem tudo para ditar as novas regras enquanto os veteranos (leia Duster e EcoSport) se adequam para não serem engolidos. Cada um recorre às armas que tem e, pelo menos para a Renault, a saída parece investir nas versões que estão abaixo dos R$ 70 mil, valor que é ponto de partida de alguns novatos da categoria.
Olivier Murguet, presidente da Renault do Brasil, também espera que boa parte dos clientes migre do segmento de sedãs. “Acreditamos que não perderemos participação de mercado, já que uma maior concorrência força o crescimento”, justificou. De qualquer forma, a salvação mesmo para o Duster é a nova geração do SUV, projeto no qual a Dacia, divisão romena da Renault responsável pelo projeto do carro, já vem trabalhando. Que fase, Duster!
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