Fotografa relembra doença rara que quase lhe causou a morte Cirurgião Bucomaxilofacial alerta para os cuidados em relação à infecções dentárias, que podem evoluir rapidamente para Angina de Ludwig. Saiba como prevenir.
No começo de março de 2019, a fotógrafa Nathália Ponce, de 35 anos, viveu o que considera uma de suas experiências mais traumáticas. O que começou com uma dor de dente evoluiu rapidamente e a profissional precisou de uma cirurgia de emergência para remover uma infecção bacteriana, que poderia ter causado sua morte.
Como ela soube mais tarde, desenvolveu Angina de Ludwig, uma infecção bacteriana rara, porém grave e de rápida evolução, que afeta o assoalho da boca e o pescoço. Segundo o cirurgião dentista Judson Lopes Guimarães, a taxa de mortalidade é alta, em torno de 60%, caso a doença afete o mediastino, a cavidade torácica que contém o coração. A doença deve ser tratada a nível hospitalar, alerta o especialista em cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial do Hospital Santa Rosa, que operou Nathalia.
A fotógrafa recorda em detalhes que a doença evoluiu em 48 horas. “Sempre tive uma sensibilidade nesse dente, um molar inferior. E em nenhum dos meus exames de rotina na dentista apareceram anormalidades. Porém, após meses de tratamento, inclusive com um médico neurologista, a sensibilidade não passava. Percebi um inchaço na mandíbula e a dor foi aumentando. Voltei ao consultório da dentista e cheguei a desmaiar de tanta dor. Quando me recompus, procurei imediatamente o pronto atendimento do Hospital Santa Rosa, já com indicação de internação e uso urgente de antibióticos intravenosos”, relembra.
Com pouco mais de 24 horas de internação, Nathália viu a doença se agravar. Seu rosto foi ficando desfigurado. Depois de vários exames, foi submetida a uma cirurgia para a extração do dente e drenagem da infecção. “Fiquei irreconhecível e sentia tanta dor que só morfina conseguia controlar”, conta.
Como a incidência de cárie e outras doenças periodontais são frequentes na população em geral, Judson alerta para a rapidez na evolução da Angina de Ludwig, e recomenda o máximo de agilidade possível caso haja sintomas parecidos.
O cirurgião bucomaxilofacial ressalta ainda que atende em média oito casos de Angina de Ludwig por ano, tanto na rede privada quanto pública.
“Nathalia poderia não ter sobrevivido. É um processo infeccioso que evolui muito rapidamente, sendo que 90% dos casos têm origem dentária. A doença exige um diagnóstico e uma abordagem imediatos, pois seu desenvolvimento pode levar à obstrução das vias aéreas; pericardite, que é uma inflamação da membrana que cobre o coração; ruptura de carótida, um dos vasos sanguíneos principais que transportam sangue e oxigênio para o cérebro; inchaço da glândula sublingual e mandibular. A disseminação da infecção pode levar à sepse, criando risco de vida”, destaca o cirurgião dentista.
Causas - Dentes em mau estado de conservação, infiltrados e terceiros molares não tratados corretamente estão entre os principais fatores de risco para o desenvolvimento da Angina de Ludwig. A doença também pode ser causada por meio de infecções de amígdala, ferimento perfurante em assoalho da boca, piercing na língua, fraturas, lacerações nos tecidos moles da boca, traumas, tumores, cistos e abscessos dentários.
Judson ressalta ainda que pessoas com o sistema imunológico debilitado correm maior risco de desenvolver essa grave doença. “Pessoas com doenças como AIDS, alcoolismo, desnutrição, diabetes ou que fazem uso recorrente de anti-inflamatórios hormonais ou imunossupressores têm o risco aumentado de desenvolver Angina de Ludwig”.
Sintomas - À medida em que a infecção evolui, os tecidos infectados pela doença incham, e o pescoço pode parecer aumentado. O paciente pode sentir dor, inflamação na garganta, dificuldade para engolir, febre e calafrios.
Segundo o especialista bucomaxilofacial, o sintoma mais preocupante da infecção é a obstrução das vias respiratórias do paciente. Se o inchaço se estender para a parte de trás da garganta, as vias respiratórias podem começar a fechar, dificultando ou impossibilitando a respiração. “É o que aumenta as chances de uma fatalidade”, explica Judson.
Judson destaca ainda a importância do Hospital Santa Rosa possuir um profissional bucomaxilofacial em seu quadro. “Assim que o médico constatou os primeiros sintomas no pronto atendimento, fui imediatamente acionado para a avaliação e com base nos exames e no aumento de volume da mandíbula da Nathália fiz o diagnóstico, seguido do tratamento com medicamentos corretos e a cirurgia”.
Tratamento - O tratamento consiste em prescrição de antibióticos potentes de amplo espectro, cirurgia para remoção do foco infeccioso e drenagem. O tempo de internação varia de três a dez dias, dependendo da gravidade. “O diagnóstico precoce e o encaminhamento do paciente ao hospital e ao cirurgião bucomaxilofacial são essenciais para evitar complicações por vezes fatais”, frisa Judson.
Dois anos depois do ocorrido, a fotógrafa mantém em suas redes sociais as fotos e os depoimentos do caso. “Já ajudei a salvar muitas vidas, pois as pessoas não fazem ideia do tamanho da gravidade desta doença e reforço sempre: se tiver dor de dente procure um profissional imediatamente e não se automedique. Tive muita, muita sorte”, finaliza.
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