Envolvida no mais novo escândalo de corrupção, a pasta que deveria promover atividades turísticas administra verba usada até para pavimentação e construção de pontes
Ministério do Turismo tem R$ 2,3 bi para obras neste ano
Dados do Orçamento da União mostram que o Ministério do Turismo, envolvido no mais novo escândalo de corrupção no governo federal, funciona em grande medida como um “ministério de obras” de vários tipos. Embora a função primordial da pasta seja promover o turismo, o programa de infraestrutura consome uma fatia considerável do dinheiro destinado ao ministério. Neste ano, foi previsto o uso de R$ 2,38 bilhões do ministério para obras. O orçamento total do ministério aprovado no Congresso foi de R$ 3,6 bilhões.
O Maranhão, estado de origem do atual ministro do Turismo, Pedro Novais (PMDB), é o mais beneficiado por convênios com a pasta neste ano, segundo a ONG Contas Abertas. Os convênios oficializados neste ano preveem o repasse de R$ 66 milhões para o estado, enquanto o Rio de Janeiro, um dos principais polos de turismo do país, teve convênios de apenas R$ 4,3 milhões. Ou seja: o Maranhão recebe um valor 1.450% maior do que o Rio.
Outro dado curioso: o Maranhão tem 42 convênios para obras de infraestrutura turística: 12 são para pavimentação asfáltica, 10 para construção ou reforma de praças públicas, nove para urbanização e um para construção de uma ponte no município de Barra do Corda. Os demais são destinados a pequenos restauros de centros turísticos.
Um convênio de R$ 20 milhões já assinado, por exemplo, irá financiar uma das principais promessas de campanha da aliada de Novais, a governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB): a Via Expressa de São Luís, que ligará duas avenidas da capital maranhense. A ligação mais forte entre a obra da Via Expressa e o turismo em São Luís é a intenção de Roseana inaugurar a nova avenida, de 5,3 quilômetros de extensão, no aniversário de 400 anos da cidade, em 8 de setembro do ano que vem.
A assessoria de imprensa do ministério diz que o valor não representa a realidade, já que o levantamento se refere a um período curto. E, segundo dados dos recursos já empenhados do programa de Infraestrutura, o Maranhão é apenas o 13.º em volume de verbas recebidas até o momento em 2011.
Sob pressão da base, ministro diz ter apoio de Dilma
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, reagiu às alegações de que ele sabia, com antecedência, da Operação Voucher, que investiga um esquema de desvio de dinheiro do Ministério do Turismo. “Eu, como ministro da Justiça, tenho o dever de cumprir a lei. Portanto, eu jamais poderia ser informado da operação previamente, sob pena de configuração de crime”, disse ele. Cardozo afirmou ainda que tem todo o apoio da presidente Dilma Rousseff, independentemente das reclamações dos partidos da base aliada do governo que têm filiados sob investigação da Polícia Federal.
O ministro vem sofrendo pressão por parte da base aliada, especialmente de parlamentares do PT e do PMDB, partidos que lotearam o Ministério do Turismo e que tiveram integrantes seus presos na Operação Voucher . A ação da PF levou à prisão de 36 pessoas, entre elas petistas e peemedebistas.
O valor para infraestrutura é gasto em obras de diversos tipos, como pavimentação, pontes e até melhorias em aeroportos. Segundo o ministério, o investimento é necessário para garantir o acesso a regiões turísticas do país. “Essa é uma condição fundamental para a qualidade dos produtos turísticos e dos serviços prestados pela iniciativa privada”, diz texto no site do ministério.
No ano passado, o Programa de Infraestrutura do Turismo foi aprovado com um valor ainda maior: R$ 2,7 bilhões, de um total de R$ 4,2 bilhões destinados à pasta. No entanto, nem toda a verba é usada. Neste ano, por exemplo, 84,4% das verbas estão contigenciadas devido à economia que a presidente Dilma Rousseff determinou em todo o governo. O dinheiro pode não ser liberado até o fim do ano.
Até o momento, apenas R$ 116 milhões foram empenhados para gastos em infraestrutura pelo Turismo. Desse total, segundo dados do próprio ministério, R$ 3,31 milhões foram destinados ao Paraná.
Superposição
Para o economista Gil Castello Branco, fundador da ONG Contas Abertas, especializada em acompanhar o orçamento dos órgãos públicos no país, o uso de verbas do Ministério do Turismo regularmente para obras de infraestrutura mostra um “desvio” de comportamento do governo federal. “Existe uma clara superposição dos ministérios que é difícil de explicar”, afirma.
De acordo com o economista, a existência de um programa bilionário de infraestrutura dentro da pasta de Turismo se deve provavelmente ao jogo político entre os partidos. Ou seja: para tornar o ministério mais “atraente” na hora de negociar a distribuição de pastas entre as legendas que compõem o governo, o ministério é inflado com novas verbas e novas atribuições que normalmente teriam de ser de outras pastas.
No atual governo, o ministério foi um dos seis oferecidos ao PMDB, principal partido de apoio ao governo petista. “Isso só mostra mais uma vez que a alocação de recursos orçamentários muitas vezes não é feita de acordo com o interesse público, mas sim de acordo com os interesses político-partidários”, afirma Castello Branco.
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