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Comportamento
Segunda - 13 de Março de 2023 às 06:22
Por: Giordano Tomaseli/Midia News

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As servidoras Denise Campos e Fernanda Bueno
As servidoras Denise Campos e Fernanda Bueno

O processo de adotar uma criança no Brasil é popularmente conhecido como sendo complexo e demorado. Apesar disso, pode significar a realização do sonho de pessoas que desejam serem pais e também a mudança no futuro de uma criança, que ganhará uma família e poderá ter acesso a mais oportunidades na vida.

Foi com o objetivo de divulgar, orientar e transmitir informações sobre a adoção que surgiu em março de 2009, por meio de um grupo de voluntários, a Ampara, Associação Mato-grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção.

Em Mato Grosso, existem neste momento 53 crianças disponíveis para adoção e 59 já em processo de adoção. Esses números são do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, plataforma criada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com dados de todo o Brasil.

Para discutir esse cenário, a assistente social Denise Pereira de Araújo Campos, 35 anos, e a psicóloga Fernanda Neves Bueno, de 39 anos, servidoras públicas que trabalham na Ampara, conversaram com o MidiaNews sobre a rotina e os desafios enfrentados no dia a dia de quem lida diariamente na Associação.


Segundo elas, havia em ambas o interesse em trabalhar lá, embora não sejam adotadas ou mães adotivas. Elas são servidoras públicas, que só estão lá devido à parceria da Associação com órgãos públicos, que deslocaram alguns servidores para ajudar a ONG.

Quando o bichinho da causa da adoção te pica, quando você vê já está de corpo nela.

“Ambas passamos pelo ‘Lar da Criança’. Lá, eu já atendia algumas famílias, quando a criança ia para adoção. Quando surgiu a oportunidade de vir para cá, me identifiquei. Vim para o outro lado da moeda, onde lido com as famílias que já estão adotando”, diz Denise.

Na Ampara, ambas realizam muito mais que um trabalho como servidora, mas se dedicam as demandas e desafios que a causa exige. “A gente acaba se dedicando a causa mesmo, apoiando a ONG e fazendo muito mais coisa fora do expediente, nos voluntariamos além do trabalho profissional”, explica a assistente social.

Quem está no processo de adoção, precisa obrigatoriamente passar pelo curso preparatório oferecido pela Ampara. O curso Pré-Natal, como é chamado, tem seis módulos e envolvem aspectos jurídicos, psicológicos e sociais.

Esse é um dos três pilares da Associação, explicam. Após o curso quem se interessar, pode fazer parte de um dos dois grupos existentes na ONG. O grupo Gestação Adotiva trabalha a questão da espera e reúne os pretendentes que já estão habilitados, que estão na fila ou falta pouco para ir para ela além dos que ainda estão se habilitando. Já o Grupo Pós Adoção é formado pelos que já são pais por adoção.

“Eles [pretendentes] têm essa porta aberta e podem continuar participando aqui, apenas o curso é obrigatório no processo e os grupos vão do interesse da pessoa. Os pais por adoção enfrentam tantos desafios internos, de construir laços e vínculos, tanto externos, como o preconceito que está aí na sociedade.”, diz a psicóloga Fernanda.

Elas explicam também que o pretendente tem o direito de escolher características como raça, gênero, idade, estado de saúde da criança, por exemplo. Tudo isso é feito online garantido pelo Sistema Nacional de Adoção.

“O pretendente tem o direito de escolher. Na escolha com relação à raça precisamos lembrar quem é a população de fato. No Brasil somos grande maioria negros e pardos então não adianta vir achando que vai encontrar só loirinho de olho azul”, ressalta Fernanda.

'Ah sou branco e quero que se pareça comigo', sendo que a população é outra

Denise pontua que já houve um maior amadurecimento da sociedade quanto a essas questões nos últimos anos. “Hoje em Mato Grosso a maioria das pessoas coloca indiferente no quesito raça e gênero, então esse perfil vem evoluindo”, ressalta.

Outra coisa que também vem mudando é quanto a idade. Se antes a preferência esmagadora era somente por bebês, hoje em dia essa faixa de idade já se ampliou mais.

“Hoje boa parte dos pretendentes procuram crianças na faixa de até cinco anos. Só que continua sendo um desafio, os maiores, sobretudo os adolescentes e crianças com problemas de saúde ou deficiência” explicam ambas.

O perfil dos pais também tem mudado. Além de casais heterossexuais, aumentou muito a presença de casais homo afetivos e indivíduos querendo ser pais ou mães solo nas filas de adoção.

Se o processo demora mais para esses grupos do que para casais heterossexuais, a resposta é não.

“O procedimento é o mesmo, a entrada na parte jurídica é a mesma. Qualquer tipo de família vai ter o mesmo processo para se habilitar a adoção, vai ter que passar por curso preparatório, entregar a documentação para ser analisada, ter o estudo da assistente social, relatoria, passar pelo juiz e entrará na fila como outro qualquer” explicou Denise.

Outro mito que envolve o tema adoção é sobre a demora da fila. Ela tem a ver com vários fatores, como as características apontadas pelo pretendente no formulário, existência de crianças disponíveis, o tamanho da fila que já estava antes, dentre diversos outros fatores.

Adotamos muitas pessoas na vida, amigos, sogra. Mas quando é filho impera a questão do sangue, do biológico

Além disso, antes da finalização do processo, quem está adotando ganha a guarda provisória da criança, no que funciona como um período de adaptação para as duas partes.

“Educar é trabalhoso e na adoção tem algumas peculiaridades, porque a criança pode vir com bagagem, com uma historia. Mas a criança não tem que estar em condição de piedade, de caridade por ter sido adotada. Tem que estar numa família que os pais falem vem cá que quero ser seu pai, sua mãe. Adoção é isso”, desabafa Fernanda.

Por fim, elas falam sobre os estigmas e preconceitos que ainda cercam a adoção.

“Já há uma construção histórica e social sobre adoção. Como se não legitimasse esse filho como verdadeiro sendo que ele vai ter o mesmo direito que um filho biológico. Temos muitos desafios para serem quebrados”, afirma Denise.

“Quantos pais não tiveram de ouvir frases como ‘ah, no dia que você tiver seu filho’, ‘mas quando você vai ter o seu?’, ‘qual seu filho de verdade?’, dentre outras. Tudo que é fora do padrão tem esse preconceito”, finaliza Fernanda.

Além dos grupos e do curso, a ONG desenvolve campanhas beneficentes e educativas sobre o tema. O voluntariado na Ampara é aberto para quem tem interesse pela causa e deseja ajudar e contribuir no apoio às famílias adotivas e pretendentes à adoção.





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