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Nacional
Sábado - 27 de Agosto de 2011 às 22:05
Por: Daniel Favero

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O caso das crianças que reagiram com violência à abordagem policial, promovendo quebra-quebra em delegacias e no Conselho Tutelar de São Paulo, e a prisão da gangue de meninas da Vila Mariana, são claros exemplos da deficiência das estruturas sócio-educativas que trabalham "fora da realidade" brasileira e não levam em consideração as mudanças geradas pelas drogas, principalmente o crack. Esta é análise feita pela secretária de nacional de Promoção dos Diretos da Criança e do Adolescente, Carmen Silveira de Oliveira, em entrevista concedida ao Terra.

Segundo Carmen, o sistema de atendimento existente trabalha de forma equivocada e ao invés de atrair as crianças para os abrigos, acabam por expulsá-las. "Quando se reclama que a criança não fica (nas instituições), não fica por causa da abordagem tradicional. Não fica quando se pega uma carrocinha, como se faz com cachorro, e sai recolhendo na rua", diz. Ela cita cidades que usam uma proposta mais convidativa com vans coloridas e malabaristas. "Se faz um convite para ir, não precisa ser "na marra". Precisamos rever os nossos procedimentos".

A secretária diz que suas constatações são feitas com base em uma pesquisa censitária sobre crianças e adolescentes em situação de rua, encomendada pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos, realizada no ano passado em 75 cidades brasileiras. O levantamento apontou que 24 mil crianças viviam nas ruas Brasil. Número que ela considera possível de se reverter.

Desse total, um terço tinha menos de 12 anos, 52% dormiam diariamente com a família e 18% estavam envolvidas com atividades ilícitas. A secretária diz que os números mostram que as crianças deixam suas casas por problemas familiares que englobam violência e abusos sexuais. "Não se trata só de procurar essa família, mas de procurar uma nova dinâmica do lar para receber de volta essa criança, porque senão ela volta para a rua, já que a violência sexual e física continua acontecendo".

Segundo o estudo, nos abrigos, as crianças reclamam de maus tratos, discriminação, excesso de rigidez e ócio, o que explicaria as repetidas fugas. "Você tem que criar uma rede de acolhimento que seja atrativa também, que tenha horários mais flexíveis, atividades mais atrativas para que a criança permaneça, porque a rua faz esta oferta. Existem instituições, as quais as crianças se referiram, que obrigam as crianças a tomar um banho frio de cara, a colocar um uniforme, de padronizar a conduta. Com esse tipo de criança, essa estratégia pode funcionar a médio ou longo prazo, mas não em um momento inicial".

Há dois meses o governo federal tem se reunido em uma "mesa de trabalho" composta por vários ministérios para bolar um plano de atendimento que leve em consideração também o uso de crack. O ponto de partida, segundo Carmen, é o reconhecimento de que a rede sócio-assistencial, a escolar e a de saúde têm falhas que devem ser corrigidas com novos dispositivos. A proposta deve ser apresentada aos ministros das pastas envolvidas até o final do mês de setembro, para que seja encaminhada à Presidência da República.

"Do ponto de vista do atendimento ao usuário de crack, estamos desenhando um novo serviço. Porque a desintoxicação no hospital geral não funciona para crianças e adolescentes em situação de rua, ela é muito rápida, não dá a porta de saída e a criança volta para a rua. As comunidades terapêuticas, que estão fora da rede pública, trabalham com uma lógica contra a qual temos algumas críticas, a rede de Caps (Centros de Atenção Psicossocial) possuem furos, porque não trabalham com crianças e adolescentes, embora trabalhem com álcool e drogas, os Caps da Infância e adolescência, já são o contrário, porque não trabalham com dependência química", diz. Ela adianta que a proposta será de um serviço novo, em formato de residência terapêutica temporária, onde seria realizado tratamento clínico, psicológico e psiquiátrico.

Segundo ela, caso a iniciativa seja levada adiante pelo governo, imagina-se que os ministérios devem abrir linhas de financiamento, e aos municípios, seria disponibilizado o pacote inteiro. "Temos uma convicção, não basta ter o residencial-terapêutico-transitório. Se não tiver a rede sócio-assistencial para fazer o acompanhamento familiar, não vai dar certo. Então, se trata do município aderir a um plano, a um protocolo de atendimento, e acreditamos que esse é o diferencial em relação a propostas feitas anteriormente".

Na atual conjuntura, segundo Carmen, é importante considerar que episódios como os ocorridos em São Paulo não podem ser sanados com medidas superficiais. "Antes havia todo um confronto com a sociedade sobre a redução da idade penal, agora, aparece outra lógica com as crianças infratoras que têm que ir o mais cedo possível para o sistema socio-educativo. Antes da família, dos Estados e da sociedade fazerem um mea culpa, daquilo que se naturalizou, nós vamos penalizar novamente a criança ou o adolescente? Aquele que teve todos seus direitos violados, não convive mais com a família, teve todos os seus direitos violados, que está fora da escola, que está sujeito a violência das ruas? Daí pegamos essa criança e aplicamos mais punição?", indaga.

Ela se mostra contra medidas mais duras contra essas crianças, como a possibilidades de proibir que saiam das instituições, que devem ser encaradas como um lar por esses menores. "Se o abrigo é atrativo, se a casa é atrativa, a criança não foge".





Fonte: Terra

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