Dependência e rivalidade aos olhos dos EUA
Quatro décadas depois da diplomacia do pingue-pongue entre Richard Nixon e Mao Tsé-tung restabelecer os laços entre China e EUA, os chineses são vistos em Washington através de duas lentes: a do parceiro comercial e cliente fiel, mas, ao mesmo tempo, a do adversário que ameaça a economia, a segurança e mesmo os valores americanos.
No lado positivo das relações sino-americanas, as exportações dos EUA para a China cresceram 380% na primeira década deste século. Hoje, Pequim é o segundo maior parceiro comercial de Washington. Juntamente com Hong Kong, os chineses detêm mais de US$ 1 trilhão em títulos da dívida pública americana.
Os EUA, porém, também observam lados negativos na relação. Se as exportações para China quase quintuplicaram, o déficit na balança comercial cresceu 329%. O fato de os chineses possuírem tantos títulos americanos deixa Washington dependente de Pequim, na avaliação de muitos economistas.
Na política externa, os EUA e a China têm muitos objetivos em comum, embora visões de mundo largamente distintas. "Ambos concordaram na oposição aos programas nucleares do Irã e da Coreia do Norte, mas divergem sobre a tática para os reverter. Trabalharam juntos para manter a paz na Península Coreana e no Estreito de Taiwan, mas veem a Primavera Árabe de forma distinta", diz Jeffrey Bader, do Brookings Institution, de Washington.
Essa "esquizofrenia" da relação com a China, que ao mesmo tempo ajuda e ameaça a economia americana, além de adotar uma diplomacia que coincide e colide com a de Washington, leva o governo chinês a ser encarado com cautela nos EUA.
O reflexo dessa imagem perpassa dos pré-candidatos republicanos ao movimento Ocupe Wall Street. Mitt Romney, favorito para encarar o presidente Barack Obama em novembro, publicou editorial no Wall Street Journal afirmando que, se eleito, combaterá "as práticas abusivas do governo chinês no comércio, propriedade intelectual e política monetária". Rick Santorum, segundo colocado e apoiado por facções conservadoras do Tea Party, diz que "não aceitará que a China continue desrespeitando os direitos humanos".
Em Nova York, durante o acampamento do Ocupe Wall Street, que representa setores da esquerda americana, manifestantes seguiam na mesma linha dos seus adversários direitistas. A China seria cúmplice do aumento do desemprego americano ao baratear a mão de obra por meio do trabalho infantil e da fragilidade de direitos trabalhistas. Mesmo na educação, os americanos passaram a se fixar na emergência da China.
A estridência das críticas fez Henry Kissinger, secretário de Estado de Nixon e artífice da aproximação de 1972, sair das sombras. Ele recentemente publicou um livro sobre a questão - On China, ou Sobre a China, em tradução livre - e, em artigo na revista Foreign Affairs, disse que "os dois lados devem entender que as ações de cada um deles faz parte do cenário internacional e não são causa para alarme".
Jon Huntsman, republicano que foi embaixador de Obama em Pequim, lamenta o discurso anti-China.
"É muito mais fácil falar de China usando o medo do que a oportunidade. Na realidade, nos últimos 40 anos, temos sentado à mesa para negociar com Pequim e isso tem funcionado. Não devemos partir para uma relação conflituosa.
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