O ministro do Esporte, Orlando Silva, deixou o cargo no início da noite desta quarta (26) após uma reunião de mais de uma hora com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto.
A saída de Orlando Silva é o resultado de quase duas semanas de desgaste político depois da divulgação da denúncia de que o ministro teria participação em um esquema de desvio de dinheiro público do Segundo Tempo, um programa do federal destinado a promover o esporte em comunidades carentes.
O próprio ministro fez o anúncio, em uma entrevista coletiva depois do encontro com a presidente. Silva, que tinha ao lado o presidente nacional do PC do B, Renato Rabelo, disse que examinou com Dilma a "crise" que, segundo afirmou, foi produzida com as denúncias sobre ele.
"Examinamos essa crise criada nos últimos dias, os ataques que sofri. Eu reafirmei para a presidenta que não há, não houve nem haverá quaisquer provas que me incriminem, diferentemente do que foi publicado em uma revista semanal. Fato nenhum houve que possa comprometer a minha honra, fato nenhum houve que possa comprometer a minha conduta ética", declarou.
Ao se dizer vítima de um "linchamento", reafirmou que a "verdade virá à tona". "Fui mais uma vez firme, indignado. Falei com a presidente da minha revolta com esse linchamento público que eu vivi, mas tranquilizei ela afirmando que em poucas semanas a verdade virá a tona e ficará claro para a sociedade brasileira que não há nada que possa me incriminar".
Sobre as denúncias de desvios do programa Segundo Tempo, Orlando Silva disse que as "ilações" "não têm comprovação prática e os erros identificados por nós no programa foram enfrentados". "Eu determinei a devolução do dinheiro público. Eu identifiquei o mal feito e eu agi para corrigir o mal feito", afirmou.
De acordo com o Palácio do Planalto, a exoneração, a pedido de Orlando Silva, será publicada no "Diário Oficial da União" nesta quinta-feira (27).
Na entrevista, ele explicou por que pediu a demissão. "Essa é uma decisão consciente que tomei, que a presidente apoiou por entender que, primeiro, eu posso me defender com mais ênfase a minha honra, que foi ferida sem nenhuma prova cabal", afirmou. "Saio com o sentimento do dever cumprido. A injustiça está em calúnias ganharem ar de veracidade."
PC do B
O presidente do PC do B, Renato Rabelo, disse que a decisão sobre o substituto de Orlando Silva "cabe à presidenta da República". "O que posso adiantar é o seguinte: a presidenta vai resolver isso logo", disse ao lado de Orlando Silva.
Segundo ele, o partido mantém "relação de grande intimidade e grande identidade" com o governo da presidente Dilma Rousseff. "Contribuímos para o êxito e a vitória de Lula em 2002 e em 2006 e agora da presidente Dilma, em 2010", declarou.
Rabelo afirmou que Orlando Silva é "honesto, competente, sincero, um jovem com grande capacidade". "Nada do que o acusam foi provado", disse.
Sobre o suposto beneficiamento do PC do B em convênios com a pasta, Rabelo disse que o partido não pode ser comprometido por causa de filiados. "O PCdoB gratuitamente é atingido sem nenhum prova porque, existindo um ou outro filiado do PCdoB em uma ONG ou outra querer caracterizar isso como benefício do PCdoB?", indagou.
A crise
A demissão do ministro se deu um dia depois do anúncio de que o Supremo Tribunal Federal autorizou a instauração de inquérito para investigar o ministro, a pedido da Procuradoria Geral da República.
No fim da tarde desta quarta, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, anunciou que Silva deixaria o comando da pasta e que a "tendência" é de que o ministério fique com o PC do B e de que haja uma solução de "interinidade", para que depois assuma um sucessor definitivo.
Silva foi acusado pelo policial militar João Dias Ferreira, em reportagem publicada pela revista "Veja" no domingo (16), de ter recebido um pacote com notas de R$ 50 e R$ 100 na garagem do ministério.
O ministro sempre negou participação no suposto esquema e afirmou que não há provas contra ele. Em audiência no Senado, disse que a denúncia era uma tentativa de tirá-lo à força do ministério. Também classificou a acusação como uma "reação" à cobrança de cerca de R$ 4 milhões de ONGs do policial por suspostas irregularidades em convênios.
João Dias foi preso no ano passado na Operação Shaolin, deflagrada pela Polícia Civil do DF para investigar fraudes no programa Segundo Tempo. As ONGs de João Dias, relacionadas ao kung-fu, são suspeitas de desviar verba de convênios assinados com o Ministério do Esporte.
A Controladoria-Geral da União pede a devolução de mais de R$ 4 milhões repassados pelo Ministério do Esporte a entidades de João Dias.
Outros ministros
Com a saída de Orlando Silva, são cinco os ministros que deixaram o governo sob denúncias de irregularidades após quase dez meses do mandato da presidente Dilma Rousseff.
Antes de Silva, pediram demissão Antonio Palocci (Casa Civil), por suposto enriquecimento ilícito; Alfredo Nascimento (Transportes), após suspeitas de superfaturamento em obras de rodovias; Wagner Rossi(Agricultura), que usou jatinho de uma empresa privada que tinha contratos com o ministério; e Pedro Novais (Turismo), após denúncias de irregularidades no uso de verbas oficiais quando exercia o mandato de deputado.
Nelson Jobim saiu da Defesa após a crise política motivada por declarações – que ele nega ter dado – de que as colegas de ministério Ideli Salvatti e Gleisi Hoffmann eram “fraquinhas”.
Perfil
Baiano de Salvador, Orlando Silva nasceu em 27 de maio de 1971 e chegou ao Ministério do Esporte em 2003. Por três anos, ocupou várias secretarias da pasta, então comandada por Agnelo Queiroz. Foi secretário Nacional de Esporte, secretário Nacional de Esporte Educacional e secretário-executivo do Ministério do Esporte. Com a saída de Agnelo para tentar uma vaga no Senado em 2006, ele assumiu o comando do ministério.
Desde então, Silva teve desafios como a realização dos Jogos Pan-Americanos de 2007, no Rio de Janeiro, e a candidatura vitoriosa do país na Copa do Mundo. Acompanhou também a disputa do Rio de Janeiro com Madri, Tóquio e Chicago para sediar as Olimpíadas de 2016.
Polêmicas também fizeram parte do currículo do ministro, como o escândalo dos cartões corporativos, em 2008, que resultou na saída da então ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro. Ele teria usado o cartão de crédito corporativo para a compra de uma tapioca no valor de R$ 8,30.
Na época, ele alegou que realizou o gasto por engano porque o cartão pessoal seria parecido com o corporativo, e decidiu devolver ao Tesouro Nacional mais de R$ 30 mil em despesas feitas em 2006 e 2007 no cartão corporativo.
Orlando Silva também foi presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), entidade que atualmente tem ex-dirigentes na cúpula do Ministério do Esporte.
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