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Opinião
Domingo - 15 de Dezembro de 2024 às 00:24
Por: Juacy da Silva

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“De acordo com a CNBB, “Pastoral é a ação da Igreja Católica no mundo ou o conjunto de atividades pelas quais a Igreja realiza sua missão de continuar a ação de Jesus Cristo Ressuscitado, junto aos diferentes grupos e realidades”.

Neste sentido, podemos dizer que a Pastoral da Ecologia Integral é o conjunto de ações integradas, formalmente estruturadas, que a Igreja Católica e as demais Igrejas e religiões utilizam em sua missão evangelizadora, para enfrentar os desafios das relações dos seres humanos com a natureza, da qual fazem parte, combatendo a crise socioambiental que se abate, destroi e degrada a CASA COMUM.

Estamos no limiar de mais uma Campanha da Fraternidade que, em 2025, vai ocorrer entre os dias 05 de Março (quarta feira de cinzas) e 13 de Abril (Domingos de Ramos), quando tanto católicos quanto os demais cristãos são chamados a uma conversão, um período de reflexão mais profunda em relação `a nossa forma de vida e as nossas relações com Deus, com o nosso próximo e, também, nossas relações com a natureza.

Cremos que a Pastoral da Ecologia integral (PEI) é um mecanismo, um instrumento ou uma forma da Igreja demonstrar sua responsabilidade e papel em relação `a Ecologia Integral, que nos convoca a termos um melhor cuidado com a Casa Comum, razões mais do que suficientes para que, ao aplicar o método da Igreja: Ver, Julgar e Agir, possamos demonstrar que somos capazes de promover ações sociotransformadoras, que não sendo meramente episódicas, temporárias, mas duradouras e que, juntamente com a Mobilização profética possamos romper a cadeia de destruição, sofrimento e morte sobre a qual estão embasados sistemas econômicos injustos e predatórios, como enfatiza o Papa Francisco, uma “economia da morte”., que é precisa ser substituida por uma “Economia da Vida”, solidária, justa e realmente sustentável.


Em relação `as Pastorais da Ecologia Integral devemos destacar alguns aspectos importantes para a sua plena organização e funcionamento, o papel e a importância da formação de Agentes de Pastoral (Leigas e Leigos) e das Equipes, núcleos ou Grupos Ecológicos Paroquiais.

A defesa da Ecologia Integral, fruto também da ação da PEI, conforme a Coordenação Mundial do Movimento Lautado Si, está ancorada em três fundamentos: 1) Espiritualidade ecológica; 2) Ações de sustentabilidade sociotransformadoras e, 3) Mobilização Profética.

A Pastoral da Ecologia Integral está inserida no contexto da Ação Sociotransformadora. “Conhecida como a Comissão 8 da CNBB, a Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Social Transformadora está em um constante processo de renovação sem contudo perder sua essência: ser um instrumento de transformação da realidade à luz da palavra de Deus e das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora (DGAE) na promoção da pessoa humana em sua dignidade intríseca e da comunidade. É neste contexto que a PEI está inserida, cujo objetivo é ser presença solidária da Igreja junto às pessoas e situações onde a dignidade e a vida são negadas ou ameaçadas.

De acordo com Dom Guilherme Werlang, seguindo o caminho de Cristo, estas pastorais expressam o amor preferencial de Deus pelos mais humildes e pobres epelas obras da Criação.

Parte desta reflexão decorre de nossa experiência no processo de implantação, organização da Pastoral da Ecologia Integral na Arquidiocese de Cuiabá. Cabe ressaltar que este foi e ainda está sendo um processo lento, que podemos dizer seja a fase da semeadura, considerando também que “a messe e grande e os trabalhadores são poucos. Rogai, pois ao Senhor da Messe que envie mais trabalhadores para a sua Seara”. Evangelho de São Mateus, 9:38. Este é o princípio para a Conversão Ecológica individual e, principalmente, comunitária, para estimular a participação efetiva de Leigos e Leigas nas atividades deste Pastoral, foco do qual não perder jamais.

Assim depois de quase três anos de um despertar ecológico, bem lento, a PEI foi estruturada/organizada no âmbito da Arquidiocese de Cuiabá, a primeira em toda a região Centro Oeste do Brasil, por incrível que pareça, quando em 2025 vamos comemorar, celebrar dez anos da publicação da Encíclica Laudato Si, pelo Papa Francisco, ainda uma “ilustre desconhecida” ate mesmo entre católicos e demais cristãos.

Logo no início das primeiras reuniões, enfrentamos o desafio do isolamento social em decorrência da pandemia da COVID-19, que impedia reuniões presenciais e ações mais efetivas, além do fato de que Dom Milton, Arcebispo de nossa Arquidiocese havia renunciado e a Arquidiocese estava aguardando a designação do novo Arcebispo, o que também dificultava nossas ações.

Mesmo assim, conseguimos realizar diversas reuniões e um seminário de formação, com duração de uma semana, no formalto virtual, agregando pessoas, algumas das quais acabaram “ficando” pelo caminho. Isto possibilitou constituirmos um grupo de pessoas comprometidas com o enfrentamento dos desafios socioambientais e algumas ações de Mobilização Profética, na dimensão ecumênica e inter-religiosa.

Dom Mario Antônio foi nomeado Arcebispo da Arquidiocese de Cuiabá, pelo Papa Francisco, em 23 de Fevereiro de 2022 e tomou posse canônica no dia 01 de Mario de 2022.

Com a chegada do novo Arcebispo a PEI foi finalmente estruturada e realizada a missa de envio em 17 Setembro de 2022, garantindo, pelo menos formalmente, o reconhecimento da mesma na vida pastoral da nossa Arquidiocese.

Desde então ou melhor, antes da PEI ter sido estruturada formalmente, participamos de uma MOBILIZAÇÃO PROFÉTICA, juntamente com pessoas e grupos de outras Igrejas e Religiões, no enfrentamento para barrar a possibilidade de construção de seis barragens no Rio Cuiabá, o que iria e irá prejudicar o Pantanal, pescadores, ribeirinhos e populações tradicionais e povos indígenas.

Após a organização da PEI realizamos dois cursos de formação, visando preparas agentes/quadros para atuarem na pastoral e podermos implantar as ações sociotransformadoras nas 33 Paróquias que integram a Arquidiocesse de Cuiabá.

Além disso, realizamos visitas a diversas Paróquias dialogando com os vigários, tentando criar pontes para o avanço da caminhada ecológica em todas as paróquias, alem de palestra sobre Ecologia Integral em uma Escola Católica de Cuiabá, o CEMA.

Outra ação com o objetivo de fortalecer a PEI foi a realização de um Retiro Espiritual, conduzido por dois sacerdotes Jesuitas e pelo nosso Orientador Esperitual, Pe. Deusdédit, em uma chácara dos Jesuitas, no Distrito do Aguaçu, em Cuiabá.

Após a realização do segundo curso de Formação, alguns participantes do mesmo conseguiram formar um núcleo ecológico paroquial, em algumas comunidades da Paróquia do Rosário e São Benedito.

Este núcleo ecológico paroquial, que conta com o apoio do Vigário da Paróquia, ja se organizou, criou uma coordenação e, utilizando o método VER, JULGAR E AGIR, já definiu tres projetos para serem executados em 2025: Plantas medicinais, reciclagem e aroborização nas proximidades dos templos (comunidades eclesiais), demonstrando que irão avançar na caminhada.

Desde o início dos trabalhos tem sido enfatizada a idéia de que a realização de ações da PEI não podem ocorrer sem planejamento, participação, transparência seguindo um processo democrático em relação ao que fazer, onde fazer, quando fazer, porque fazer, duração/continuidade e que tais ações devem estar fundadas no método da Igreja: VER, JULGAR, AGIR e CELEBRAR

Resumindo, sem planejamento, sem participação das Equipes locais (Paroquiais e das Comunidades), as ações não dão resultados a médio e longo prazo e nem atendem aos princípios que embasam as Pastorais Sociotransformadoras. A PEI não pode ser mais uma “pastoral de caixinha”, do “eu sozinho/sozinha” e nem fruto de um ativismo imediatista, mas sim uma Pastoral de Conjunto, transversal, integradora, ou seja, sua atuação deve ser em articulação com as demais pastorais, movimentos e organismos da Igreja.

A prioridade fundamental na vida da PEI, principalmente em seu início, mas também ao longo de seu existir, é a FORMAÇÃO DE AGENTES DE PASTORAL, para que sejam formadas as Equipes Paroquiais e ou nas Comunidades, para que, possa ser feito um “diagnóstico” da realidade socioambiental do território paroquial (VER); a Equipe paroquial da PEI possa refletir e analisar a realidade objeto de ação ecológica, possam ser definidas as áreas prioritárias a serem “trabalhadas” e, elaborados os projetos de ação sustentável, na dimensão sociotransformadora, buscando a adesão e participação de paroquianos/paroquianas e também as parcerias necessárias, seja com outras organizações religiosas (no contexto do ecumenismo e do diálogo inter-religioso), bem como com outras organização governamentais e não governamentais, procurando maximizar as ações de sustentabilidade contidas nos projetos, inseridos estes em um contexto maior, seja municipal ou intermunicipal e ou também interparoquial e ou setorial. Esta fase e o JULGAR, seguindo-se as ações propriamente ditas, que é o AGIR.

A nossa sugestão é que, diante dessas considerações e observações a PEI – Pastoral da Arquidiocese de Cuiabá, promova a formação de Agentes da Pastoral, em número que varie de 3 a 5 ou mais pessoas em cada Paróquia, para que, devidamente embasados nos fundamentos da mesma: Encíclicas Laudato Si; Fratelli Tutti; na Doutrina Social da Igreja – DSI; nas Exortações Apostólicas Querida Amazônia e Laudate Deum, possam ser organizadas as Equipes/Núcleos Paroquiais e o trabalho possa ser realizado nos moldes como anteriormente referido e enfatizado.

Além disso, a formação desses Agentes de Pastoral/Equipes Paroquiais e ou das Comunidades deve oferecer conhecimentos básicos sobre a realidade e base legal dos diversos problemas/desafios socioambientais existentes no âmbito do território da Arquidiocese de Cuiabá e de cada Paróquia, que coincide com boa parte ou a maior parte da sub-região conhecida como Baixada Cuiabana ou Vale do Rio Cuiabá.

Esta é a região de povoamento mais antiga de Mato Grosso que congrega mais de UM MILHÃO de habitantes, onde estão a Capital (Cuiabá) e segunda maior cidade do Estado (Várzea Grande) e que é a área com maior concentração de população urbana do Estado e que enfrenta inúmeros problemas socioambientais como queimadas urbanas, ocupação precária do solo urbano, a questão da falta ou precariedade de saneamento básico (abastecimento de água potável, coleta e tratamento de esgoto), destino inadequado de lixo/resíduos sólidos, , poluição e degradação do maior curso d’água da região que é o Rio Cuiabá e seu principal afluente que é o Rio Coxipó; destruição e morte de, praticamente, todos os córregos e nascentes urbanas e periurbanas do Aglomerado Urbano Cuiabá-Várzea Grande, decorrente da ocupação irregular e ou especulação imobiliária, que ainda continua para além do perímetro urbano.

Outros desafios socioambientais que devem merecer análise, podendo ser objeto de ações da PEI é a questão da falta de arborização urbana, tornando o clima da cidade a cada dia mais insuportável e também a questão da Reciclagem, da Economia solidária, que pode e deve ser trabalhas em parceria com outras pastorais, a Caritas e o Movimento Economia de Francisco e Clara, por exemplo.

Enfim, já existem inúmeros estudos realizados por Universidades, com a UFMT e o Instituto Federal de Educação quanto à gravidade da situação socioambiental neste território onde a PEI pode e deve realizar suas ações de forma efetiva e participativa, inclusive em parceria com ONGs e outras organizações Governamentais.

Outro aspecto que deve merecer a atenção da PEI é a questão da Educação Ambiental ou o que denominamos de Educação Ecológica Libertadora, que deve ser feita tanto no âmbito das Paróquias/Comunidades, quanto e também principalmente junto a rede de ensino (escolas/universidade) Católicas, as demais escolas confessionais e também rede comercial de educação e a rede pública de Educação de responsabilidade dos poderes públicos (Municípios e Estado).

Esta é a única forma de atingirmos a população infantil e a juventude, grupos demográficos que irão sofrer as consequências da destruição do meio ambiente, mas que também podem fazer a diferença na superação de atitudes, comportamentos e ações que tem contribuído para a degradação ambiental, a poluição, a destruição da biodiversidade, dos ecossistemas e dos três biomas que estão presentes em nossa sub-região: Pantanal, Cerrado e Amazônia Mato-grossense , considerando que estamos inseridos no âmbito da Amazônia Legal.

Voltando à questão da formação dos Agentes/Equipes Paroquiais e das Comunidades da PEI, a mesma pode ser realizada de forma articulada entre o modelo presencial e o modelo virtual, durante quatro ou cinco finais de semana.

Creio que se assim atuarmos a PEI poderá ser um fator decisivo para o despertar da consciência ecológica no âmbito da Igreja ou das Igrejas, pois estará centrada no contexto da Espiritualidade Ecológica, condição necessária para estimularmos a CONVERSÃO ECOLÓGICA, como tanto tem enfatizado o Papa Francisco, único caminho para combatermos o pecado ecológico, que na verdade também são crimes ambientais, passo necessário e fundamental para atingirmos a CIDADANIA ECOLÓGICA, respeitando os princípios e exigências da Justiça Ambiental, da Justiça climática, da Justiça Intergeracional, da Justiça Social, enfim, na busca permanente do Bem Comum e do Bem Viver das pessoas e dos povos.

A luta para enfrentarmos as consequências da crise climática e da destruição da natureza e dos recursos naturais passa necessariamente por um despertar da Igreja Católica, que ainda é o maior grupo religioso em nosso país e tem uma enorme capilaridade social, com suas mais de 12 mil paróquias e mais de 120 mil Comunidades Eclesiais e as ações decorrentes deste processo, principalmente se considerarmos que em Maio do próximo ano (2025) estaremos celebrando DEZ ANOS da publicação da Encíclica Laudato Si e que no final de novembro do ano que vem (2025) será realizada em Belém, Pará a 30ª COP -Conferência do Clima, sob os auspícios da ONU.

Acrescente-se também o fato de de que a Campanha da Fraternidade de 2025 terá como tema Fraternidade e a Ecologia Integral, o que estimulará/incentivará o fortalecimento das atuais pastorais da ecologia integral e a organização de muitas outras, principalmente nas regiões Centro Oeste e Amazônia, que sofrem com grande desafios/problemas socioambientais e onde a presença dessas pastorais é praticamente ausente.

Esses serão alguns dos grandes desafios que a Igreja Católica no Brasil será instada a enfrentar e dar respostas de forma clara e efetiva, no contexto do Magistério do Papa Francisco através de Encíclicas, Exortações Apostólicas e pronunciamentos.

Para salvarmos o Planeta, a nossa CASA COMUM, a partir de nossas realidades mais próximas precisamos de uma participação mais ativa por parte da Igreja, principalmente de sua hierarquia Eclesiástica, longe de um clericalismo que fere de morte a própria Igreja, mas também a participação de todos os Cristãos, incluindo Católicos e Evangélicos, para além de suas crenças e fé, também são consumidores, empresários, trabalhadores/trabalhadoras e, em decorrência, fazem parte da rede pessoas e instituições que afetam positiva ou negativamente a realidade socioambiental, tanto no Brasil quanto no resto do mundo.

Lembremo-nos, a OMISSÃO é um PECADO, como enfatiza a Doutrina/Fé Católica, o Cristão não pode ser omisso diante da destruição das Obras da Criação! Defender a vida como um todo, é, alem de defender a vida humana, também significa defender a natureza, defender os rios, as águas, as florestas, defender os animais, defender a biodiversidade animal e vegetal, enfim, defender os biomas e os ecossistemas!

E isto pode e deve ser o foco das ações da Pastoral da Ecologia Integral em cada Paróquia, cada comunidade eclesial, cada Diocese e cada Arquidiocese, para sermos coerentes com o chamado do Papa Francisco, ouvindo tanto o “grito da terra” quanto o “grito dos pobres, excluidos, oprimidos e injustiçados”.

Finalmente, é importante também mencionar que ao longo desses quase quatro anos, um grande esforço tem sido feito junto ao Regional Oeste 2 da CNBB, cujo espaço de atuação são, além da Arquidiocese de Cuiaba, também as Dioceses de Rondonopolis/Guiratinga, Primavera do Leste, Barra do Garças, Sinop, Juina, Diamantino e Cáceres, no sentido de que todas as Dioceses também promovão articulações e formação de futuros agentes (Leigos e Leigas) e, assim, a Pastoral da Ecologia Integral possa ser implantada em todas as Dioceses e Paróquias que integram este Regional.

Cremos que, a paritr da realização da Campanha da Fraternidade de 2025, que traz o tema Fraternidade e Ecologia inregral, muitos fiéis e também a hierarquia eclesiástica, as vezes um tanto refratária `as exortações e chamamento do Papa Francisco e seu magistério, principalmente nas questões socioambientais, também possa haver muitas conversões ecológicas, tanto individual quanto comunitárias e, assim , podermos avançar com a implamntação da Pastoral da Ecologia Integral, em um Estado (MT) marcado por grandes problemas e desafios socioambientais, incluindo o desmatamento, a destruição das nascentes, da biodiversidade, o uso abusivo de agrotóxicos, problemas sérios com a degradação dos rios, por construções de PCHs – “pequenas” centrais hidrelétricas, por poluição urbana e também por problemas relacionados com garimpos e mineração e, pelas queimadas que estão destruindo o Pantanal, o Cerrado e a parte da Amazônia matogrosssense, afetando a natureza e a vida humana.

Por isso, precisamos ouvir sempre o Grito da terra e dos pobres neste vasto território e refletirmos profundamente qual o papel e a responsabilidade da Igreja neste contexto. Este é o papel das Pastorais da Ecoligia integral podem realizar,com certeza.

Juacy da Silva é professor titular, fundador e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso.



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