Psicóloga: pandemia destruiu casais que já não iam bem na cama Cristiane Cechet, de 48 anos, diz que a raiz do problema está na falta de diálogo e autoconhecimento
O distanciamento social foi necessário para frear o contágio da Covid-19 e preservar a vida de grupos como o da terceira idade, mais vulneráveis à doença. Esse distanciamento invadiu também a cama de casais nessa faixa etária e culminou com o fim de muitas relações pela falta de sexo.
Conforme dados do Colégio Notarial do Brasil (CNB), o número de divórcios no País bateu recorde após o primeiro ano de pandemia (2021), com um aumento de 4% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Segundo a psicóloga Cristiane Cechet, de 48 anos, que atende prioritariamente casais na terceira idade, a pandemia afetou relações que já vinham apresentando problemas no âmbito sexual que, segundo ela, “é o cimento que segura o casamento em qualquer idade”.
Com medo do contágio eles decidiram levar vidas separadas, inclusive na cama. “Não podia beijar, pegar na mão, não podia isso, aquilo. Cada um foi dormir em um quarto e se acostumaram a isso, em ter a cama só pra si, a não ouvir o ronco do marido”.
De muitos pacientes, Cechet chegou a ouvir: “É uma benção, ele não vai me procurar e isso era tudo que eu queria”.
As “vidas separadas” não chegaram ao fim com a flexibilização das medidas de biossegurança, ao contrário: “Muitos se afastaram e acharam maravilhoso. Mas hoje estão pagando caro por isso”.
Até quando a pessoa vai ser infeliz naquele casamento ruim, virando chacota porque um vive traindo o outro? Ou restaura o casamento ou é divórcio e cada um vai para um lado
Dentre as maiores reclamações dos homens, segundo a especialista, está a recusa das parceiras em fazer sexo oral com a alegação de sentir nojo. Já elas reclamam da rapidez dos companheiros, que muitas das vezes não as fazem chegarem ao orgasmo.
O que falta entre eles, segundo a especialista, é diálogo, é compartilhar com o outro do que gosta e como gosta que seja feito. A pessoa deve direcionar o parceiro para que o ato seja prazeroso como deve ser.
“Fazer sexo por obrigação é horrível. É como ir para morte, uma tortura”, destaca Cechet.
Esses casais chegam ao seu consultório nas últimas, quando o sexo acabou e a relação já está “quebrada”. Muitos deles levam anos sem manter relações sexuais com os parceiros.
Cechet atribui a demora pela procura de ajuda ao fato da terapia no Brasil ainda ser vista como algo supérfluo. “Enquanto isso gastam com roupas caras, restaurantes, mas não investem em autoconhecimento”.
Esse é para a especialista, o segredo para se fazer as pazes com a sexualidade, se descobrir e desprender das amarras impostas pelo imaginário da sociedade, a de que idosos não transam.
“É pecado”, só que não
Sexo é um tabu independente da faixa etária, mas quando se trata de pessoas na terceira idade há todo um imaginário social envolvido em torno do tema.
A relação controversa com o sexo começa já nos primeiros anos de vida, com a demonização da prática. O indivíduo cresce não associando o ato com prazer e o compartimentando como se não fizesse parte do todo, de quem ele é.
“Nunca ensine um filho que o sexo é nojento, que é pecado. Porque ele vai ter problemas a vida inteira e não só nessa área, vai impactar todo o resto”.
Arquivo Pessoal
Cristiane Cechet tem formação em economia e psicologia
Cechet citou o exemplo de mulheres que chegam à casa dos 60 anos e, de certa forma, se abdicam de manter uma vida sexual ativa com o parceiro, canalizando essa energia na religião.
“Ela inventa que agora que ficou velha tem que ir pra igreja igual via a avó fazendo. Isso acontece muito com mulheres mal resolvidas na cama. Rezam para restaurar o casamento, mas não investem em si mesmas”.
Outros meios de fuga, tanto para homens quanto para as mulheres, são a compra de bens materiais e a traição.
Segundo a especialista, nada impede que o casal nesse faixa etária mantenha uma vida sexual ativa e de qualidade.
Os homens a partir dos 45 anos começam a lançar mão do auxílio de estimulantes, que se usados com moderação, de acordo com Cechet, contribuem para relação.
Já as mulheres com cuidados ginecológicos, em especial durante a menopausa, e auxílio de lubrificantes, “não precisam de estimulantes e podem morrer transando”.
Se separar ou não?
Apesar da esmagadora maioria dos seus pacientes reverter a situação e “ressuscitar” a relação, Cechet diz ser favorável ao divórcio. Isso é claro, nos casos em que o amor acabou e o casal apenas “comemora datas”, década após década protelando o fim.
“Até quando a pessoa vai ser infeliz naquele casamento ruim, virando chacota porque um vive traindo o outro? Ou restaura o casamento ou é divórcio e cada um vai para um lado”, explicou.
“Você tem o direito de não gostar mais de alguém e se separar. O problema é quando é a mulher quem toma essa decisão, ela ainda é tachada como a vulgar da história”.
Para Cechet deve haver um equilíbrio entre mente, corpo e emoção. A pessoa que se conhece e se ama tem o poder de escolher o que é melhor para si.
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