A dívida começou pequena, com uma sequência de pequenos atos que, hoje, ela avalia como erros: empréstimos pessoais, saques e compras em cerca de dez cartões de cartão de crédito. Por vezes, sacava dinheiro de um cartão para pagar outro. Quando se deu conta do problema e tentou, sozinha, conversar com os credores para parcelar o montante, viu a dívida se multiplicar por causa dos juros altos cobrados no acordo de renegociação.
“Fui multiplicando a dívida nesses acordos. Um cartão com fatura de R$ 3 mil em aberto, eu ia renegociar e subia para R$ 15 mil. Mas aí foi chegando nesse valor absurdo”, conta Dora, que decidiu pedir ajuda a um advogado quando o montante chegou perto dos R$ 300 mil.
A dona de casa, que perdeu noites de sono por causa da dívida, conta que a ansiedade de querer finalmente pagar o que devia fazia com que ela aceitasse acordos precipitadamente com os credores para, no mês seguinte, perceber que não teria condições de honrar as parcelas.
"Eu queria resolver o problema, então qualquer coisa que o banco propunha eu aceitava. Não dormia, não podia me sentir uma pessoa caloteira. Eu não sabia colocar no papel o quanto eu ganho, o quanto eu gasto e o quanto sobra, que é o tanto que eu posso usar para pagar as dívidas. Hoje eu aprendi a fazer um roteiro, anotar tudo que eu gasto, e comparar", comemora Dora, cuja dívida hoje caiu para R$ 100 mil, ainda pesada para a renda média mensal de R$ 2 mil.
Depois de cortar radicalmente os gastos de lazer, procurar atividades para aumentar a renda e mudar os hábitos financeiros de toda a família, ela diz que aprender a usar o crédito mudou sua vida de muitas maneiras. "Até minha filha entendeu. Falei para ela que eu errei, mas que o importante era que estamos juntas", diz. A menina já aprende a lidar com dinheiro desde pequena. "Ela quer uma Barbie de aniversário. No começo do ano combinei que ela ia juntar do dinheirinho que ganha da madrinha, meu, e que em outubro eu complementaria o que faltasse e esse seria o meu presente. Quando chegou a data, dei R$ 24, ela foi à loja, comprou e ficou muito feliz, satisfeita", comemora a mãe.
A dificuldade para resolver dívidas acumuladas que atrapalhou Dora é comum, na avaliação do assessor econômico da Serasa Experian, Carlos Henrique de Almeida. "O brasileiro não sabe negociar suas dívidas", diz o especialista. Ele explica que manter um bom nome na praça ajuda inclusive a se pagar juros menores quando precisar de um novo empréstimo. (Veja no vídeo acima: Mara Luquet dá dicas para sair das dívidas)
O educador financeiro Mauro Calil alerta: quanto mais fácil, mais caro o empréstimo. "Se alguém vai te dar crédito com o nome sujo, vai te emprestar com o juro mais alto. Aquelas propagandas na TV que prometem empréstimo sem verificação no Serasa só conseguem isso porque o juro é tão alto e absurdo que eles não estão nem aí. Se o tomador pagar uma ou duas parcelas, eles já estão no lucro", diz Calil.
Como negociar da forma correta? O G1 consultou entidades e especialistas que dão dicas. Confira:
PASSO A PASSO PARA RENEGOCIAR DÍVIDAS | |
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1º - Anote em um papel todas as contas que estão para vencer ou vencidas. Para facilitar, tente colocar juntas as dívidas de uma mesma loja e, no final, faça a soma total dos valores que está devendo em cada um dos lugares. |
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2º - Coloque também no papel o quanto é sua renda, quanto são seus gastos fixos e o que sobra. |
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3º - Não se sinta constrangido ao renegociar a dívida. A iniciativa de procurar a negociação já mostra a intenção de honrar o compromisso. "Primeiro as pessoas têm vergonha de fazer isso, porque vão ter que se expor a uma quebra moral da palavra dela", diz o educador financeiro Mauro Calil. Seja sincero com o atendente que irá avaliar o seu caso e fale abertamente sobre os motivos que fizeram você deixar de pagar as contas. |
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4º - Na negociação, faça as seguintes perguntas para o credor, segundo orienta Mauro Calil: |
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5º - Se perceber que não vai ter como pagar uma ou demais parcelas da (s) dívida (s), entre em contato com a(s) loja(s) e explique a situação. Tente fazer isso o quanto antes, para evitar que assim que a dívida fique cada vez maior. |
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6º - Antes de renegociar, faça os cálculos e anote no papel uma proposta que se encaixe no seu orçamento. Jamais recorra ao cheque especial, saques de cartão de crédito ou empréstimos que possuam taxas muito altas para cobrir o "rombo". Tente procurar alternativas mais baratas, como o crédito consignado, por exemplo. "A pior coisa que alguém pode fazer é pegar dinheiro com uma financeira para pagar a outra. Esta é a verdadeira origem da bola de neve. Se você está tentado a fazer isso, pare, não faça nada, fique inadimplente que é muito melhor. Uma coisa leva a outra e a dívida nunca para de aumentar". |
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8º - Na hora de renegociar com a loja/banco/financeira, tenha em mãos todas as informações que podem ajudar na conversa, como as contas em atraso e as cartas de cobrança que recebeu em casa. |
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9º - Fique atento: muitas vezes uma mesma dívida é cobrada por várias empresas de cobrança contratadas pelo credor. Para não confundir, reúna todas as cartas e identifique qual apresenta a melhor proposta de renegociação e parcelamento da dívida. |
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10º - Leve também algum documento oficial com foto para a conversa de renegociação, como o RG. Se estiver desempregado, é interessante levar a carteira profissional. |
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11º - No momento da renegociação, ouça a proposta que o atendente irá lhe apresentar e, caso você não esteja de acordo, apresente a sua contraproposta. Dica para reconhecer uma boa proposta: "Multiplique o valor da parcela pelo número total de parcelas: o resultado tem que ser menor que o valor original da dívida. Se for menor, é sinal de que a negociação começou a ficar boa", ensina o educador financeiro Mauro Calil. |
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12º - Ao fechar a renegociação, você deverá receber um novo contrato da sua nova dívida. A partir daí, o estabelecimento tem cinco dias úteis para pedir a retirada do seu nome do SPC/Serasa. Guarde o contrato novo como comprovante. |
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Fonte: Serasa, educadores financeiros Mauro Calil e Marcos Crivelaro; Gabriel Rodrigues Garcia, advogado especialista em superendividamento. |
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