Desembargador dispara
“O TJ está dizendo que os juízes podem fraudar; é um deboche” Orlando Perri se irrita e diz que Pleno não tem disposição a investigar certos juízes
O desembargador Orlando Perri se irritou com uma decisão proferida pelo Pleno do Tribunal de Justiça de Mato Grosso e afirmou que existe certa “indisposição” do tribunal em abrir processos de investigação contra determinados juízes.
A crítica foi feita durante sessão ocorrida nesta quinta-feira (16). Na ocasião, o Pleno arquivou uma sindicância contra a juíza Flávia Catarina Amorim Reis, da Vara de Execução Fiscal de Cuiabá, por 14 votos a 11, em razão de prescrição.
A magistrada era suspeita de ter cometido diversas irregularidades, como manipular dados no sistema virtual de processos do tribunal, lançando processos de maneira indevida no sistema Apolo a fim de alterar seu relatório de produtividade, considerado “baixíssimo”.
Não vejo, aliás nunca vi disposição para se abrir sindicância contra determinados juízes
Em determinado momento do julgamento, Perri pediu para fazer um comentário, momento em que lançou críticas contra a postura do tribunal no que tange às investigações contra essa magistrada.
Perri ressaltou que Flávia Catarina já respondeu a várias outras sindicâncias por situações similares, sendo que todas foram arquivadas pelo tribunal.
“Não vejo, aliás nunca vi disposição para se abrir sindicância contra determinados juízes. Quando a última sindicância foi arquivada, saiu ela [Flávia Catarina] distribuindo beijos aos integrantes desta corte. Isso é um deboche”.
O desembargador relatou que havia provas concretas “mais do que necessárias” para abrir procedimento disciplinar contra juíza, entre elas as sentenças lançadas em branco durante o período em que a mesma pleiteava uma vaga de desembargadora.
“Há [na sindicância] a confissão dela de que fazia lançamentos equivocados. Isso quer dizer que a constatação da equipe de magistrados da corregedoria está errada? São eles que estão errados? A gestora da vara foi ouvida em audiência como testemunha e afirmou categoricamente que os lançamentos eram realizados a mando da juíza. A assessora da magistrada também confirmou”.
“Está comprovado que no dia seguinte a abertura de um edital para acesso ao tribunal, ela lançou sentenças sem conteúdo. Que mais o tribunal está precisando? Que provas maiores está a exigir? Em abertura de sindicância, basta existência de indícios”, disparou.
De acordo com Perri, este tipo de “vista grossa” vem se sucedendo ao longo dos anos e, com o novo arquivamento, o Pleno do TJ-MT está dando aval para os juízes mato-grossenses “trapacearem”.
O recado que este tribunal está dando é o de que os juízes de Mato Grosso podem fraudar os relatórios, podem trapacear os seus colegas
“O recado que este tribunal está dando é o de que os juízes de Mato Grosso podem fraudar os relatórios, podem trapacear os seus colegas. E, se pego no pulo do gato, basta que se conserte. É esta a mensagem que este tribunal está a passar aos juízes”, disse, batendo a mão na mesa.
“Carapuça”
Após a crítica, o desembargador José Zuquim disse que sentiu ofendido com a fala de Perri, uma vez que sempre agiu com independência e nunca passou “a mão na cabeça de ninguém”.
Perri então de desculpou com Zuquim, mas deixou claro que a crítica ainda cabia para alguns dos colegas.
“A verdade é que algumas pessoas deveriam se dar por suspeitas em alguns julgamentos. Não me referi a você Zuquim. Mas certamente tem colegas aqui que a carapuça serve como uma luva”.
A investigação
Na sindicância, consta que a correição da Corregedoria Geral de Justiça do TJ-MT identificou que Flávia Catarina Reis teria lançado processos de maneira indevida no sistema Apolo, a fim de alterar seu relatório de produtividade.
Foi constatado que processos eram duplicados, lançados “em branco” e algumas sentenças físicas divergiam das sentenças eletrônicas.
Além disso, o relatório constatou que o rendimento da magistrada, entre os anos de 2011 a 2013, foi considerado “baixíssimo”.
O desembargador Marcos Machado, o primeiro a votar por investigar a juíza, chegou a apontar má-fé da magistrada.
Marcos Machado transcreveu o raciocínio do desembargador Orlando Perri, que rebateu a afirmação de Flávia Catarina de que o sistema não oferece segurança.
Para Perri - e no entendimento de Machado - as anomalias constatadas só poderiam se originar de ação humana, e não por erro do sistema.
Ele afirmou que foi possível constatar que a juíza sabia utilizar o sistema por meio dos processos que foram registrados como concluídos.
“Para esses a magistrada sabia utilizar o sistema, só não sabia utilizar o sistema para os erros que a corregedoria identificou. No caso, acessou-se corretamente o sistema e nele se inseriu conteúdo indevido por mais de uma vez, repetidamente”, disse.
Marcos Machado afirmou que esta é a terceira sindicância para apurar as supostas irregularidades cometidas pela magistrada. As anteriores, segundo ele, “foram arquivadas por maioria sem qualquer efeito pedagógico, porque se houvesse nós não estaríamos na terceira”.
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