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Nacional
Quinta - 29 de Setembro de 2011 às 23:32
Por: Leandro J. Nascimento

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"Eu fiquei muito apreensivo com medo das complicações". As palavras descrevem o sentimento do médico Ricardo Aleixo Rodrigues da Rocha no momento em que se submetia a um dos maiores testes de sua carreira: fazer o parto de um bebê em meio a um cenário atípico. A criança nasceu em um bimotor Bandeirantes C-95 C, da Força Aérea Brasileira (FAB), que estava na região da Serra do Cachimbo, na divisa de Mato Grosso e Pará, nos trabalhos de buscas às vítimas do acidente com o voo 1907 da Gol. No acidente aéreo entre o Boeing da Gol e um jato Legacy, ocorrido há exatos cinco anos, 154 pessoas morreram.

O ano de 2006 ficou marcado na memória de Ricardo Aleixo. Foi ele o médico responsável pelo nascimento de Fábio de Souza Oliveira, dentro do avião da FAB que transportava a gestante até a capital Cuiabá (MT) pouco tempo após a mulher chegar na base aérea da Serra do Cachimbo (PA), necessitando de cuidados médicos.

Graças a Deus foi um parto normal. A criança nasceu bem e sem complicações"
Ricardo Aleixo, médico que fez parto de bebê

Fábio nasceu em uma época em que o país vivia o clima da então maior tragédia da aviação civil brasileira: a queda do Boeing na região de mata fechada em Peixoto de Azevedo, no norte de Mato Grosso, e cuja sede do município localiza-se a 692 quilômetros de Cuiabá.

"Na base temos um posto médico e ele serve de apoio tanto para os militares que estão em treinamento quanto para a população que, de uma maneira em geral, está transitando por lá. Essa menina estava gestante e com a data do parto daquele dia. Era por volta da uma hora da manhã quando passaram o rádio dizendo que ela estava no ônibus e com dores", declarou Aleixo, em entrevista ao G1.

O avião da FAB decolou da mesma base para onde eram levados os corpos das vítimas que morreram no acidente aéreo e o mesmo ponto que servia como apoio logístico para todo efetivo mililitar que trabalhava no caso. O bimotor decolou por volta das 3h40 do dia 07 de outubro com direção a Cuiabá. Trinta minutos após deixar o solo, Fábio de Souza nasceu pesando 4,7 quilos.

Parto Bebê FAB Grande (Foto: Arquivo Pessoal)
Bebê nasceu dentro do avião Bandeirantes, durante o voo, pesando 4,7 quilos. (Foto: Arquivo Pessoal)



"Na situação que estávamos não era uma aeronave para realizar um procedimento [de parto]. Era um avião de transporte normal. Graças a Deus foi um parto normal. A criança nasceu bem e chorando. Eu fiquei muito apreensivo com medo das complicações", acrescentou o médico.

A celebração da vida em meio a um cenário de morte, segundo Aleixo, fez o momento ficar na história. "Foi inesquecível. São aqueles paradoxos que acontecem e mostram como é o ciclo da vida. Uns vão e outros vêm. Fiquei feliz em ajudar a trazer mais uma alma para este mundo", disse o médico, ao G1.

Parto Gol Fábio (Foto: Leandro J. Nascimento / G1) 
Fábio completa 5 anos em outubro.
(Foto: Leandro J. Nascimento / G1)



Depois do parto, mãe e filho tiveram um momento de reencontro. Foi na operação de volta montada pela Força Aérea para buscar Francisca Daiane dos Santos e Fábio de Souza Oliveira de Cuiabá e levá-los novamente para base no estado paraense. Quase cinco anos após o ocorrido, Ricardo Aleixo desligou-se do serviço militar.

Avião para pilotar
Para Flávio Presotti, o dia 07 de outubro também ficou na história. Com 23 anos à época, era ele o co-piloto do bimotor que viajava entre as cidades. Na aeronave, tripulantes e passageiros viviam a expectativa de um momento inédito. Cinco anos após o ocorrido, o oficial conta que os instantes que antecedram o voo foram de muita ansiedade para todos os que se envolveram na ocorrência.

A escolha de Cuiabá como destino ocorreu por uma questão meteorológica. "Fomos preparar a aeronave e checar as localidades mais próximas. Nisto, descobrimos que as cidades mais próximas não eram favoráveis ao pouso. Por isso foi escolhida Cuiabá", declarou o militar, em entrevista ao G1.

Seis militares estavam no Bandeirantes, além de Francisca Daiane dos Santos e a mãe dela, Raimunda. "Foi uma experiência marcante na vida. Até hoje lembro bastante a apreensão. Será que vai dar tudo certo? A torcida era para que sim. Não era uma coisa que vivenciamos todos os dias", acrescentou Flávio Presotti.

Militares Parto Bebê FAB (Foto: Arquivo Pessoal)
Militares que participaram do parto do bebê em avião entre Pará e Mato Grosso.
(Foto: Arquivo Pessoal Ricardo Aleixo)



À ocasião do episódio, Presotti foi escalado para trabalhar com o efetivo das Forças Armadas que se dedicava no resgate dos corpos das vítimas do avião no Norte de Mato Grosso, em 29 de setembro. Naquele ano, o militar fazia parte do sexto esquadrão de transporte aéreo. Sua missão era levar até a fazenda na região de Peixoto de Azevedo, a 692 quilômetros de Cuiabá, mantimentos e equipamentos para os militares que trabalhava na região.

Fábio Souza nasceu com 4,7 quilos dentro do avião antes mesmo que pudesse chegar a Cuiabá. A viagem duraria cerca de uma hora e quarenta minutos. Mas, aproximadamente 30 minutos após decolar, veio a notícia do nascimento. "Em torno de meia hora ou 40 minutos de voo, o mecânico do avião trouxe para nós a notícia que tinha nascido a criança e que todos estavam bem", salientou.

Piloto Flávio  (Foto: Fábio Monteiro Ribeiro)
Flávio participou do socorro à grávida: era co-piloto.
(Foto: Fábio Monteiro Ribeiro/Arquivo pessoal)



O nome do menino foi uma sugestão dos tripulantes do bimotor e uma homenagem aos profissionais da FAB envolvidos no socorro. "O nascimento do Fábio é algo que não dá para esquecer. Marcou bastante. E a gente vai acumulando um pouco mais de experiência e vemos que estamos cumprindo nosso trabalho", considerou o piloto. Hoje, com 28 anos, Flávio Presotti é instrutor de voo na Academia da Força Aérea Brasileira em Pirassununga, no interior de São Paulo.

Compartilhar experiência
Em sala de aula, a experiência vivenciada no ano de 2006 é retransmitida para os alunos. Presotti diz que esta é uma forma de contribuir com a formação dos oficiais. "Na instrução, o piloto tem que estar preparado para tudo. O ser humano tem que estar sujeito a viver com suas emoções para tomar as atitudes corretas em qualquer circunstâncias. Nos dias de hoje, procuro passar isso para os alunos, repassando algumas experiências", reforçou.





Fonte: Do G1 MT

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