Regras para concessão de emissoras devem mudar para inibir participação de lideranças políticas nos quadros societários
Políticos são donos de 15% das rádios no PR
Domínio compromete jogo eleitoral
Mais do que qualquer outro tipo de empresa, as rádios são instrumentos valiosos na mão de políticos. De acordo com o cientista político Elve Cenci, da Universidade Estadual de Londrina, o veículo permite que o político esteja em contato permanente com seus eleitores. “O uso da rádio dá acesso direto ao eleitor em seu cotidiano”. Para ele, a concorrência entre donos de rádio e outros candidatos chega a ser desleal.
Para o cientista político Luiz Domingos Costa, da Uninter, ser proprietário de uma rádio permite ao político definir os principais assuntos a serem discutidos por uma determinada sociedade, além de dar uma alta capacidade de exposição a seu dono. “Há uma espécie de simbiose entre instrumentos de comunicação e a carreira parlamentar. São trampolins que permitem ao político pular etapas na carreira”, comenta.
De acordo com Costa, uma forma de reduzir esse fenômeno seria uma política mais clara de concessões, por parte do governo federal. “Atualmente, elas são muito baseadas em barganhas político-eleitorais. São necessários critérios mais claros e mais republicanos”.
Chico Marés
Temos que separar o sistema de radiodifusão do sistema político
O ministro das Comunicações, o paranaense Paulo Bernardo (PT), considerou alto o índice de 15% de emissoras de rádio no Paraná que tem entre os sócios políticos e parentes. Em entrevista à Gazeta do Povo, Bernardo disse desconhecer os números do estado e considerou necessária uma mudança na legislação para resolver esse problema e impedir que veículos de comunicação sejam usados para desequilibrar disputas eleitorais em todo o país.
O levantamento foi feito a partir do cruzamento da relação de rádios registradas no ministério com a listagem dos donos e sócios dessas emissoras. As duas relações estão disponíveis no site do Ministério das Comunicações. O resultado impressionou o ministro Paulo Bernardo (PT), que comanda a pasta. “Não tinha ideia nenhuma desses números. [15%] é bastante. Deveríamos separar claramente sistema de radiodifusão e sistema político. Mas, mesmo que haja fiscalização e legislação eleitoral para proibir, acaba havendo interferência político-eleitoral nos veículos [rádios], o que eu acho muito ruim porque desequilibra o jogo na eleição”, disse o ministro, que está à frente de um projeto de mudanças nas regras no sistema de concessão de rádios e televisão.
Pela legislação, o político pode ser sócio de uma rádio ou televisão, mas não pode exercer cargo de diretor. A limitação é justamente para impedir que essas emissoras sejam usadas para desequilibrar as disputas eleitorais. Apesar da proibição, a falta de fiscalização aliada a regras permissivas e a presença de parentes de políticos como administradores acaba por transformar o veículo de comunicação numa potencial máquina de fazer votos.
Em algumas cidades do interior, todas as rádios estão nas mãos de políticos. De acordo com o cadastro dos donos de rádio, a cidade de Ivaiporã tem três emissoras: a Uba Limitada, a Ivaiporã FM e a Rádio e Televisão Rotioner. A Uba tem entre os sócios o ex-governador Orlando Pessuti (PMDB). Regina Fischer Pessuti, mulher do ex-governador, é sócia da Ivaiporã FM e a Rotioner tem entre os proprietários Paula Pimentel e Luiz Guilherme Gomes Mussi. Ela, desde 2008, é mulher do deputado estadual Alexandre Curi (PMDB) e ele, sogro de Curi e suplente do senador Roberto Requião (PMDB). Além deles, o pai de Alexandre Curi, Aníbal Khury Júnior, é um dos donos da Rádio Poema, no município de Pitanga.
Situação semelhante acontece na cidade de Guarapuava. Com pouco mais de 167 mil habitantes e 117 mil eleitores, duas tradicionais famílias políticas disputam os ouvintes. De um lado está o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado Artagão de Mattos Leão, pai do deputado estadual Artagão de Mattos Leão Júnior. Do outro, o prefeito Luiz Fernando Ribas Carli. A família Leão é dona da rádio Difusora Guarapuava e da Emissora Atalaia. O próprio conselheiro do TC aparece no quadro societário da Difusora. A outra emissora tem como sócia a psicóloga Cleri Becher de Mattos Leão, mulher do conselheiro.
Ribas Carli e a primeira dama do município, Ana Rita Slaviero Guimarães Carli, são sócios da rádio Guairacá de Guarapuava. Os dois são pais do ex-deputado Luiz Fernando Ribas Carli Filho, que renunciou ao mandato de deputado estadual depois de se envolver num acidente de trânsito que terminou com a morte de duas pessoas; e de Bernardo Carli, que assumiu uma cadeira na Assembleia com a licença do deputado Osmar Bertoldi (DEM).
Em Maringá, a lista de donos de emissoras de rádio confirma a força e o poder político da família do secretário estadual da Indústria, do Comércio e Assuntos do Mercosul Ricardo Barros (PP). Ele é um dos donos da rádio Nova Ingá, ao lado do ex-deputado federal Benedito Cláudio Pinga Fogo de Oliveira. A rádio Difusora de Maringá tem entre os proprietários a deputada federal Cida Borghetti, mulher de Barros, e Gilberto Braz Palma, que é filho do ex-deputado estadual Divanir Braz Palma. O prefeito de Maringá é Silvio Barros, irmão do secretário.
Exemplos de familiares de políticos e dos próprios parlamentares à frente de emissoras de rádio também são comuns em outros estados. Há duas semanas, reportagem do jornal Folha de São Paulo mostrou que 56 deputados e senadores são sócios ou têm parentes no controle de emissoras de rádio.
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