Sete mil mulheres agredidas; amarradas, amordaçadas, torturadas e ameaçadas
Uma violência muitas vezes invisível, escondida entre quatro paredes, mas os números são alarmantes. Mais de 40 mulheres de todas as idades são espancadas por dia em Cuiabá e Várzea Grande. Cada uma tem uma história. Um drama mais triste, violento e muitas vezes bizarros que o outro. "Fiquei em cárcere privado, amarrada e amordaçada trancada em casa por 12 horas ou mais. Depois eu ainda fui espancada, torturada e ameaçada de morte", conta Maria, de 39 anos. Foram 7.239 vítimas em 180 dias (seis meses). A violência, que em seis meses já é quase 100% maior do que todo o ano passado apenas na Grande Cuiabá.
Os crimes de ameaças de morte contra as mulheres, que em todo o ano passado registraram 2.237 ocorrências, este ano, em seis meses, os números dobraram para 2.364 na Cuiabá.
Em Várzea Grande a Polícia já registrou 831 ocorrências de crimes de ameaças de morte, contra 742 registros em todo o ano passado. Os números de Várzea Grande também já são mais que o dobro do ano passado em apenas seis meses.
“Fui casada por 20 anos. Nunca fui feliz, mas pelo menos eu era tratada como uma mulher. Meu ex-marido tinha apenas um grande defeito. Ele bebia muito e depois dos cinco primeiros anos de casada nós praticamente vivemos como irmãos, pois ele só chegava em casa bêbado e dormia. Foi assim até a separação”, conta a mulher que depois da separação iria passar por situações humilhantes e bizarras.
Ao arrumar um namorado 15 anos mais novo do que ela, Maria teve alguns dias de muita emoção, principalmente sexual, mas logo seus sonhos começaram a desmoronar, e o que era alegria e felicidade viraram pesadelo.
Maria conta que se assustou quando durante uma relação sexual que já começou violenta, pois foi jogada na cama e quase caiu do outro lado, o namorado ainda começou a bater em seu rosto durante o ato, terminando por enforcá-la.
“Tive que gritar para não ser assassinada”, conta Maria. Isso revoltou o namorado da mulher que, entre uma narrativa e outra, destaca: “Eu era feliz e não sabia”. Se você contar para alguém, principalmente para a Polícia o que vai acontecer, eu te mato e mato toda a tua família”, ameaçou o namorado de Maria.
Daquele dia em diante Maria ainda passou por momentos terríveis até conseguir fugir para fora do Estado. Passou um ano longe e agora voltou. Ao voltar, Maria pôde ver as duas filhas que tinham ficado com o pai e a sogra enquanto ela estava namorando e ainda teve que ficar fora.
“Fugi porque eu estava com vergonha de minha família, que não sabia que eu era espancada e humilhada todos os dias. Fugi principalmente porque eu sabia que iria morrer, pois numa das vezes ele me trancou no quarto. Me amarrou na cama e ainda amordaçou a minha boca com pano. Quase morri”, finaliza.
Maria, no entanto, faz parte de um grupo de cerca de 10% de mulheres que prefere tomar suas próprias providências. Elas não conseguem denunciar seus companheiros ou ex-companheiros, pai e irmão à Polícia. Motivo: vergonha.
Só que, esse número que no passado não muito distante chegou a quase 90% de mulheres que apanhavam, eram agredidas e não denunciavam, agora mudou. Quando os maridos eram flagrados pela Polícia, ou denunciados pela família, as mulheres compareciam à Polícia e retiravam a queixa-crime.
Anos atrás, a maioria das mulheres falava assim quando tinham que denunciar os maridos à Polícia: “Ruim com ele, pior sem ele”. “Ele é o pai dos meus filhos”. “Dependo do dinheiro dele”.
As mulheres que hoje são apontadas pela delegada Cláudia Lisita, titular da Delegacia Especializada de Defesa da Mulher (DEDM), como heroínas, já fizeram 1.626 denúncias de crimes de lesão corporal contra seus companheiros, maridos, ex-maridos, ex-companheiros, irmãos e até contra os próprios pais.
Outras 103 mulheres também denunciaram homens em crimes de maus tratos. Entre os sete crimes que mais registraram Boletins de Ocorrências (BOs), também estão 74 estupros; 92 estupros de vulneráveis; 23 atos obscenos e três homicídios apontado como o crime mais violento e covarde contra um ser humano.
A reportagem do Portal de Notícias 24 Horas News ainda entrevistou outras quatro mulheres vítimas de violência de homens. Casos, no entanto, bizarros, mas impublicáveis devidos seus conteúdos de violência, principalmente sexual.
Para a delegada Cláudia, os casos bizarros existem. São muitos, mas ela se reserva ao direito de não falar sobre, não apenas dos bizarros conforme a reportagem queria, mas sobre todos os casos de violência contra as mulheres.
As mulheres, a Polícia Feminina de Mato Grosso, apontada como a pioneira no combate à violência contra as mulheres, além das novas leis em vigor no País e os programas de divulgação e alerta, segundo a delegada Cláudia, são as responsáveis por uma mudança radical no comportamento e na nova visão das mulheres de Mato Grosso e de todo o país em relaçãao a seus direitos.
As novas mulheres brasileiras, que também influenciaram as mulheres do mundo, passaram a denunciar e a enfrentar de cara seus maridos, irmãos e até pais, mesmo sabendo corriam e correm o risco de morte.
“As coisas mudaram em favor da mulher, que passaram a confiar em si mesmas, na Polícia e na Justiça. Temos orgulho de falar sobre isso, e dizer que o e aumento nos números de boletins de ocorrências também significa que as mulheres estão denunciando mais e sem medo”, comenta a delegada Cláudia.
Falando até com uma cerca desenvoltura, pois ela não gosta muito de falar, a delegada Cláudia até se emocionou: “Fico triste quando uma mulher é agredida, principalmente quando ela é morta. Mas também me orgulho de saber que elas estão se libertando das garras de seus agressores. Fico feliz em saber que as mulheres do meu Estado e do meu País, e até do mundo estão avançando com passos firmes em direção a liberdade total”, desabafa a delegada da Mulher.
Comentários