Aeronautas respondem a colunista Eduardo Tessler
O Sindicato Nacional dos Aeronautas vem a público manifestar sua contrariedade e indignação frente ao artigo publicado pelo colunista Eduardo Tessler no portal Terra Magazine, em 4 de maio. Intitulado "Os caroneiros dos ares", o artigo transforma em privilégio uma situação prevista e garantida em lei (o transporte gratuito dos aeronautas quando não estão em serviço no voo), e relata um descontentamento pessoal de forma preconceituosa e ofensiva.
Se fosse uma obra literária ficcional e fosse a fala de um personagem grosseiro e amargo, talvez o texto não ofendesse tanto a categoria. Mas como não é, e sim um artigo que pretende descrever a realidade, é essencial que seja oportunizada uma retratação aos aeronautas, uma vez que, mesmo sendo um artigo de opinião, ele não faz juz a verdade e, por isso, publicita uma ideia que precisa ser corrigida, sob pena de a população que lê essa coluna considerar equivocadamente essas afirmações como corretas, prejudicando assim toda uma categoria de trabalhadores.
O texto recebeu mais de 600 comentários. Os aeronautas estão chocados, indignados, aviltados com o artigo publicado pelo jornalista.
Aquele que ele chama caroneiro é na verdade tripulante extra do voo, condição garantida no item 65 da Convenção Coletiva de Trabalho, firmada há décadas entre o Sindicato Nacional dos Aeronautas e o Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias, e na regulamentação profissional do aeronauta (Lei 7.183/1984). O aeronauta, pela norma, tem direito a assento na cabine de passageiros para viajar, desde que haja disponibilidade de lugar, e aí incluem-se muitos trabalhadores que estão voltando para casa depois de vários dias de longas jornadas de até 11 horas de trabalho.
Na maioria das vezes, esses tripulantes extras também estão indo assumir voos em outras localidades, por ordem da companhia, conforme prevê a regulamentação profissional.
O que o autor chama de superlotação da aeronave é, na verdade, uma alta taxa de ocupação dos assentos, um reflexo do crescimento do país e da inclusão das camadas mais populares no transporte aéreo. Ela é excelente para o setor: reduz o valor das passagens e democratiza mais ainda o transporte aéreo para os brasileiros.
Nenhum avião decola com mais passageiros que a capacidade da aeronave e os passageiros pagantes são sempre priorizados, o que demonstra mais uma leviandade no texto do autor da coluna. Não há mágica: se aeronautas ingressaram como tripulação extra no voo é porque havia assentos disponíveis.
O overbooking é uma prática lesiva ao consumidor e ocorre quando as empresas vendem mais bilhetes do que o número de assentos disponível, e não precisa ser especialista na área para perceber que não são nem pilotos, nem comissários, que efetuam essas vendas.
Já as enormes filas nos aeroportos são um problema de fato: o próprio Ipea em recente relatório afirmou que a maioria dos grandes aeroportos extrapolaram sua capacidade de atendimento a passageiros. Um problema, no entanto, da alçada da Anac, Infraero, governo; não dos aeronautas. Os tripulantes se comportam exatamente como regem as normas da aviação e das empresas: após os passageiros serem embarcados, conforme o número de assentos disponíveis no voo.
Formar filas, na cultura ocidental, ao que sabemos, é uma questão de educação e cordialidade. Crianças, idosos, portadores de deficiências, gestantes têm prioridade, diz a boa educação e a lei. Já o mercado privilegia também os mais afortunados, da classe executiva, dos cartões de crédito classe A.
Nenhum problema quanto à prosa do colunista, ao seu relato sobre um dia cansativo em que teve que pegar um voo lotado para voltar para casa, ou ir trabalhar. Não fosse o desrespeito aos aeronautas, que não são caroneiros, não estão lá para tirar o lugar do passageiro pagante, não lhe privaram do assento no corredor. Nenhuma mágica, tampouco. E muito menos uma praga.
O escárnio do autor vai tomando corpo e o "nobre" jornalista, então, relata uma situação prosaica que poderia acontecer com qualquer pessoa sentada ao lado de outra que tem um conhecido no mesmo avião e gosta de bebida alcoólica. Mas essa pessoa, é claro, é um "caroneiro gordo e risonho" - um aeronauta, um co-piloto - amigo de um comissário. Assim, ele conclui que voar perdeu o glamour e que, em função dos aeronautas, voar é ainda pior. Ou seja, para o jornalista, os aeronautas são caroneiros (voam de graça indevidamente), gordos e risonhos, bêbados, barulhentos e atrasam os voos. Qualquer trabalhador de qualquer profissão que fosse assim classificado ficaria revoltado com essas colocações.
Apesar de nenhuma retratação atender de fato ao sentimento de injúria provocado por esse artigo, a mesma é fundamental para tornar público o direito desses trabalhadores de voarem nas aeronaves que não estiverem tripulando, sem sofrer constrangimentos, e esclarecer sua condição como profissionais, sua dignidade e função. E para pedir desculpas públicas pela atitude preconceituosa do autor da coluna com os aeronautas e com os passageiros. Porque ele registrou sua revolta com a lotação dos aviões, deixando subentendido que preferia uma outra época em que somente pessoas abastadas ou privilegiadas podiam voar, de modo que ele usa os comissários e co-pilotos como bode expiatório para achincalhar todos os passageiros modestos, as pessoas gordas ou risonhas.
A atitude difamatória é muito expressiva e fere a dignidade e a reputação de uma categoria inteira. Não fosse isso, o texto não teria tido tamanha repercussão.
Segundo o art. 3º da Constituição Federal, em seu item IV, cabe ao País promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Da mesma forma, cabe ao jornalista respeitar esse princípio.
O Sindicato Nacional dos Aeronautas espera que a equipe de jornalismo do Portal Terra, do Terra Magazine e o editor Bob Fernandes estejam cientes desses fatos e argumentos e atendam ao anseio dos aeronautas, dando-lhes retratação com mesmo destaque e espaço da coluna mencionada.
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