Selinho entre uma aula e outra e mãos dadas no recreio: pode? Para educadores, proibir o namoro entre colegas não funciona, já que a escola é o principal meio de socialização entre os adolescentes, e as "ficadas" são inevitáveis. Porém, os profissionais afirmam que liberar demais também não dá certo. Diálogo e limites são a resposta.
"Parece mentira, mas estamos numa época em que vários tabus já foram superados, mas o namoro na escola ainda não", diz Maria Helena Vilela, presidente do Instituto Kaplan, que orienta escolas públicas e particulares na educação sexual dos alunos. Segundo Maria, a maioria das escolas proíbe o namoro nas imediações do colégio, mesmo assim as "ficadas" continuam acontecendo nos ambientes de estudo. "As coordenações dizem que proíbem o namoro, mas não avisam os alunos. Eles nunca conversam com os estudantes sobre isso. Então, eles acabam fazendo o que querem", explica.
Escolas punem sem ensinar
Maria conta que, mais de uma vez, presenciou alunos se beijando na escola e, em seguida, recebendo suspensão da direção escolar. "Eles ficam sem saber por que estão sendo punidos. Ou seja, a escola só toma uma atitude em relação a isso quando um fato acontece. Punem sem ensinar", afirma. Para ela, o diálogo e o estabelecimento de limites são as únicas respostas possíveis. "Também não dá para liberar demais, os adolescentes ainda não estão prontos para saberem sozinhos até onde podem ir com os carinhos em público".
O coordenador pedagógico de uma escola pública da Bahia, Silvano Sulzart, afirma que a conversa entre a instituição e os alunos aconteceu de forma aberta. Segundo ele, a direção deixou claro que o namoro era proibido em ambiente de estudo, pois isso poderia desviar o foco do conteúdo ensinado. "Alguns jovens não estão preparados para conciliar namoro e estudo, e acabam canalizando todo o foco para a pessoa com quem estão ficando", conta.
A gente matava aula para poder namorar
Felipe Malbergir, 18 anos, começou a namorar Bruna Guidoni, também 18, quando ambos tinham 15 anos e dividiam a sala de aula do primeiro ano do ensino médio em um colégio de São Paulo. Malbergir, que se formou no terceirão no ano passado, conta que, durante três anos, o inspetor da escola era a "pedra no sapato" do casal. "Podia namorar no recreio, mas não muito. Quando a gente começava a se beijar demais, o inspetor chamava nossa atenção", diz. Hoje, já estudante de um cursinho pré-vestibular, ele reconhece que o namoro atrapalhou um pouco os estudos sim. "A gente matava aula pra poder namorar", diverte-se.
Apesar disso, Sulzart, que também atua como professor de pedagogia na Universidade Estadual da Bahia (Uneb), não acha que a proibição seja a melhor saída. "É comprovado: tudo que é proibido os alunos sentem mais vontade de fazer, e eles fazem. Começam a se beijar escondido, por exemplo. Na minha opinião, deve existir uma liberação moderada, mas o colégio deve deixar claro para o aluno que beijo não pode, mas andar de mãos dadas sim, por exemplo", diz.
Maria concorda. Para ela, a proibição também é um desvio de foco, uma vez que os alunos podem começar a pensar em formas de burlar as regras, como o exemplo de Felipe e Bruna que matavam aula para namorar. Porém, a liberação sem limites, diz, atrapalha os estudos. "Se os alunos ficarem abraçados e se beijando durante a aula, por exemplo, eles obviamente não estarão concentrados, e inclusive vão estar desviando o foco dos outros colegas", observa.
Namoro pode melhorar notas
A pedagoga explica que o ideal é conversar com os estudantes que já estão em fase de namoro e explicar que trocas de afeto só podem acontecer no intervalo e de forma moderada. "Isso é saudável e pode ajudar os alunos a se sentirem mais estimulados. Os jovens têm o costume de querer ajudar a pessoa que gostam e se mostrarem inteligentes, as notas podem melhorar", afirma.
Ou seja, se os limites estão claros para os adolescentes, defende Maria, é possível que o namoro contribua para os estudos. É o que acontece com Vitória Cardoso e Gustavo Gazzola, ambos com 16 anos. A menina passou a ajudá-lo assim que o namoro começou. Segundo a porto-alegrense, que está no segundo ano do Ensino Médio, Gustavo é um pouco desorganizado, e a relação entre os dois fez com que pudessem estudar e fazer trabalhos juntos. "Um ajuda o outro, é bem legal", diz, contando que, durante as aulas, os dois não sentam perto um do outro para não se distraírem. "No recreio, ficamos juntos, mas nunca nos beijamos ou nos abraçamos demais. A escola não deixa, e nós também não achamos legal. Tem crianças mais novas que ainda não sabem lidar com isso", conta.
Pedidos de namoro na sala de aula viram hit no Youtube
Ao colocar as palavras pedido, namoro e colégio na ferramenta de busca do Youtube, mais de 1,7 mil vídeos aparecem. Pedir alguém em namoro na sala de aula, registrar o momento e depois postar online para que todos os amigos possam ver virou moda entre os adolescentes.
Entre as tantas opções, alguns se destacam com recorde de views, chegando a atingir mais de 30 mil exibições. Em um deles, um estudante vai para a frente da sala apresentar um trabalho de artes no Power Point. No primeiro slide, quatro palavras vão tomando conta do projetor aos poucos: "Bianca, quer namorar comigo?". A turma inteira grita e Bianca vai para a frente da sala para aceitar o pedido e abraçar o novo namorado. Quando os dois começam a se beijar, logo se escuta um "psiu" da professora. "Deu, né?", diz ela no vídeo.
Mariana Senabio, 17 anos, postou na internet um vídeo de quase cinco minutos no qual aparece homenageando o namorado, Fabrício Alcaras, da mesma idade, no recreio do colégio Adalgisa de Barros, em Várzea Grande (MT). "Eu li 17 páginas de uma carta de amor que fiz para ele no meio do recreio. Queria fazer uma homenagem no dia do aniversário dele. Todo mundo parou para ver. Os professores adoraram, e ele também, apesar de ter sentido vergonha", conta a menina.
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