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Repórter News - reporternews.com.br
Agronegócios
Quinta - 11 de Dezembro de 2025 às 18:02
Por: Nagera Dourado/Primeira Página

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Na Agrovila das Palmeiras, em Santo Antônio de Leverger (MT), o extrativismo do babaçu deixou de ser atividade complementar e se tornou o motor econômico de 33 famílias. Organizadas na Cooperativa Agropecuária Mista (Coopamsal), elas profissionalizaram a produção com apoio financeiro e tecnológico, ampliando a renda e agregando valor a produtos que vão do óleo culinário ao cappuccino premiado.

2 2Extrativismo de babaçu impulsiona produtos desenvolvidos para culinária e estética – Foto: Coopamsal

O trabalho ganhou forma há cerca de cinco anos, quando a cooperativa estruturou um grupo de 15 mulheres para organizar a produção. À frente delas está Rosilene Rodrigues Maruyama, presidente da Coopamsal, que lembra o início marcado por limitações: sem máquinas, todo o processo, da extração da farinha ao preparo do óleo e do artesanato, era feito manualmente, em jornadas longas e de baixo rendimento.

“Começamos fazendo 3,5 litros de óleo por dia e achávamos que estávamos potentes”, conta Rosilene com humor. A virada veio com um financiamento de cerca de R$ 830 mil, obtido pelo REM (Programa Global REDD Early Movers) em 2023. O recurso permitiu profissionalizar a produção: melhorar a cozinha, adquirir equipamentos, modernizar a agroindústria, instalar energia solar e ampliar a estrutura de água.

Hoje a cooperativa já consegue extrair 60 litros de óleo de babaçu por hora, um salto gigantesco para uma comunidade que antes trabalhava quase de forma artesanal. O óleo pode ser utilizado tanto na culinária quanto na estética e quem utiliza, aprova. “É melhor do que muito óleo e creme vendido no mercado e ainda por cima é natural”, avalia a responsável pela produção, Maria José da Silva Wakinaguni.

Cappuccino de babaçu: a fórmula premiada

Foram os benefícios do babaçu que fizeram Maria José se envolver ainda mais com a atividade. Ela descobriu na farinha do mesocarpo um aliado para tratar inflamações intestinais. Logo percebeu o potencial nutritivo e criou novas receitas. “A minha saúde melhorou muito depois que comecei a consumir a farinha do babaçu. Como eu tinha a necessidade e a palmeira disponível, ao invés de comprar, passei a produzir a minha própria farinha”, destaca.

Padre Luciano Braga foto reproducao instagram 1Fórmula da receita foi premiada e trouxe investimentos para a comunidade – Foto: Coopamsal

O produto em si pode ser misturado em mingaus, bebidas e outras preparações e foi a partir dele que surgiu uma receita que conquistou o público: o cappuccino de babaçu. “O cappuccino surgiu para aumentar a venda da farinha, porque as pessoas não conheciam os benefícios. O produto é feito com 80% de farinha de babaçu, além de café, chocolate e canela. Sem leite e sem açúcar, é mais nutritivo e rico em fibras”, explica.

A produtora lembra que quase desistiu no início. “Gastava 10 minutos para cascar um coco”, conta. A guilhotina, um equipamento desenvolvido no Maranhão, agilizou o trabalho, mas a mecanização ainda é limitada. “Os equipamentos são obsoletos. Precisamos de tecnologia, de máquinas compactas para extrair o mesocarpo. Isso resolveria a vida dos pequenos produtores”, afirma Maria José.

Equipamentos otimizaram produção mas ainda falta tecnologia para avançar – Foto: Coopamsal

Hoje, um pacote de 100 g do cappuccino é vendido a R$ 20 e rende três litros de bebida. A cooperativa pretende chegar a uma produção de 5 mil kg, mas, por falta de tecnologia, alcança apenas cerca de 100 kg.

A fórmula do cappuccino de babaçu rendeu à Cooperativa um prêmio do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) em 2019, que impulsionou os investimentos que chegaram à comunidade. Além dessa conquista, hoje o grupo participa do programa federal Mais Gestão e obteve o direito de se inscrever para fornecer produtos às escolas pelo PAA )Programa de Aquisição de Alimentos). A visibilidade extrapolou fronteiras: em novembro produtos foram enviados para a COP 30, e uma empresa de gestão acompanha a estratégia de expansão da marca.

A cooperativa também possui a certificação OCS que permite aos agricultores fazerem doações e vendas diretas ao consumidor. Por meio dela, no dia 19 de dezembro, a cooperativa participará da Ecofeira, feira de economia sustentável realizada na praça central da Universidade Federal de Mato Grosso em Cuiabá.

Responsabilidade ambiental

4Objetivo é manter palmeiras em pé e preservar Pantanal – Foto: Coopamsal


O compromisso da Coopamsal vai além da produção. “A nossa pegada é manter as palmeiras de babaçu em pé. Se derrubar tudo, vamos secar o Pantanal lá embaixo. O Pantanal começa no Cerrado”, reforça Rosilene. O modelo adotado pela cooperativa alia geração de renda ao equilíbrio ambiental, mantendo as áreas de babaçu como aliadas da conservação.

Além do babaçu, grupos também trabalham com baru, açafrão, urucum e jatobá. Hoje, 33 famílias integram a produção, sendo 15 mulheres dedicadas diretamente ao extrativismo.

5Comunidade também investe em outros produtos do cerrado – Foto: Coopamsal

A expansão da produção expôs outro desafio: a falta de regulamentação específica. A cooperativa ainda enfrenta entraves para emitir nota fiscal e acessar mercados maiores. “Parece que só vão criar normas quando tiver produção. Então estamos no ataque”, afirma a presidente.

Com apoio da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Coopamsal busca tecnologias e conhecimento especializado. Uma das viagens estratégicas foi ao Maranhão, onde o uso do babaçu é tradicional e existe uma cadeia produtiva consolidada.

Coopamsal: salto na produção e fortalecimento comunitário

+1600%

aumento na capacidade de produção de óleo de babaçu
de 3,5 litros/dia (início) para 60 litros/hora (agora)

Produção antes

3,5 litros/dia

Produção atual

60 litros/hora

+33 famílias

envolvidas diretamente na cadeia produtiva do babaçu

15 mulheres

lideram o extrativismo e a transformação do babaçu na cooperativa

Desafios do setor

A experiência da Coopamsal mostra que, quando organização comunitária, conhecimento tradicional e políticas públicas se encontram, a floresta em pé vira prosperidade e o babaçu, antes visto como praga, transforma-se em riqueza social, econômica e ambiental.

Porém mesmo com os avanços, há obstáculos. A falta de jovens interessados no extrativismo preocupa o grupo, e a urgência por equipamentos adequados limita a escala da produção. Outro desafio é a perecibilidade: a farinha de babaçu perde qualidade rapidamente, impedindo grandes estoques. “Cada comunidade precisa ter seu próprio equipamento. O extrativismo depende da natureza e do tempo dela”, defende Maria José.

Apesar das dificuldades, as cooperadas seguem confiantes. “Se a gente não tem apoio governamental, a gente não caminha, por isso, a gente segue atacando”, resume Rosilene.





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