Para o teólogo Fabian Nacer, 44 anos, os dependentes de crack deveriam ser forçados a se tratar, numa espécie de internação compulsória. "Não tem conversa com quem está fumando 24 horas ao dia e morando na rua. Ele não responde mais por si, é uma pessoa com a mente doente. Você tem que trancar (internar) à força. Você faz agora algo que ele pode não gostar, mas daqui a 30 dias vai agradecer", disse.
As palavras de Nacer podem parecer duras demais, mas são afirmações baseadas numa realidade da qual fez parte. Ele sabe muito bem o que está falando. O teólogo passou cerca de 6 anos nas ruas do perímetro da região central de São Paulo conhecido como Cracolândia entre os anos 1990 e 2000, sem banho regular e queimando de 10 a 12 pedras diárias da droga no cachimbo. Depois do banimento voluntário da vida social, hoje está recuperado e coleciona 25 internações. Nacer recuperou a vida e a confiança da família. Administra uma das empresas dos pais e irmãos e presta às vezes consultoria sobre o vício nas drogas.
Pela sua experiência, uma certeza Nacer tem: a rua perpetua o vício. De acordo com ele, mesmo sem roubar, um sem-teto pode angariar cerca de R$ 100 diários apenas mendigando. Permanecer na rua significa ter acesso fácil ao crack. "Os mais sujos, com mais dificuldade de se comunicar, conseguem R$ 1.200 todos os meses fácil. As pessoas dão", conta.
Caminhos da recuperação
Nacer acredita que cada dependente químico tem seu caminho para superar o crack, sem uma fórmula segura. A partir do primeiro choque de abstinência, o viciado em recuperação costuma seguir a possibilidade mais comum: o encontro com uma fé religiosa. Mas há alternativas na recuperação, de acordo com ele.
"Existem clínicas que apostam nos 12 passos, comum a programas como o de "Narcóticos Anônimos". Tem o caminho da descoberta de uma aptidão, para a arte ou os esportes ou ainda a substituição do crack por remédios que vão pouco a pouco sendo diminuídos e finalmente retirados", afirmou.
A recuperação de Nacer mesclou a redescoberta da fé cristã com a administração dos remédios. "Tomava um pra dormir, outro pra acordar, outro pra ter fome, outro pra ter foco", relata. Finalmente, retomou os estudos e se formou em Teologia.
A operação policial que dispersou centenas de dependentes químicos do quadrilátero onde o comércio e consumo de drogas era praticamente livre na capital paulista é visto por ele com uma crítica ponderada. De acordo com Nacer, a higienização das ruas da Cracolândia deve ser fruto da pressão de comerciantes locais.
"Foi feito o que poderia ser feito, mas a Cracolândia vista na rua é apenas um terço do que existe. De cada três usuários do crack, dois estão dentro dos buracos, nos hotéis baratos, nos casarões abandonados. Dentro destes lugares eles estão se matando sem que ninguém veja ou se importe", explica.
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