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Economia
Domingo - 04 de Junho de 2023 às 06:37
Por: Eduardo Gomes/Diário de Cuiabá

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Na linguagem figurada, um refresco.

Juridicamente, uma mesa-redonda no Centro de Soluções Alternativas de Litígio do Supremo Tribunal Federal (STF).

Na prática, para Mato Grosso, o indicativo de que é preciso rever o método de planejamento mato-grossense, que não leva em conta a extraterritorialidade que costuma ser entrave legal para sua produção alcançar os portos.


Isso, sobre o projeto Ferrogrão, travado pelo STF e que, em 30 de maio, voltou ao noticiário, após o ministro Alexandre de Moraes autorizar a retomada da análise de estudos e processos administrativos sobre aquela ferrovia.

Mas, com um porém que temporariamente deixa tudo praticamente na estaca zero: Moraes definiu prazo de 60 dias para que as partes interessadas e contrárias à sua construção apresentem argumentações, para que o martelo seja batido sobre o caso.

Ferrogrão é um projeto para uma ferrovia longitudinal, idealizada por trades e produtores rurais da região Norte de Mato Grosso, conhecida por Nortão, que surgiu em meados da década passada, para a construção de uma ferrovia com 933 quilômetros, entre Sinop e a vila de Miritituba, de Itaituba, no Pará, onde parte da produção agrícola do Nortão é escoada por um porto no rio Tapajós.

Em 2012, a empresa paulistana Estação da Luz Participações (EDLP) se interessou em elaborar os estudos e pesquisas de viabilidade técnica sobre a ferrovia sonhada; com apoio das tradings ADM, Amaggi, Bunge, Cargill e Louis Dreyfus, foi elaborado um relatório de viabilidade econômica daquela que seria a Ferrogrão (EF-170).

O projeto da ferrovia ainda é solto, não está concluído em alguns aspectos, inclusive, sobre seu terminal mais ao Sul, que, para alguns, deveria ser em Lucas do Rio Verde, distante 150 km de Sinop, e onde, em 2026, deverão chegar os trilhos da Rumo, interligando a cidade a Santos (SP), via Rondonópolis, Itiquira, Alto Araguaia e Alto Taquari.

Mesmo assim, estima-se que os investimentos, incluindo obras portuárias, poderão alcançar R$ 21,5 bilhões.

A Ferrogrão deverá ser construída por trilhos em bitola larga (1.600 mm), e no sentido Norte, seus comboios poderão transportar até 58 milhões de toneladas anualmente; na direção Sul, a movimentação de cargas não foi quantificada.

Contrário à Ferrogrão, em 2021 o PSol ingressou no STF com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade para barrá-la.

Em março daquele ano, Moraes, que é o relator da ação, atendendo ao partido, concedeu uma medida cautelar, suspendendo os estudos e obras da ferrovia.

A fundamentação apresentada para impedir a construção foi uma medida provisória do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), transformada em lei, em 2021, e que retirou 859 hectares do Parque Nacional do Jamanxim, que abriga a Floresta Nacional do Jamanxim, de modo a permitir a passagem dos trilhos.

Jamanxim mede 859 mil hectares e foi criado em 13 de fevereiro de 2006.

Quando do ato de Bolsonaro, o Governo Federal assumiu compromisso de incluir 51 mil hectares ao parque, mas essa proposta foi descartada no Congresso.

A permissão concedida por Moraes abre caminho para os estudos e análises sobre o projeto em curso na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), no Tribunal de Contas da União (TCU) e no Ministério dos Transportes.

Para conceder, o ministro levou em conta informações técnicas que a Advocacia Geral da União (AGU) recebeu do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que apontam "possibilidade de acordo a respeito da controvérsia objeto da presente Ação Direta de Inconstitucionalidade com a plena proteção ambiental".

Em 10 de maio deste ano, com o projeto travado, a Assembleia Legislativa instalou a Câmara Setorial Temática da Ferrogrão, presidida pelo deputado Reck Júnior (PSD).

Em 30 de maio, Reck Júnior apresentou ao STF um calhamaço com a viabilidade econômica da ferrovia.

Na mesma data, o governador Mauro Mendes (União) reuniu-se com os ministros André Mendonça, Gilmar Mendes, Luiz Fux e Dias Toffoli, para demonstrar que a ferrovia, além de estratégica ao desenvolvimento regional, é ambientalmente correta.

O prazo dado por Moraes avança.

No Centro de Soluções Alternativas de Litígio, Mato Grosso terá que mostrar ao STF que a ferrovia retira da BR-163 milhares de carretas que transportam commodities do Nortão para Miritituba, e que, ao contrário dos veículos, a passagem do trem não facilita nem estimula a ocupação do solo pelo agronegócio, como sustenta a ação do PSol.

O ganho logístico com o trem de Sinop para o Pará é considerável, observa o presidente da Associação dos Terminais Portuários e Estações de Transbordo de Cargas da Bacia Amazônica, Flávio Catauassu.

Segundo ele, Miritituba reduzirá o chamado índice de continentalidade – o indicador que mede a distância da lavoura ao porto –, no comparativo com Santos.

De Sinop àquele porto paraense, a distância é de 933 km; de Miritituba a Santarém, o trajeto fluvial é de 140 milhas marítimas, que correspondem a 255 km – em Santarém, começa a navegação pelo rio Amazonas, que é considerada marítima.

De Sinop a Rondonópolis, o trecho rodoviário é de 750 km e da cidade ao porto de Santos, pelo trem da Rumo, a distância é de 1.655 km.

Ainda comparando, a distância de Santarém aos destinos asiáticos é, em média, 4 mil km menor do que a de Santos.

Os portos do Arco Norte, em Miritituba, Santarém, Itaqui (MA), Belém, Itacoatiara (AM), Barcarena (PA), Santana (AP) e outros, juntos, embarcaram 52,3 milhões de toneladas de commodities em 2022; e, no mesmo período, Santos exportou 46,8 milhões de toneladas.

Um estudo da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), divulgado por seu presidente, João Martins, mostra que os portos do Arco Norte respondem por 37% das exportações agrícolas brasileiras.

Essa participação seria bem maior - avalia Edeon Vaz Ferreira, diretor-executivo do Movimento Pró-Logística – se houvesse grande investimento em modais de transportes.

O acesso a Miritituba é feito pela rodovia BR-163 (Cuiabá-Santarém), e Porto Velho (RO) recebe os exportáveis pela BR-364.

Lideranças do Nortão acreditam na viabilização da construção da Ferrogrão, “pois não há argumento capaz de negar sua importância”, como salienta o prefeito de Alta Floresta, Chico Gamba.

Alta Floresta fica a 200 km do trajeto da ferrovia, mas está inserida no seu raio de influência, que no Nortão inclui, dentre outros municípios, Sorriso, Lucas do Rio Verde, Nova Mutum, Novo Horizonte do Norte, Tapurah, Ipiranga do Norte, Tabaporã, Juara, Santa Carmem, Marcelândia, Colíder, Vera, Cláudia, Carlinda, Peixoto de Azevedo, Nova Santa Helena, Terra Nova do Norte, Novo Mundo, Matupá, Paranaíta, Guarantã do Norte, Nova Canaã do Norte, Porto dos Gaúchos, Santa Rita do Trivelato e Nova Ubiratã.

Essa região forma um dos principais polos brasileiros na produção de soja, milho, algodão, farelo de soja, óleo degomado de soja, e que conta com indústrias frigoríficas, curtumes e laticínios com perfil exportador, que ora acessam portos do Arco Norte pelo transporte rodoviário.

Boa parte do açúcar nas gôndolas dos supermercados em Santarém, Itaituba, Placas, Trairão, Novo Progresso, Jacareacanga, Belterra e outros é produzida pela indústria sucroalcooleira mato-grossense em Barra do Bugres, Chapadão do Parecis e na faixa de fronteira, e chega àquelas localidades pelo transporte rodoviário.

“Com a Ferrogrão, esses produtos da agroindústria ganharão mais competitividade pela redução do frete”, observa o presidente do Sindicato Rural de Terra Nova do Norte, José Almir da Silva.

“Com essa ferrovia, Sinop vai ‘explodir’, mas os benefícios serão para todos os municípios de Mato Grosso e, principalmente, do Nortão”, acredita o prefeito de Sinop, Roberto Dorner, que vê no trem de longa distância o melhor, mais seguro e ambientalmente correto sistema de transporte.

ZONA FRANCA – A Zona Franca de Manaus produz boa parte das motos, computadores, material elétrico e cerâmico, química fina, eletroeletrônicos, bicicletas, triciclos, quadriciclos e muitos outros industrializados que são vendidos no país inteiro.

Esses itens deixam a Capital amazonense pelo rio Amazonas num trajeto de 1.606 km até Belém, de onde são transportados por carretas, num trajeto de 2.930 até a cidade de São Paulo, que os redistribui nacionalmente.

Com a Ferrogrão a distância encurta. De Manaus a Miritituba são 995 km, e de Miritituba a Sinop, pelo trem, 993 km.

BARREIRAS - Por sua localização geográfica na região central do continente, Mato Grosso enfrenta problemas legais para exportar parte de sua produção e não tem um departamento jurídico com amparo transversal entre os poderes políticos para se defender nas questões de extraterritorialidade.

O travamento do projeto Ferrogrão é um desses gargalos, e o mesmo acontece em relação a Hidrovia do Paraná-Paraguai, que tem seu porto mais ao Norte, em Cáceres, e que banha a Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai até Nueva Palmira, no Uruguai, distante 3.442 km de Cáceres.

Essa hidrovia sofre permanente questionamentos jurídicos.

No plano internacional, Mato Grosso enfrenta barreiras para alcançar os portos no Norte do Chile e do Sul do Peru, por conta de um trajeto sem pavimentação no território boliviano, e pela reserva de mercado aos motoristas nascidos naquele país, para o transporte rodoviário em solo nacional.





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