Marco temporal pode afetar até 58 terras indígenas em Mato Grosso No Estado, terras indígenas têm algum tipo de pendência administrativa, sendo que somente duas são homologadas
Aprovado no fim de maio passado pela Câmara dos Deputados, por 324 votos a favor e 131 contra, o marco temporal (PL 490/07) deve voltar a ser analisado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na quarta-feira (7).
Na tentativa de sensibilizar os ministros contra a aprovação da tese, indígenas de todo país estão mobilizados em Brasília (DF), desde segunda-feira (5).
Entre eles, o cacique Raoni Metuktire, do povo mebêngôkre kayapó, no Nordeste de Mato Grosso, e considerado uma das principais lideranças indígenas do país.
A Corte interrompeu a votação em 2021, após um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.
Até agora, dois ministros votaram, sendo o relator Edson Fachin, contra o marco temporal, e o ministro Nunes Marques, a favor.
Para a assessoria jurídica da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a decisão da Suprema Corte poderá influenciar eventuais leis do Congresso que contenham o marco temporal, que restringe a demarcação de terras indígenas àquelas já tradicionalmente ocupadas por esses povos na data da promulgação da Constituição Federal (5 de outubro de 1988).
Na ocasião da aprovação do PL, o deputado mato-grossense Fábio Garcia (União), afirmou que o marco temporal vai dar segurança jurídica e pacificar os conflitos.
“Não podemos ficar vulneráveis a um laudo antropológico de um funcionário da Funai para poder, de repente, transformar uma cidade em uma nova reserva indígena”, disse.
Já lideranças e juristas indígenas e ambientalistas consideram que o critério poderá paralisar novas demarcações e também permitir o questionamento na Justiça de processos demarcatórios já concluídos.
A matéria também deverá voltar a ser apreciado pelo Congresso nos próximos dias.
Portanto, afetará todas as terras indígenas, independentemente da situação e da região em que se encontram, uma vez que serão avaliadas de acordo com o marco temporal, colocando as 1.393 terras indígenas sob ameaça direta.
Somente em Mato Grosso, são 58 terras com algum tipo de pendência administrativa, de acordo com relatório do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
Destas, somente duas já foram homologadas, o que significa que ainda aguarda registro no Cartório de Imóveis da Comarca e/ou no Serviço de Patrimônio da União (SPU) ou conclusão da demarcação.
As duas são a “Baía dos Guatós”, dos povos guatós, entre Barão do Melgaço e Poconé, e a TI Pequizal, dos naruvôtud naruwotodd, entre Canarana e Paranatinga.
Há ainda sete declaradas (com portaria declaratória do Ministério da Justiça e aguardando homologação), cinco identificadas, 15 áreas a identificar, uma com portaria de restrição e 28 sem nenhum tipo de providências.
A área com restrição trata-se dos TI Piripkura, dos indígenas isolados piripkurad”, entre Colniza e Rondolândia.
MPF – Também no fim de maio passado, a Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (6CCR/MPF), órgão superior vinculado à Procuradoria-Geral da República (PGR), divulgou nota pública reafirmando a inconstitucionalidade do PL 490/2007.
O MPF diz que a proposição condiciona a demarcação das terras tradicionais à presença física dos indígenas nas respectivas áreas em 5 de outubro de 1988, o que representa ameaça ao direito das populações originárias ao seu território.
Na nota, o MPF chama atenção para a impossibilidade de se alterar o estatuto jurídico das terras indígenas (disciplinado pelo artigo 231 da Constituição) por lei ordinária, o que torna a proposta frontalmente inconstitucional.
Além disso, os direitos dos povos indígenas - em especial à ocupação de seus territórios tradicionais - constituem cláusula pétrea, integrando o bloco de direitos e garantias fundamentais que não poder ser objeto sequer de emenda constitucional.
Conforme o MPF, a tese do marco temporal consolidaria inúmeras violências sofridas pelos povos indígenas, como as remoções forçadas de seus territórios, os confinamentos em pequenos espaços territoriais e os apagamentos identitários históricos.
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