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Economia
Terça - 30 de Agosto de 2011 às 13:08
Por: André Gonçalves

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Às vésperas da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que define a taxa de juros básica do país, o governo anunciou ontem que pretende economizar R$ 10 bilhões acima do previsto, elevando a meta de resultado das contas públicas deste ano para R$ 127,9 bilhões. O esforço será concentrado na União, que perseguirá um saldo positivo de R$ 91,8 bilhões, em vez dos R$ 81,8 bilhões fixados na Lei de Diretrizes Orçamen­tárias (LDO).

A medida abre espaço para cortar os juros, segundo informou a presidente Dilma Rousseff. O objetivo do governo é evitar que a atividade econômica do Brasil caia drasticamente, na esteira do que vem ocorrendo na Europa, nos Estados Unidos e no Japão. “Se vier uma situação pior para a economia brasileira, o Banco Central estará em condições de reagir com políticas monetárias mais expansionistas”, explicou o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Sem esforço

“Queremos que se faça mais política monetária e menos política fiscal”, disse ontem o ministro Guido Mantega. Ou seja: diferentemente do que foi feito em 2008 e 2009, a ordem agora é ativar a economia via corte de juros, e não pela redução nos impostos e aumento do gasto público.

A julgar pelos dados das contas públicas até julho, a medida anunciada ontem pelo governo não exigirá nenhum sacrifício. A arrecadação vem tendo um desempenho muito acima do esperado este ano. Só em junho e julho, ingressaram no caixa R$ 9 bilhões apenas com o recolhimento de atrasados após o início de operação do Refis da Crise. Graças à arrecadação forte, o setor público já alcançou, em sete meses, perto de 80% da meta para o ano.

PEC 300

Depois da Emenda 29, o alvo do governo no Congresso é a Proposta de Emenda à Constituição 300, que cria o piso nacional dos policiais e bombeiros militares. O texto começou a ser votado pelo plenário da Câmara no ano passado e voltou à agenda graças à pressão de entidades de representação dos policiais. “Não vejo clima para essa votação”, disse o deputado federal Cândido Vaccarezza (PT-SP), referindo-se ao pedido da presidente Dilma Rousseff para que a base aliada não vote matérias que signifiquem aumento de gastos públicos. (AG)

Análise

Se governo mantiver a política de cortar gastos e economizar nos próximos anos, as taxas de juros poderão cair pela metade, possibilitando que a economia do país cresça até 5% sem pressões inflacionárias. Por isso, o anúncio foi bem recebido por especialistas. “O superávit primário maior serve como argumento para dificultar o aumento do gasto corrente e ampliar a taxa de investimentos”, avalia o professor de Economia da Trevisan Escola de Negócios Alcides Leite.

No entanto, Leite ressalta que a eficácia dessa política depende do comprometimento do setor público em controlar seus gastos no longo prazo. “Se mantiver essa política nos próximos anos, a taxa de investimento pode atingir 25% do PIB e os juros poderão cair para um patamar entre 2% e 3% de taxa real ao ano [descontada a inflação]”.

Para o economista Carlos Magno Bittencourt, conselheiro do Corecon-PR, o governo escolheu o momento certo para criar um “colchão” e enfrentar os efeitos da crise externa, já que a arrecadação está favorável. “Na ‘marolinha do Lula’ [a crise internacional de 2008] o governo teve de desonerar alguns setores para aquecer a economia internamente. Desta vez, o governo quer trabalhar com a política monetária, reduzindo gastos para que lá na frente possa reduzir a taxa de juros e, com isso, manter a economia aquecida”, compara. Segundo ele, as medidas podem começar a surtir efeito dentro de seis meses.

O professor do Departa­mento de Economia da UFPR Luciano Nakabashi avalia que ainda é preciso tornar os ajustes mais objetivos. “Não ficou muito claro o que vai ser cortado. O governo fala em custeio, mas fica um pouco vago se ele não define onde vai cortar”, diz. Ainda assim, ele entende que o aumento da meta do superávit sinaliza a direção na qual o governo está indo, diminuindo a vulnerabilidade.

Emenda 29

Consenso entre partidos de governo e oposição no Congresso Nacional, o projeto de regulamentação da Emenda 29 entrou na mira dos cortes de despesas de Dilma. Após a formalização de um acordo para a votação do texto pelo plenário da Câmara dos Deputados no dia 28 de setembro, o Planalto decidiu frear os parlamentares. A promessa é apresentar uma proposta alternativa em outubro com medidas pontuais para aumentar os recursos para a saúde, incluindo o ressarcimento por parte das operadoras privadas pelos serviços prestados pela rede pública – que está sendo discutido também no Supremo Tribunal Federal – e a possível criação de uma “nova fonte” de financiamento.

Em vigor desde 2000, a Emenda 29 fixou porcentuais mínimos do orçamento que devem ser gastos com saúde pela União (10%), estados (12%) e municípios (15%). A aplicação efetiva das regras, porém, depende de uma lei complementar, que já foi aprovada pelo Senado. Na Câmara, a votação está emperrada desde 2008.

Embora não tenha falado abertamente sobre a adoção de um imposto nos moldes da extinta Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF), Dilma deixou clara a opinião de que o setor precisa de uma receita diferenciada durante a reunião de ontem do Conselho Político. No fim do encontro, o vice-presidente Michel Temer chegou a falar que o país precisaria de uma “Emenda 58”, com o dobro de alcance da proposta atual. Já o líder do governo na Câmara, Cândido Vacca­rezza (PT-SP), passou a defender a tese de que a regulamentação da Emenda 29 não significará mais dinheiro para a saúde.

Novo imposto

O deputado federal citou números apresentados por Dilma para defender a teoria. De 2008 para 2011, os gastos da União com saúde subiram de R$ 44,5 bilhões para R$ 62,4 bilhões. Ele admitiu, entretanto, que a verba não é suficiente e sinalizou o pensamento do governo. “Nós temos de ter uma fonte de financiamento para a saúde”, disse.

Segundo o petista, o debate sobre qual é a “melhor fonte” ocorrerá no Congresso. O caminho mais curto seria a criação da Contribuição Social para a Saúde (CSS). A proposta já está atrelada ao projeto de lei complementar em apreciação na Câmara. A CSS segue o modelo da CPMF, mas é menos onerosa ao contribuinte – a alíquota prevista é de 0,1% por movimentação financeira, contra 0,38% do antigo imposto do cheque.

A presidente Dilma Rousseff se esforçou para acalmar os ânimos de sindicalistas sobre as medidas econômicas, mas não conseguiu. Informados a respeito das decisões em reunião anterior à do Conselho Político, os dirigentes das principais centrais sindicais se manifestaram contrários ao aumento do superávit primário.

Eles vão manter uma manifestação marcada para hoje em frente ao Banco Central, em Brasília, pela diminuição da taxa de juros. Os protestos devem se estender até amanhã, quando o Conselho de Política Monetária pode anunciar mudanças na Selic, atualmente em 12,5% ao ano.

O presidente da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Wagner Gomes, disse que as mudanças no superávit foram “uma ducha de água fria”. Já o presidente da Central Única dos Traba­lha­dores (CUT), Arthur Henri­que da Silva Santos, falou que o único caminho seria baixar o que chamou de “criminosa” taxa de juros. Por último, o presidente da Central Geral dos Tra­balhadores do Brasil, Antonio Neto, argumentou que “o gasto público não precisa baixar quando a arrecadação está aumentando”.

Apesar de pressionada, em nenhum momento Dilma aceitou pressionar o Banco Central. A estratégia mencionada pela presidente durante a reunião do Conselho Político, segundo relato do líder do PDT na Câmara, Giovanni Queiroz, é proporcionar um ambiente seguro para a redução dos juros, mas sem interferir na autonomia da instituição. “Ela deixou claro a todos que a nossa situação é melhor do que durante a crise de 2008”, disse o parlamentar.






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