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Sábado - 07 de Maio de 2011 às 07:49

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"Domingo pede cachimbo", ensina o ditado aprendido no tempo em que na Bahia se amarrava cachorro com linguiça, segundo os versos inspirados de Gilberto Gil em "Ladeira da Preguiça". Alérgico a fumaça, dispenso o conselho. Viciado em jornalismo, prefiro ligar a televisão para esperar o sono na quase madrugada, mas ainda a tempo de receber impacto demolidor de uma das mais aguardadas notícias em quase uma década: "O terrorista Osama Bin Laden está morto".

Agora vamos por partes, que o caso é mesmo de causar insônia das brabas ainda por muito tempo e requer cuidados especiais no tratamento factual e opinativo.

No passado domingo, já na cama, peguei no controle remoto e sintonizei no canal privado "Globo News". No horário, o jornalista Lucas Mendes comandava de Nova Iorque a sua equipe internacional no programa "Manhattan Connection", transmitido de um estúdio com vista espetacular para o espaço onde antes se erguiam imponentes um dos principais cartões postais da "Big Apple": as Torres Gêmeas" (lembra o apresentador, apontando com visível deslumbre para o novo esqueleto das torres em reconstrução diante de seus olhos), destruídas pelo mais medonho, incrível e espetacular ataque terrorista de 11 de setembro, prestes a completar uma década.

"Manhattan Connection", como se sabe, é uma fonte semanal sempre borbulhante de notícias, opiniões, polêmicas e arrelias desde a origem, no tempo do jornalista Paulo Francis, seu histórico e mais brilhante participante. Dá para esperar quase tudo e sempre algo provocador, a exemplo do que aconteceu há poucas semanas, quando Caio Blinder, em geral um dos mais recatados e ponderados participantes da mesa de Lucas em NY, resolveu chamar a rainha Rania, da Jordânia, de "piranha".

Confesso que esperava domingo passado algum novo desdobramento do caso, que resultou em grave entrevero diplomático, desde que o governo jordaniano, através de seus representantes em Brasília, segue fazendo carga e sérios reparos éticos e profissionais à condução do programa do canal brasileiro de TV.

Sabe-se que o Rei da Jordânia ainda aguarda pedidos de desculpas formais e oficiais pelas ofensas à rainha, por considerar insuficiente o mero reconhecimento do erro ou da "falha nossa", como já feito no programa seguinte por Blinder e Lucas Mendes.

Manhattan Connection é um exitoso e prolongado "cult" da televisão brasileira. Amado irrestritamente pela intelectualidade de classe média, mas odiado até o fundo da alma pela poderosa turma da "esquerda do povão". Domingo, porém, o programa caminhava inseguro sobre palafitas.

Mas seus participantes se esforçavam para segurar a fama e manter a tradição. A impressão era de um programa tocado "por aqueles jornalistas boêmios e fumantes inveterados, de instinto implacável, que povoavam as redações há poucas décadas".

As aspas são do livro "Periodismo de calidad: debates y desafios", que traz vários textos de destacados profissionais de imprensa da América Latina, que descobri em uma livraria na mais recente visita a Buenos Aires. Desconheço se existe edição em português, mas o recomendo com ênfase, mais ainda nesta estranha e confusa quadra do jornalismo brasileiro e mundial.

Tendo como universo de análise as redações, o livro assinala que toda redação se debate hoje entre duas forças, que para efeito de identificação são chamadas de "os clássicos" e os "modernos". Os clássicos são aqueles boêmios, e acreditam que o talento do jornalista de sangue puro e tradição é suficiente para manter aceso o fogo sagrado do ofício. Os modernos acreditam que a tecnologia e o mercado chegaram para aumentar e melhorar exponencialmente o exercício da profissão.

Da teoria para a prática: de frente para o sitio das antigas Torres Gêmeas, a bancada do Manhattan Connection discutia já na quase meia noite de domingo, a qualidade e perfeição do caimento das camisas sociais vendidas em certa loja bacana de Nova Iorque.

De repente, não mais que de repente, o corte brusco que tira do ar o programa comandado por Lucas Mendes. A imagem voa do estúdio na Big Apple para a redação brasileira onde está instalado o comando da Globo News. Aparece então o jovem repórter com a bomba em forma de notícia: "O terrorista Osama Bin Laden está morto", diz o âncora do horário, sem esquecer de dar o devido crédito pela informação à CNN americana.

Depois é o que se sabe pela repercussão transcendente de um fato jornalístico de tirar o sono e o fôlego, com poder de fogo ainda para muito tempo e desdobramentos ainda imprevisíveis e cercados de dúvidas.

Quanto ao Manhattan Connection, não mais voltou ao ar domingo passado. Mas, como dizia aquele prefeito baiano na publicidade de TV sobre seu município: "Domingo que vem tem mais".





Fonte: Terra

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