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Policia MT
Terça - 12 de Dezembro de 2023 às 19:19
Por: Primeira Página/Helena Corezomaé

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Dados da Sesp-MT (Secretaria de Estado de Segurança Pública de Mato Grosso), enviados ao Primeira Página, revelam o crescimento de 121% em mortes por intervenção de agente do Estado em 2023.

O levantamento é de janeiro a outubro, e compara o mesmo período do ano anterior. Em 2022 foram registradas 87 mortes, já neste ano foram 192. Em todo ano de 2022 foram 109 mortes no estado.

Mulher é encontrada morta em sofá de casa em MT(Foto: Reprodução internet)

Onde morre mais?

A cidade de Mato Grosso com maior número de mortes por intervenção da polícia é Cuiabá, que neste ano registrou 26 casos.

Em seguida, aparecem empatadas, Sorriso e Várzea Grande, que tiveram 14. Depois, vem Sinop, com 10 mortes. Em seguida, Barra do Bugres que registou 9.

Ao todo, até outubro deste ano, 57 municípios de Mato Grosso, entre os 142 existentes, registraram ao menos uma morte por intervenção do estado.

Casos em Mato Grosso

Entre as ocorrências em Mato Grosso, neste ano, está uma que aconteceu em 30 de janeiro, quando cinco homens morreram em confronto com a PM (Polícia Militar) em Barra do Bugres, a 169 km de Cuiabá.

PM MTConfronto ocorreu em uma casa do Bairro Maracanã, em Barra do Bugres (MT). (Foto: Divulgação)

Segundo a PM, Igor Felipe de Arruda Taques, Carlos Henrique da Silva Santos, Jelson Teixeira, Max Wilian Marques Malta e Geraldo Marques da Silva faziam parte de uma facção criminosa e foram até a cidade, no dia 28 de janeiro, para executar membros de um grupo rival.

Ao receberem a denúncia de que os criminosos tentaram matar três pessoas, policiais foram até uma casa no bairro Maracanã, e encontraram os suspeitos que, segundo a equipe, fizeram menção de atirar com arma de fogo e eles revidaram.


Na época, o tenente coronel Murilo Franco, informou que foi aberto um inquérito para investigar a conduta dos policiais.

Mortes recentes

Em 8 de outubro, Deived Rodrigues Mardim e Richard Gustavo Oliveira Camargo, ambos de 19 anos, morreram em confronto com policiais militares em Cuiabá.

Foto PM mortes CuiabaNa residência, os policiais apreenderam drogas, 3 armas, 23 munições e 1 balança. (Foto: PM MT)

Os agentes informaram que reconheceram um veículo roubado e abordaram um terceiro suspeito, que estava dentro do carro, que indicou onde estavam os outros suspeitos.

Ao chegar no local, segundo os PMs, Deived e Richard apontaram as armas em direção a equipe. Em seguida, os policiais atiraram.

Número deve ser maior

O caso mais recente, que não aparece nos dados, aconteceu em novembro, quando seis pessoas morreram em confronto com policiais, ao fazerem seguranças reféns e tentarem roubar veículos de um pátio de uma concessionária, em Várzea Grande, na região metropolitana.

De acordo com a Polícia Civil, o objetivo do grupo era roubar 40 veículos. Porém, conseguiram levar três carros zero quilômetro.

Especialista avalia mortes

A antropóloga, professora do Departamento de Segurança Pública da UFF (Universidade Federal Fluminense), Jacqueline Muniz, ressaltou que o aumento da letalidade policial, de maneira alguma, pode ser explicada devido ao crescimento da criminalidade violenta ou do fortalecimento do crime organizado.

“Na verdade, a letalidade policial resulta de uma autorização política, ou de uma autorização de setores da sociedade, da incapacidade e da incompetência no exercício das funções policiais”, afirma.

Jacqueline Muniz analisa mortes em Mato Grosso. (Vídeo: Primeira Página)

Além disso, reforçou que o aumento de mortes por intervenção de agente do estado deveria acender um alerta no Governo Estadual, para que busque em suas estruturas elementos que resolvam a situação.

“Outro problema sério é que essa matança pode estar revelando uma fragilidade aguda na doutrina de uso da força, ou seja, na qualidade decisória do policial, o seu juízo tático, estratégico. Se atira muito e mal, isso revela esta fragilidade. É preciso que o governo apresente as taxas de acerto de tiro defensivo por modalidade de armamento e cenário tático de atuação, porque nenhuma polícia tem licença pra matar”.

Bandido bom é bandido morto?

A especialista explica que o suspeito é quem poderia contribuir com as investigações e revelar como o crime funciona. Por isso, em sua avaliação, a polícia ao matar os suspeitos, na verdade, está prestando um serviço ao crime organizado.

“Você está matando, supostamente, a ‘galinha dos ovos de ouro’. Ele é quem pode dizer como o crime funciona. Se você está matando, supostamente, o criminoso, você está produzindo queima de arquivo de um lado e, para o crime organizado, é menos um para ser sustentado dentro da cadeia”.

Pesquisa divulgada pelo FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública) apontou que cerca de 60% dos brasileiros concordam com a frase “bandido bom é bandido morto”. Os dados fazem parte do 10º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, de 2016.


Para a especialista, isso se explica devido ao medo que a população vem vivenciado no país. “O medo é péssimo conselheiro, diante do medo agravado pela insegurança pública generalizada, cada um de nós abre mão das garantias individuais e coletivas que conquistamos. A gente vai naquele momento do desespero apoiando de maneira inconsciente, até de maneira afetiva, transtornada, o tiro porrada e bomba e o bandido bom é bandido morto”.

Como reduzir o número?

Para reduzir o número de mortes por intervenção do estado, Jacqueline Muniz diz que o Governo de Mato Grosso pode adotar iniciativas administrativas e procedimentais, que são de baixo custo.

“Primeira coisa básica, controle no uso individual de armamento e munição, e gasto de munição. Essa é a primeira dimensão. Outro ponto fundamental é a atualização dos protocolos ou procedimentos policiais compatibilizando-os entre a Polícia Militar e a Polícia Civil. E, mais que isso, tornando-os transparente públicos e publicados”.

Além disso, a especialista cita a criação de mecanismos de controle externo e interno. “Uma corregedoria geral unificada e uma ouvidoria. No entanto, essas duas coisas elas são reativas, para elas funcionarem, elas dependem de uma denúncia, de que alguma coisa ruim aconteceu. Então, é muito importante a profissionalização dos dispositivos de controle interno, tanto da Polícia Militar quanto da Polícia Civil”.

O que diz a PM sobre os dados?

O comandante-geral da PM, coronel Alexandre Côrrea Mendes, afirmou que se engana quem pensa que o aumento da letalidade policial tem a ver com o despreparo ou truculência das polícias.


Comandante geral da PMAlexandre Côrrea Mendes. Crédito da foto: Christiano Antonucci – Secom/MT

“Revela, na verdade, que a criminalidade está mais violenta. Revela, principalmente, que as forças de segurança são cada vez mais recebidas a tiros pelos criminosos. Portanto, devemos falar no aumento da violência das facções, que florescem no solo da impunidade. E não apenas nos casos de confronto vemos essa violência avolumando”.

Como exemplo, o comandante-geral da PM citou a chacina de uma família em Sorriso, a 420 km de Cuiabá. Cleci Calvi Cardoso, de 45 anos, e suas filhas Miliane Calvi Cardoso, 19 anos, Manuela Calvi Cardoso, 13 anos e Melissa Calvi Cardoso, de 10 anos, foram encontradas mortas dentro de casa.

“Ficamos aterrados com o assassinato de quatro mulheres em Sorriso, entre elas, uma criança. O que aconteceu nesse episódio expõe uma crueldade inédita na região, que está a reboque da impunidade. Leis frouxas incentivam a escalada da violência que deságuam no confronto armado. Portanto, se há aumento da letalidade, o questionamento a ser feito não é porque as polícias têm “matado” mais, porém, por que a vida do cidadão perdeu valor, exigindo das polícias o uso técnico da força letal, no estrito cumprimento do dever legal”, disse o comandante.

Além disso, para o coronel Alexandre Côrrea Mendes, “há ainda o problema do congestionamento da Justiça, o que gera morosidade e mais impunidade. Bem como ausência de efetividade na ressocialização, o que gera mais reincidência”.


O coronel ainda informou que a Polícia Militar de Mato Grosso revisa continuamente seus protocolos. “Prova disto é o nosso Procedimento Operacional Padrão, que é referência e nesse momento está sendo atualizado. Ademais nossa Corregedoria tem se mostrado atuante, sem qualquer corporativismo”.

Sesp também se posicionou

O Primeira Página também questionou a Sesp (Secretaria Segurança Pública de Mato Grosso) sobre o aumento de mortes em confronto com a polícia.

Em resposta, a Pasta informou que “as forças de segurança reforçaram as atividades ostensivas e repressivas para combater organizações criminosas no estado. Esse aumento da atividade policial ocasionou mais patrulhamento, a diminuição do tempo-resposta e consequente enfrentamento da criminalidade. Sendo assim, houve mais confronto das forças de segurança por enfrentamento por parte dos criminosos”.

Já sobre como a pasta tem atuado para diminuir a ocorrência de mortes em confrontos com a polícia, a Sesp respondeu que “oferece capacitação permanente aos policiais e segue procedimentos operacionais padronizados nas abordagens dos suspeitos”.

Além disso, de que em “todos os casos há perícia criminal e investigação da Polícia Judiciária Civil e Corregedoria da Polícia Militar”.





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