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Esportes
Sexta - 16 de Março de 2012 às 18:26
Por: JEFFERSON PUFF/JÚLIA DIAS

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As recentes desavenças entre a Fifa e o governo brasileiro sobre a Copa do Mundo de 2014 têm provocado polêmica, mas os atritos com a entidade que regula o futebol também fizeram parte da relação com os organizadores de Mundiais passados.

Tanto a África do Sul, sede da Copa de 2010, como a Alemanha, que organizou o Mundial em 2006, tiveram problemas com a Fifa em algumas das mesmas questões que vêm sendo temas de divergência no Brasil.

Em entrevista à BBC Brasil, especialistas e ex-membros dos Comitês Organizadores Locais (COL) das duas últimas Copas apontam que, embora tenha havido concessões -- mais do lado dos ex-anfitriões do que da entidade sediada em Zurique-- a solução para driblar os confrontos é o consenso.

A crise entre o governo brasileiro e a Fifa ganhou destaque no início do mês, quando o secretário-geral da entidade, Jérôme Valcke, disse que os organizadores deveriam levar um "chute no traseiro" para agilizar as obras necessárias e a aprovação da Lei Geral da Copa, e questionou o motivo de as coisas "não estarem andando".

O comentário foi mal recebido pelo Ministério do Esporte, que chegou a rejeitá-lo como interlocutor, mas após um pedido de desculpas o episódio se dissipou.

Para tentar retomar as relações e acelerar a organização do Mundial, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, se reúne nesta sexta-feira, ao lado de Pelé, com a presidente Dilma Rousseff.

A visita ocorre um dia após o Congresso ter mais uma vez adiado a votação da Lei Geral da Copa e pouco mais de uma semana após renúncia de Ricardo Teixeira do comando da CBF e do COL.

CERVEJA

A venda de bebidas nos estádios, que agora é motivo de disputa e confusão no Congresso brasileiro, também criou divergências comerciais e de preferência tanto na Alemanha como na África do Sul.

"Sempre foi possível comprar cerveja nos estádios sul-africanos. O problema é que os parceiros da Fifa bateram de frente com os patrocinadores locais", diz o jornalista Peter Stemmet, da emissora sul-africana ETV News, que cobriu os jogos.

Ele afirma que, no país, as marcas dão nome aos estádios. "O Soccer City na verdade chama-se FNB Stadium. Ellis Park é o Coca-Cola Park, e o Free State Stadium, na realidade, é o Vodacom Park. Nossos estádios tiveram que mudar de nome por exigência da Fifa."

"Além disso, entre os torcedores houve insatisfação quando descobriram que a única cerveja disponível nos estádios seria americana. As cervejas sul-africanas são muito boas", avalia.

No país da cerveja, o lobby dos fabricantes foi mais eficiente. Por iniciativa do Parlamento do Estado da Baviera, no sul do país, a Alemanha acabou firmando um acordo com a Fifa: 40% da cerveja vendida nos estádios foi alemã, mas servida em copos transparentes para que sua marca não ficasse visível.

CONSENSO E "CONTO DE FADAS"

Primeiro vice-presidente do COL alemão e braço gerencial de Franz Beckenbauer na chefia da organização da Copa de 2006, Horst Schmidt diz que não houve uma Lei Geral da Copa na Alemanha.

Embora a Fifa inicialmente tenha cobrado o país a respeito, o governo alemão entendeu que não havia a necessidade de criar novas leis e que a legislação existente já cobria os compromissos assumidos.

Já a África do Sul aprovou a sua rapidamente, cinco anos antes do evento. De acordo com Schmidt, que hoje em dia é consultor do subcomitê de ingressos da Fifa, a legislação sul-africana da época tornava essencial a criação de uma lei geral para o Mundial.

Ao recordar a experiência com os preparativos para a Copa de 2006, o gerente do COL alemão afirma que há margem de negociação com a Fifa, mas somente por meio de acordos.

"Não dá para chegar para a Fifa e dizer "não vamos fazer isso". Ambos os lados têm que concordar", disse Schmidt à BBC Brasil em Doha, onde participou da 2ª Conferência Internacional em Segurança no Esporte.

Jens Grittner, atual diretor de comunicações da Federação Alemã de Futebol (DFB, na sigla em alemão) e ex-membro da diretoria de mídia do COL em 2006, diz que a preparação de uma Copa é desafiadora e que os alemães também foram alvo de pressão da Fifa, embora em um contexto diferente do Brasil.

"Dois anos antes da Copa do Mundo de 2006, também enfrentamos duras críticas. Por exemplo, a construção do estádio de Frankfurt só foi finalizada pouco antes da Copa das Confederações, em 2005. Mesmo assim, ninguém se lembra disso. O que fica é a ideia do "conto de fadas" do verão do ano seguinte", diz.

"DONA DA COPA"

No caso da África do Sul, o ex-diretor de comunicações do COL 2010, Rich Mkhondo, diz que a Fifa também pressionou os organizadores locais, mas agora avalia que é necessário perceber o papel da entidade em relação aos jogos.

"Os brasileiros precisam entender que a Fifa é a dona da Copa do Mundo e vai fazer as coisas do jeito que ela quer, e não do jeito que o Brasil quer. Mesmo que não concordássemos com alguns aspectos, sabíamos que eram eles que estavam tomando as principais decisões", afirmou Mkhondo à BBC Brasil.

"A Fifa não compartilha a estratégia dela com você", acrescenta o sul-africano. "No caso do Brasil, o que importa para a Fifa é que os jogos precisam começar em junho de 2014, e eles querem os estádios e tudo o que é necessário para isso aprovado e pronto."

Mesmo assim, ele admite que em alguns pontos foi preciso insistir. "Quanto à venda dos ingressos, a Fifa não concordava com alterações em seu sistema, basicamente on-line. Eles não entendiam que a maioria dos sul-africanos não tem computador em casa. Foi um processo de educação, tivemos que explicar", relembra.

Mas se bater de frente não é o melhor caminho, ceder demais também pode causar problemas. Peter Stemmet diz que muitos em seu país criticaram a posição das autoridades sul-africanas, que teriam sido condescendentes demais com a entidade.

"Os sul-africanos achavam que nós tínhamos vendido nossa alma para a Fifa. Eles nos diziam o que fazer e nós obedecíamos sem titubear. Eu duvido que um membro do comitê da África do Sul teria tido coragem de dizer não à Fifa na época".

Rich Mkhondo lembra que outro motivo de frustração entre a população foi a impossibilidade de atuação de ambulantes em um raio de 1 quilômetro ao redor dos estádios. "Muitos sul-africanos acharam que iam ganhar dinheiro durante as partidas, o que não aconteceu."






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