Zoo do DF mantém felinos idosos confinados em recinto de concreto
Foto: (Foto: Santuário Rancho dos Gnomos/Reprodução)
Marcos e Sílvia Pompeu com tigre resgatado de zoológico em Brasília
Dois felinos idosos e doentes vivem confinados em recintos de concreto de 70 m², restritos ao público, no Zoológico de Brasília. O leão Dengo, que sofre de Aids felina, está há pelo menos quatro anos vivendo no espaço, que não tem grama ou acesso à luz do sol. A onça pintada Tuan tem problemas renais e foi transferida há dois meses para o local. Ativistas afirmam que os bichos vivem em condições “deploráveis” e que o zoológico se nega a transferir os bichos para um santuário.
Ao G1, o zoo afirmou que os animais são "patrimônio do Estado" e não podem ser transferidos. A instituição afirma que os bichos serão realocados para áreas maiores que ainda passarão por reformas. A instituição não deu prazo para a mudança.
O leão foi trazido ao DF em 2011 pelo Ibama, depois do fechamento do zoológico de Niterói (RJ) por denúncias de maus-tratos. Desde então, ele vive na área conhecida como "extra", que, segundo a instituição, funciona como um hospital. A onça nasceu no zoo há 20 anos e vivia na área de exposição. Depois, com problemas renais, foi transferida para o "extra".
Fundadora do Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos, em São Paulo, Sílvia Pompeu diz que viu de perto a situação “lamentável” em que os bichos vivem quando foi buscar o tigre Diego, há dois meses. O bicho, que estava com depressão, foi apreendido pelo Ibama de um circo em 2006 e passou anos vivendo no "hospital" do zoológico.
“Chegamos bem focados para pegar o tigre [para levar para o santuário]. Só que, ao lado do tigre tinha esse leão, e ao lado do leão, nas mesmas condições, uma onça”, diz Sílvia. “Eles estão muito apáticos. Mesmo com a movimentação diferente no lugar, com a nossa chegada, com tratores, caixas, cheiro novo, os dois continuavam do mesmo jeito. São mortos-vivos, nada chama a atenção deles. Chegamos às 13h, e, às 20h, a onça continuava do mesmo jeito que estava quando chegamos. Mal mexia o olho.”
Segundo ela, quando o expediente termina no zoo, os animais são abandonados na escuridão. “Quando saímos de lá, apaga tudo, fecha tudo, fica aquele breu, e aqueles animais lá no fundo, sozinhos”, diz. “É um estado de abandono tão grande. Eles estão praticamente mortos, mas não têm nem condições de se libertarem dessa situação.” Ela afirma que os bichos dormem sobre pedaços de madeira sem feno.
Sílvia afirma que foi informada por uma funcionária da direção do zoo que o leão vivia há mais de dez anos naquelas condições e que nenhuma instituição no país tinha interesse em receber os felinos. “Me informaram que os bichos não iriam voltar para visitação porque ninguém tinha interesse em recebê-los. E eu disse: ‘eu tenho’. Pediram para a gente mandar um e-mail depois do fim de semana para dar prosseguimento à transferência." De volta a São Paulo, ela disse iniciar os trâmites para a mudança.
“Foram dois meses de ligações constantes para o zoo. Tentamos falar com todo mundo que se dizia direção. Diziam que [o processo] estava no jurídico, pediam para ligar no dia seguinte", diz a ativista. "Dizem que [o bicho] é patrimônio do GDF, mas é uma coisa descabida, uma falta de compromisso, principalmente com os animais. Não sei por que insistem em manter esses dois animais moribundos lá no fundo. Não tem valor comercial, sentimento nenhum."
Em nota publicada nas redes sociais, a Secretaria de Meio Ambiente informou que o santuário não fez nenhum pedido formal para a transferência dos felinos e não apresentou projeto ou planejamento com informações quanto a espaço, estrutura e pessoal necessários para o bem-estar dos animais. A pasta também informou que os animais têm idade avançada e que os veterinários do espaço não recomendam o transporte dos bichos até Cotia (SP), já que "acarreta alto risco de óbito diante do quadro clínico".
“Eles estão doentes, velhos, podem morrer no caminho. Se morrerem, vai ser a morte mais iluminada do mundo, porque estão lá há dez anos. É parede, concreto para todo lado, cimentão”, diz a ativista.
Segundo a assessoria de imprensa do zoológico, “diante da problemática criada” pelo santuário, a direção considera “difícil” a transferência para o espaço. O zoológico afirma que tem ressalvas sobre a forma como mantenedores do rancho são constituídos e afirma que no local não há biólogos e veterinários, “o que compromete o bem-estar do animal”. Para o zoo, também é um problema o santuário viver de doações.
“A onça passou 18 anos da vida dela vendo gente sem parar e agora vai passar o resto da vida dela vendo parede. É dramático, lastimável” diz a ativista. “Somos supersimples no santuário, mas fazemos um trabalho supersério e vamos fazer de tudo para esses irmãos terem o melhor, mesmo que seja no último suspiro deles. Já tive animais aqui que morreram no meu colo, cercados de atenção, de amor, de alegria.” Segundo ela, uma onça vive em média 25 a 30 anos, e um leão, 30 anos.
Em janeiro, a Comissão de Direitos dos Animais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) fez uma vistoria no Jardim Zoológico de Brasília e encontrou diversas irregularidades na clínica usada para tratar os bichos. Entre os problemas apontados, remédios fora da data de validade, leite em pó empedrado e jaulas em más condições de higiene.
Santuário
Cerca de 200 animais vivem no santuário em Cotia, em especial grandes felinos que eram explorados em circos. Também vivem no espaço araras, veados, macacos e bichos preguiças. “Santuário é local que não reproduz animais , resgatamos os ‘fim de vida’, os caquinhos, é quase um asilo para eles. Trabalhamos com esse conceito, porém seguindo as regras de mantenedores. Temos uma equipe de ponta”, diz o marido de Sílvia, o também ativista Marcos Pompeu.
“Prestamos apoio aos órgãos oficiais, como a Polícia Militar Ambiental, o Ibama, a Polícia Civil, sempre no recebimento de animais apreendidos em crimes ambientais", diz. "Moramos aqui, fazemos atendimentos de madrugada. Entramos com tempo, nossa vida, nossa saúde. Estamos fazendo isso porque acreditamos na mudança das pessoas, para que enxerguem como exemplo."
Um abaixo-assinado foi iniciado na internet para pressionar o zoo a liberar a transferência dos bichos para o santuário para terem um resto de vida “digno”. No espaço, os bichos recebem tratamentos com mantras, reiki, música clássica, acupuntura e aromaterapia.
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