Pessoas com identificação são enterradas como indigentes em SP
Em 1990, no cemitério Dom Bosco, em Perus, zona norte de São Paulo, foi descoberta uma vala clandestina de desaparecidos políticos. Ainda hoje, o cemitério recebe a maioria dos corpos de pessoas não reconhecidas. A repórter Danielle Zampollo fez plantão por uma semana no local e acompanhou a chegada de 18 corpos de desconhecidos. Apenas cinco não tinham identificação, outros 13 estavam com nome e sobrenome, mas mesmo assim foram enterrados como indigentes. A quadra onde ficam os corpos dos desconhecidos tem apenas números. Quando há uma lápide no meio, é porque a família já foi reconhecer o corpo.
Para não ser enterrado como desconhecido, o corpo precisa ser identificado pela família em até 10 dias. Desde janeiro de 2014, o Ministério Público do Estado de São Paulo entra em contato com as famílias de pessoas que tinham nome e sobrenome e mesmo assim foram enterradas como desconhecidas. A promotora Eliana Vendramini pretende entrar com uma ação contra a Polícia Civil, o Serviço de Verificação de Óbito e o Instituto Médico Legal. Para ela, esses órgãos têm o dever de comunicar as famílias antes de esses corpos serem enterrados.
Desaparecido político
Mercês Castro há mais de 30 anos procura pelo corpo do irmão, morto na guerrilha do Araguaia. Antônio Teodoro de Castro era conhecido como o guerrilheiro Raul. Ele e mais 68 militantes do Partido Comunista do Brasil lutaram contra a ditadura militar na região do Araguaia; 59 deles ainda estão desaparecidos. Visitando a região e conversando com os moradores, ela descobriu como o irmão foi preso.
O repórter Victor Ferreira começou a reportagem sobre Mercês há três anos. Na época, acompanhou uma das inúmeras viagens que ela fez ao Araguaia em busca do irmão. Lá conheceu o mateiro Iomar Galego, que foi preso em 1963 pelos militares e obrigado a trabalhar para o Exército. A função dele era atirar nos guerrilheiros. O grupo de Iomar tentou matar Raul, mas ele teria escapado com vida. Dias depois, segundo documentos reunidos pela Secretaria de Direitos Humanos, Raul foi executado pelos militares depois de ser preso.
Em suas andanças, Mercês encontrou uma sobrinha, filha de Raul, a Lia. Exames de DNA comprovaram a paternidade e agora a família briga na justiça para que o Estado brasileiro reconheça que Lia foi sequestrada pelos militares durante a guerrilha.
Mercês não desistiu da missão de encontrar o irmão.
Ajuda voluntária
A governanta aposentada Lindalva Matos já encontrou mais de três mil desaparecidos. Há 12 anos, ela busca voluntariamente pessoas desaparecidas. Lindalva conta que já ajudou três mil famílias a encontrar parentes desaparecidos. Ela faz mistério, mas diz que faz suas buscas em páginas na internet e mantém contato com policiais que a ajudam com informações. Há dois meses ela foi procurada por Flavia dos Santos. A jovem e o irmão foram doados pela mãe e hoje vivem na Suíça. Lindalva conseguiu localizar a mãe brasileira e consegue aproximá-la dos filhos. A mãe, dona Olga, mora em Suzano, na Grande São Paulo. O repórter Guilherme Belarmino acompanha a primeira vez em que Olga e os filhos ficam frente a frente pelo computador.
O trabalho de Lindalva começou quando ela tentava localizar a própria filha, que doou por não ter condições de mantê-la. Ela a localizou há cerca de seis meses nas redes sociais, mas não quis procurá-la pessoalmente, por ela não saber que é adotada.
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